Mateus 20.17-28

Série expositiva no Evangelho de Mateus  •  Sermon  •  Submitted
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O autor reforça o princípio do serviço cristão, agora a partir do exemplo do próprio Cristo, como aquele que veio servir, buscando com isso a verdadeira glória.

Notes
Transcript
“[...] Porque é chegado o Reino dos céus” (Mateus 3.2).
Pr. Paulo U. Rodrigues
Introdução
Avançando na temática da presente seção de seu texto, a partir da qual a oposição ao Reino dos céus é demonstrada, principalmente em relação ao Messias, Mateus estrutura dois episódios que se sobrepõem: o primeiro é a repetição do aviso constante que Cristo concede aos seus discípulos, informando que está próximo o momento de sua entrega aos sacerdotes e escribas para ser condenado e morto, mas que ao terceiro dia haverá de ressuscitar (vs.17-19). O segundo, consiste no pedido da mãe de Tiago e João, o qual é usado a fim de que outro princípio do Reino seja explicitado.
A primeira vez, no evangelho, que o Senhor menciona a iminência de sua paixão, dá-se logo em seguida ao momento de sua transfiguração (cf. 16.21). A repetição desse dado conecta as narrativas subsequentes (cap. 21), de maneira a progredir o texto em questão a partir da segunda subseção, para o momento em que o Reino será efetivamente publicado e cumprido, tal como profetizado em todo o Antigo Testamento e predito pelo próprio Senhor, o que é inclusive usado posteriormente como outra evidência de seu messiado. Em face disso, o contexto proximal da segunda parte do trecho em questão (cf. 21.1-11), intensifica essa compreensão.
No início do capítulo 21, Cristo adentra a cidade de Jerusalém, o que indica que havia chegado ao lugar determinado para cumprir o plano redentivo em seu sacrifício, e a percepção da aproximação da chegada desse momento crucial é introduzida pelo diálogo entre Cristo, a mãe de Tiago e João e seus discípulos, em que a ideia de "beber do cálice" (cf. vs. 22, 23) prepara a mente do leitor/ouvinte para as cenas que virão.
Embora o diálogo centralize novamente o princípio da cooperação e serviço que cada agente do Reino deve ter em relação a seu irmão, de tal forma que "quem quiser tornar-se grande (i.e. assentar-se à direita ou esquerda do Messias em seu Reino (cf. 21) entre vós, será esse o que vos sirva", Mateus também está configurando a narrativa a fim de que já se espere a crucificação de Cristo. A sobreposição das narrativas sugere uma aproximação intencional: receber o Reino consiste em ver no próprio Messias o exemplo de como se deve agir em relação aos irmãos, pois o próprio "Filho do Homem, não veio para ser servido, mas para servir, e dar a sua vida em resgate por muitos" (v. 28). A iminência da paixão e o serviço mútuo estão direta e intrinsecamente ligados, de maneira que é impossível usufruir de um lugar no Reino, sem entregar-se ao cuidado e amor aos irmãos, doando-se por eles.
Em vista disso, a ideia central do texto de Mateus 20.17-28 é o sacrifício de Cristo como exemplo para o serviço mútuo.
Elucidação
Naturalmente, resguardadas as formas e ênfases específicas, os quatro evangelhos concentram-se no ponto máximo da ação redentiva em Cristo, qual seja: a crucificação e a ressurreição. A progressão narrativa de cada escritor, consiste em conectar os eventos anteriores a esse pontos, seja concentrando-se em princípios que caracterizam o Reino dos céus (e.g. Mateus e Marcos), seja observando aspectos mais pertinentes à pessoa do Messias ou relacionados à fé agora professada por aqueles que, pelo poder do Espírito, foram habilitados a crer (e.g. Lucas e João).
Mateus registra a repetição do aviso dado por Cristo aos discípulos, como forma de preparar os leitores para a chegada desse ponto máximo de seu texto e da trajetória messiânica de publicação do Reino de Deus. Porém, além de expor essa ênfase, essas repetições também se encarregam de lançar luz sobre os episódios em questão no momento, como é o caso dos versículos 17 à 19, que antecedem o diálogo entre o Senhor, a mãe dos irmãos Tiago e João, e seus discípulos, como já afirmado.
Apesar de o advérbio "τότε" (gr. trd. "então, logo em seguida, depois disso etc.)" não significar uma conexão direta com a passagem anterior (vs. 17-19), o contexto e o posicionamento da narrativa iniciada no versículo 20, sugere a intencionalidade do autor. De maneira muito direta (sem exploração de detalhes), Mateus registra a aproximação da mãe de Tiago e João à Cristo, buscando a solicitação de um favor. Tendo sido concedida a oportunidade de publicar seu desejo, a mulher responde:
Mateus 20.21 RA
Perguntou-lhe ele: Que queres? Ela respondeu: Manda que, no teu reino, estes meus dois filhos se assentem, um à tua direita, e o outro à tua esquerda.
Nenhuma razão com base num contexto situacional prévio que explique o porquê desse pedido é registrada, embora o anúncio de Cristo em relação às recompensas (cf. 19.29-30; 20.16), possa ser visto como o momento em que o debate por um lugar de honra ao lado do Senhor no Reino tenha se iniciado.
No texto de Marcos, não é dito que a mãe dos dois irmãos solicitou tal pedido ao Mestre, e sim que eles mesmos o fizeram:
Marcos 10.35 RA
Então, se aproximaram dele Tiago e João, filhos de Zebedeu, dizendo-lhe: Mestre, queremos que nos concedas o que te vamos pedir.
A diferença entre as narrativas no que tange a quem de fato fez esse pedido a Cristo, parece ser um fato de somenos importância para ambos os redatores, pois tanto em Mateus quanto em Marcos, o centro da história consiste em expor o interesse daqueles homens em subirem à uma alta posição no Reino de Deus.
Nesse momento, os evangelistas concordam em demonstrar a resposta contrastante de Cristo aos solicitantes: "Não sabeis o que pedis. Podeis vós beber o cálice que eu bebo? [ou receber o batismo com que sou batizado]" (cf. Mateus 20.23; Marcos 10.38). A resposta de Jesus enfatiza a ideia de sua submissão ao plano redentivo traçado na eternidade, e de que tal planejamento o condicionava à algo completamente diferente do que estavam buscando aqueles homens, isto é, com a pergunta, Tiago e João (ou sua mãe), expuseram suas percepções quanto a Cristo e o Reino, achando que ele, sendo o Messias, é quem determinava a obtenção de glória em sua missão nesse mundo.
Tal como avaliado na introdução, o "cálice" ao qual refere-se Cristo no versículo 23, é uma referência à sua paixão. Ele não veio a esse mundo, neste primeiro momento, para publicar toda a glória do Reino dos céus, mas para submeter-se à uma situação de humilhação e sofrimento, cabida, nas proporções determinadas, apenas ao Messias. Cristo não estava aqui para buscar sua glória, e sim a glória do Pai, e tal exaltação implicava primeiro experimentar intenso rebaixamento, de uma forma que homem algum jamais poderia suportar.
Pretensiosamente, os irmãos afirmam que poderiam beber do mesmo cálice que Jesus, e o Senhor confirma o desejo daqueles homens, nos termos de sua compreensão, e isso fica claro ao propor como devem fazê-lo: ao invés de honra e pompa, Tiago, João, e os discípulos - que inclusive ficaram indignados com os dois, por terem quisto sobressair-se aos demais (cf. v. 24) - devem na verdade humilharem-se também, assumindo a servidão como marca de suas posições como agentes do Reino. Explicando em detalhes essa perspectiva, Cristo propõe uma analogia, seguida pela aplicação de seu sentido:
Mateus 20.25–27 RA
Então, Jesus, chamando-os, disse: Sabeis que os governadores dos povos os dominam e que os maiorais exercem autoridade sobre eles. Não é assim entre vós; pelo contrário, quem quiser tornar-se grande entre vós, será esse o que vos sirva; e quem quiser ser o primeiro entre vós será vosso servo;
Tiago e João mostraram qual o conceito o mundo tem quanto a honra: quanto maior o homem, mais digno de honra e de que seja servido ele se torna. No Reino dos céus ocorre o exato oposto: quanto mais importante, mais claro deve ser tornar o princípio de que foi destacado para o serviço a seus irmãos.
Os discípulos buscavam uma posição de destaque, mas Cristo explica que isso não é adquirido como é no mundo, em que os níveis de importância tornam o homem alvo de serviço, e sim, que a condição de serem filhos de Deus os incumbe do sagrado dever de servirem-se uns aos outros, e o exemplo máximo disso, é ele mesmo: o Filho do Homem, sendo o próprio Deus, num primeiro momento não veio buscando ser agradado ou servido por seus súditos, mas para servi-los, resgatando os eleitos de suas condições de miséria e juízo iminente.
Transição
A concessão desse exemplo é usado por Mateus a fim de transmitir o mesmo ensinamento ao seu público: já em outros pontos de seu evangelho, o autor traçou a importância de os cristãos verem-se como servos uns dos outros (e.g. Mt 18). Agora, o princípio é reforçado e ampliado, tendo como base o próprio Cristo e seu sacrifício.
O que é esperado de cada agente do Reino é que veja em seu Senhor um exemplo a ser seguido e um princípio a ser aprendido. Como coloca J. C. Ryle:
Meditações no Evangelho de Mateus O Verdadeiro Padrão de Grandeza entre os Crentes (Leia Mateus 20.24–28)

Os padrões deste mundo e os critérios do Senhor Jesus Cristo são, de fato, muito diferentes. São mais do que diferentes; são diametralmente opostos. Entre os filhos deste mundo, considera-se grande aquele que tem mais terras, mais dinheiro, maior número de servos, maior posição social e maior poder. Entre os filhos de Deus, maior é quem mais faz a fim de promover a felicidade espiritual e temporal de seus semelhantes. A verdadeira grandeza consiste não em receber, mas em dar. Não consiste na aquisição egoísta de bens, mas, sim, em conferir coisas boas aos semelhantes. Não em sermos servidos, mas em servirmos. Não em nos assentarmos enquanto outros ministram às nossas necessidades, mas em sairmos para ministrar às necessidades alheias.

Diante disso, o ensinamento central exposto pelo texto de Mateus 20.17-28, nos remete a aplicação do seguinte princípio:
Aplicação
Não há como receber o Reino dos céus sem nos colocarmos a disposição de Cristo no serviço aos nossos irmãos, pois só podemos de fato nos considerar filhos de Deus, sendo alvos de sua obra redentiva, se tivermos visto no próprio Jesus o exemplo máximo daquele que entrega a própria vida em favor de muitos.
A dinâmica demonstrada por Jesus é clara: o Reino de Deus é completamente diferente do reino dos homens, onde autoridades são servidas por aqueles que estão abaixo deles. Quanto mais importante alguém é feito por Deus, mais evidente deve ficar para essa pessoa, que recebeu tal posição apenas para que fosse útil ao Reino no serviço e cuidado de uns para com os outros.
A mentalidade dos discípulos precisou ser orientada para enxergar como funcionam as coisas entre os que professam a fé cristã: não foi condenado por Cristo o querer assentar-se à sua direta ou esquerda no Reino, mas o modo como se almeja essa posição. Ao invés conquistarmos essa honra através da altivez, assumindo que somos superiores uns aos outros, devemos entender que nosso ministério é o serviço.
Sem compreendermos essa verdade, estaremos apenas atestando que não compreendemos o que Cristo veio realizar nesse mundo, quando de sua primeira vinda. Ele veio fazer-se servo, veio nos agraciar com a libertação do reino das trevas, que nos acorrentava ao pecado e nos oprimia, para que, por causa de seu sangue, fôssemos feitos filhos de Deus, e nessa condição, refletíssemos sua glória, replicando seu exemplo e testemunhando de seu amor uns para com os outros, sendo assim constantemente lembrados dessa graça salvadora, que moveu dos altos céus, Aquele que é digno de toda honra, a fim de servir miseráveis pecadores como nós.
Conclusão
O texto de Mateus 20.17-28 nos mostra a base do sentimento cristão do serviço mútuo: o sacrifício do Deus-Filho em favor dos filhos de Deus.
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