1Coríntios 3.10-23
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· 6 viewsO autor exorta os membros da igreja de Cristo a sondarem seus corações e analisarem suas intenções para com a comunidade, a fim de que percebam a se uas obras cooperam para o bem da própria igreja, reforçando também o convite a que qualquer tipo de confiança na sabedoria humana para a fruição desse propósito seja abandonada, o pertencimento ao SENHOR seja a fortaleza do povo de Deus.
Notes
Transcript
"[....] Aos santificados em Cristo Jesus, chamados para ser santos" (1Co 1.2).
Pr. Paulo U. Rodrigues
Introdução
Avançando em sua exortação à igreja, Paulo, após ter repreendido os coríntios devido sua condição espiritual infantil, causada pela postura separatista que assumiram por meio de contendas e intrigas motivadas por individualismos e arrogância (cf. vs.1-5), prossegue e expande sua reprimenda, considerando a tarefa de cada crente de contribuir com a edificação do corpo de Cristo; tema que já introduzira a partir dos versículos anteriores, especificamente, no trecho de 8 a 9 deste capítulo 3, porém agora é realizado um acréscimo aquele argumento.
A seção que compreende esta próxima prédica (vs. 10-23) pode ser dividida em dois blocos: o primeiro que vai dos versículos 10 ao 17, enfatiza a advertência com relação as intenções e atitudes dos membros da igreja com relação ao próprio ajuntamento. Todas as obras serão expostas ao “teste do fogo” (v.13): se o sentimento dos crentes com relação a comunidade os moveu à construção de uma igreja saudável, isso será demonstrado. Por outro lado, se não retificaram seus corações, mudando sua postura individualista, a fim de somarem forças ao intento benéfico de fomentar unidade e comunhão na igreja, isso também virá à lume. Essa prova ocorrerá no momento que o apóstolo chama de "o Dia"; uma clara referência ao retorno do Senhor Jesus.
A partir do versículo 18 até o 23, Paulo sintetiza o ensino introduzido desde o final do capítulo 1, em que finaliza sua exortação quanto ao orgulho coríntio que repousava na sabedoria humana. Se o alvo de cada crente é que suas obras sejam vistas como verdadeiras diante de Deus, resistindo ao fogo, não podem ver na inteligência dos homens algum tipo de base sobre as quais ancorem suas esperanças, tampouco nela podem se gloriar de alguma coisa, pois o único sentimento que pode ser visto como digno de glória é aquele que considera o bem da igreja, tendo em vista que todos os agentes e instrumentos concedidos ao povo de Deus, lhe foram dados para que obtivessem vida sabendo que "tudo é vosso" (v. 22).
Levando em consideração essa análise, a temática central do texto de 1Coríntios 3.10-23 consiste no caráter das obras e sua recompensa na edificação da igreja.
Elucidação
A expansão do argumento, como dito introdutoriamente, de acordo com o texto, consiste em expor as obras dos edificadores (não somente Paulo e Apolo, mas todos os membros da comunidade, embora sejam o exemplo) em relação à igreja, e a devida recompensa por elas (cf. v.13 "manifesta se tornará a obra de cada um"), aliado a sintetização da nulidade da sabedoria humana nesse intento (vs. 18-23), compondo assim, o parágrafo em questão, o qual passaremos observar a partir dessas respectivas subseções.
1. Advertência: “As obras e intenções para com a igreja serão provadas!” (vs. 10-17).
Novamente, o apóstolo Paulo usa a si mesmo e Apolo como exemplos da dinâmica divina em relação a edificação da igreja. Tendo concluído o parágrafo anterior, aludindo ao fato de ter sido usado como instrumento no projeto divino para com seu povo, ele complementa essa ideia também a partir do princípio da cooperação: Paulo e Apolo, embora tivessem sido usados pelo mesmo Deus, tiveram funções diferentes, exercidas na igreja de Deus. Ele afirma:
Segundo a graça de Deus que me foi dada, lancei o fundamento como prudente construtor; e outro edifica sobre ele. Porém cada um veja como edifica.
Apesar dessa "diferença" no uso, ambos contribuíram para um mesmo propósito, algo que, naquele momento, testemunhava contra os coríntios. A prudência na construção a que refere-se, não é uma mero atestado de sua idoneidade com relação a obra, mas é posta como que indicando um requisito que cumpriu, executando a tarefa de trabalhar para o bem do corpo de Cristo, o que por essa razão, pode ser visto como parte da advertência que inicia a seguir: "Cada um veja como edifica". Notando o contexto de contendas e rivalidades que havia dentro da igreja, o autor leva seu público a refletir sobre como estavam desempenhando seus papéis na missão de cooperar na(o) "lavoura/edifício de Deus" (cf. v.9). A divisão causada pelos partidos e facções gerava uma concorrência nociva em relação aquele fundamento lançado por Paulo.
A base das desavenças na igreja de Corinto, consistia numa compreensão mundana que considerava a sabedoria dos homens (filosofias e conceitos extraídos da mentes humana, e não do Evangelho) a verdadeira fonte de edificação daquela comunidade. Tal pensamento não poderia conviver ao lado do ensino do Espírito (cf. 2.7) exposto por Paulo, o que só poderia resultar na compreensão de que as facções corintianas estavam lançando "outro fundamento, além do que foi posto" (v.11). Mediante a gravidade do que isso significava, Paulo inicia sua advertência, declarando que se as intenções de alguém com relação à igreja forem boas, e suas obras tiverem sido direcionadas à edificação do povo de Deus, isso será demonstrado a partir de um "teste pelo fogo" (v.13).
Nesse ponto, o apóstolo extrai o exemplo de sua admoestação da ourivesaria: os artesãos e fabricantes de jóias a partir de metais preciosos, usavam a forja como método de purificação dos metais. Essa mesma dinâmica é trazida à mente dos coríntios a fim de que fosse percebido o que aconteceria no retorno de Cristo.
Como saber ser alguém edificou sobre outro fundamento, ou se de fato estava interessado em fazer o bem a igreja mediante a difusão do testemunho do evangelho? Aparentemente, no cerne das divisões e contendas na igreja, cada facção arrogava para si algum tipo de benefício que estaria promovendo à comunidade, de acordo do seu modo de pensar, o que, às vistas humanas, poderia dificultar a identificação de quem estava bem ou mal intencionado.
Suprindo essa indagação, Paulo faz uma afirmação em linguagem analógica e metafórica, que pode ser vista tanto positiva quanto negativamente, a depender do coração e do tipo de obras de cada um:
Contudo, se o que alguém edifica sobre o fundamento é ouro, prata, pedras preciosas, madeira, feno, palha, manifesta se tornará a obra de cada um; pois o Dia a demonstrará, porque está sendo revelada pelo fogo; e qual seja a obra de cada um o próprio fogo o provará. Se permanecer a obra de alguém que sobre o fundamento edificou, esse receberá galardão; se a obra de alguém se queimar, sofrerá ele dano; mas esse mesmo será salvo, todavia, como que através do fogo.
As obras são representadas e categorizadas de acordo com materiais preciosos, mas que também apresentavam uma tendência de serem mais resistentes ao fogo, juntamente com outros que são facilmente incinerados. O ouro, prata e pedras preciosas, estão para boas obras, assim como madeira, feno e palha, estão para obras corrompidas. Se um membro daquela igreja possuía em seu coração a real motivação de, através de Cristo, confiando apenas no Evangelho, promover o bem da comunidade, suas obras são valiosas, e assim, tais intenções "resistiriam" (v.14). De contra partida, o egoísmo e vaidade amparados na sabedoria dos homens e arrogância, demonstram obras que jamais poderia permanecer diante do tribunal de Cristo, e serão destruídas.
É importante porém, compreender que ao fazer essa analogia, Paulo não estava sugerindo que haveriam crentes que seriam recompensados por terem sido instrumentos da edificação da igreja enquanto que outros seriam destruídos, sendo revelada alguma forma de proscrição da salvação ou coisa do gênero, pois como é dito, o mal cooperador, apesar de ter suas obras destruídas pelo fogo “esse mesmo será salvo, […] como que através do fogo” (v.15).
Não se trata de uma distinção entre crentes verdadeiros e falsos, pois, assim como foi no versículo 1, em que a diferença entre “carnais” e “espirituais” não aludiu a existência de cristãos genuínos e falsos irmãos, e sim que todos naquela igreja, estavam agindo como carnais/crianças, agora, boas obras e más obras não separam justos de ímpios, e sim, daqueles que cooperam com a saúde da igreja, em relação aos que isso não fazem, lembrando que tal repreensão visa demover os coríntios de suas posturas separatistas, almejando que, assim como dito antes, todos corrijam seus comportamentos e corações, a fim de que à uma, sejam trabalhadores unidos na causa da edificação do corpo de Cristo.
Ainda assim, o apóstolo conclui essa primeira parte de seu argumento com um severo aviso, provavelmente direcionado aos que resistissem ouvi-lo: tendo em vista que a igreja é o "santuário (gr. “ναός” - templo) de Deus e que o Espírito de Deus habita (gr. "οἰκέω" - mora, reside) em vós" (v. 16), qualquer que tente destruir esse santuário - no caso, mantendo-se contumaz em dividir o povo de Deus - será por ele destruído, pois a a igreja é sagrada (gr. "ἅγιος" - santo, separado). O termo usado por Paulo para expor a santidade da igreja não implica, nesse caso, numa separação do pecado, mas uma dedicação que torna a igreja propriedade exclusiva e inalienável de Deus. Ou seja, se um indivíduo ameaçar roubar do SENHOR aquilo que lhe pertence, maculando e destruindo a unidade da igreja, será alvo de sua ira destrutiva.
2. Síntese: [por causa disso] “Ninguém ache que é sábio, ou confie na sabedoria dos homens!”.
Anexado a esse ponto, Paulo rememora os coríntios que a confiança na filosofia ou entendimento dos homens, não produz aquele resultado que somente Deus pode operar na igreja. Se alguém se tem por sábio, faça-se “estulto” (gr. “μωρός” - néscio, tolo) para então se tornar sábio, isto é, se alguém confia em sua própria sabedoria achando-se superior e melhor que seus irmãos, que abandone essa postura arrogante, esvaziando-se de si mesmo, a fim de que aprenda do Senhor, pois, como já havia dito, “a sabedoria do mundo é loucura diante de Deus” (v.18).
Corroborando essa ideia, Paulo cita dois textos do Antigo Testamento, em que a sabedoria dos homens, através da qual alguém podeira achar que estaria apto a julgar e discernir o divino, é humilhada pela confrontação da verdade que provém do Criador. O primeiro texto é Jó 5.13
Ele apanha os sábios na sua própria astúcia; e o conselho dos que tramam se precipita.
Elifaz exorta Jó quanto ao caminho dos arrogantes, e embora esse argumento esteja sendo usado contra Jó, Paulo cita a dinâmica identificada pelo amigo do sofredor, ressaltando-a para os membros da igreja que o caminho dos que se acham sábios é ser exposto por Deus como loucos.
O segundo texto é o Salmo 94.11
O Senhor conhece os pensamentos do homem, que são pensamentos vãos.
Num cântico que clama ao SENHOR pela execução da justiça contra os que oprimem Israel, o salmista ressalta a eficácia de Deus em destruir os prepotentes.
Ambos os textos conectam-se pela ideia de que o devido pago será efetivado contra os que se agitam em suas mentes, buscando para si os postos de “sábios”, não confiando no poder o SENHOR. Agindo dessa forma, o que Paulo afirma, é que os coríntios estariam atraindo para si o mesmo fim: vexação e humilhação. Como destaca Calvino:
1 Coríntios Capítulo 3
até que suceda de uma pessoa reconhecer que nada sabe exceto o que aprendeu de Deus e, tendo renunciado seu próprio entendimento, se resigna sem reserva à direção de Cristo, tal pessoa é sábia segundo os padrões do mundo, no entanto é tola na avaliação de Deus.
Por fim, o regozijo do apóstolo por essa verdade, o guia a perceber (bem como fazer com que seu público também note) que a base segura que sustenta a igreja é o fato de que:
seja Paulo, seja Apolo, seja Cefas, seja o mundo, seja a vida, seja a morte, sejam as coisas presentes, sejam as futuras, tudo é vosso, e vós, de Cristo, e Cristo, de Deus.
A expressão usada por Paulo “tudo é vosso” provém de um provérbio estoico: “O homem sábio… é senhor sobre tudo o que vem a ele de fora” (KISTEMAKER,2014, p.157). Os estoicos eram um grupo adeptos de determinado pensamento filosófico vigente naquele período. O apóstolo realiza então uma adaptação, usando um filósofo que a própria igreja conhecia, a fim de demonstrar que através de Cristo e não da sabedoria dos homens, a igreja era herdeira de tudo, principalmente das dádivas da qual pode desfrutar no Senhor Jesus.
Transição
A compreensão aprofundada proposta pelo texto de 1Coríntios 3.10-23 quanto as intenções do coração para com a igreja, refletida por sua vez nas obras de cada um, e a reiterada exortação à rejeição da sabedoria (e com ela a arrogância) humana, provê uma ótica clara sobre o desejo de Cristo sobre como seu povo deve viver.
Usando a própria divisão textual, essa noção pode ser sistematizada em dois pontos:
Aplicações
1. Precisamos sondar nosso coração, e examinar quais são as nossas intenções em relação a igreja - entendendo inclusive que pensamentos nocivos podem esconder-se por trás de reivindicações aparentemente válidas” - a fim de também sabermos se nossas obras correspondem com o objetivo da edificação do corpo de Cristo ou não, sabendo também que nossas obras serão provadas pelo próprio Cristo.
Todos nós temos sentimentos em relação a igreja. Resta saber se esses sentimentos vem de um coração que deseja realmente ver o corpo de Cristo edificado sobre firme fundamento (o Senhor Jesus e sua obra), ou se as intenções do nosso coração estão ancoradas apenas em uma profundo criticismo, que, não importando o que seja feito na comunidade, acha que é insuficiente, pois não está sendo feito o que nós gostaríamos que fosse realizado.
A advertência feita aos coríntios é feita a nós: nossas obras serão provadas, e não haverá como esconder de Cristo as reais motivações de nossos corações. Se almejamos o crescimento e edificação da igreja, isso será exposto diante do tribunal de Cristo; se desejamos nos promover como sábios no meio da igreja, assumindo posturas orgulhosas e arrogantes, isso também ficará evidente. Além disso, o que nosso coração deseja, nossas mãos praticam, isto é, não podemos desejar uma coisa em relação ao povo de Deus, e agir de maneira completamente diferente.
Se temos sido egocêntricos e arrogantes, demonstraremos isso com nossas obras; se somos humildes e queremos servir uns aos outros em amor e verdade, é nisso que trabalharemos, e por fim, no retorno do Rei, receberemos a devida recompensa (v.14).
Contudo, o complemento do aviso também deve ficar claro em nossas mentes: agindo de maneira a destruir a unidade do povo de Deus, atrairemos sobre nós destruição, pois estamos profanando a habitação do Espírito, e isso não ficará impune.
2. Despojemo-nos de toda altivez, sabendo que em Cristo, herdamos tudo, e nossa glória é ser de Cristo, assim como Cristo é de Deus.
Concluindo sua fala contra o orgulho e arrogância dos coríntios, o último ponto do argumento paulino é a riqueza que temos ao nosso dispor em Cristo. Os ministros (e.g. Paulo, Apolo e Cefas), aquilo que há de bom no mundo, a vida e a morte, até mesmo os acontecimentos presentes e futuros, são exemplos que o autor direciona ao seu público do quanto Cristo nos oferece muito mais do que a sabedoria dos homens.
É válido lembrar que o cerne do princípio ensinado por Paulo não é apenas a confiança em filosofias. Pensando assim, até poderíamos supor que o texto não se aplicaria a nós. Porém, o que está sendo tratado pelo Espírito através deste texto bíblico, é o orgulho e a confiança em qualquer outra cosia para além do SENHOR, como fonte de benção para a igreja, inclusive qualquer tipo de sentimento vaidoso e orgulho que nos faça pensar que somos superiores em algum aspecto à qualquer um de nossos irmãos, como era o caso de muitos dentro da igreja de Corinto.
Se Cristo nos basta, sabendo que nele temos tudo, não restará em nosso coração qualquer traço de arrogância, nem ousaremos achar que o bem da igreja vem de qualquer outra fonte, que não a inesgotável graça do Senhor, que nos tornou uma família farta de seu amor.
Conclusão
1Coríntios 3.10-23 nos demonstra o dever de constantemente examinar nosso coração, a fim de que saibamos quais são as nossas intenções e obras em relação a igreja, sabendo que no Senhor Jesus desfrutamos de tudo de bom que ele reservou para nós, e nEle portanto, repousa a segurança de que seremos edificados naquele firme fundamento que nos guiará em crescimento ao seu grande dia, em que nossas obras, ao serem provadas, serão graciosamente recompensadas.