Mateus 20.29-34
Série expositiva no Evangelho de Mateus • Sermon • Submitted
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· 9 viewsO autor une as imagens bíblicas do Rei davídico e do Servo Sofredor a fim de expressar a legitimidade de Cristo em seu percurso sacrificial, confirmando a fé de seu público naquele que é de fato o Messias de Deus.
Notes
Transcript
“[...] Porque é chegado o Reino dos céus” (Mateus 3.2).
Pr. Paulo U. Rodrigues
Introdução
À luz do texto anterior, especialmente de acordo com a introdução feita em 20.17-19, podemos compreender a presente passagem a partir do desejo de Mateus em preparar seus leitores para o momento em que Cristo haveria de ser "entregue aos principais sacerdotes e aos escribas, [...] e aos gentios... (vs.19)". Entretanto, tal momento deve ser visto não com olhares derrotistas ou entristecidos, mas, levando em consideração o tema principal do Evangelho, que é o estabelecimento do Reino através do Messias prometido, devem notá-lo partir da perspectiva de que a crucificação do Senhor é o apogeu de sua obra em sua primeira vinda.
Essa ótica é confirmada com um prólogo à entrada do Senhor em Jerusalém, quando um milagre é usado tanto como reforço do reconhecimento de Cristo como "o Filho de Davi", isto é, o herdeiro da casa real daquele com quem o pacto que garante o Rei/Messias foi feito, quanto como demonstrativo do princípio anteriormente declarado de que o '"Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir..."(v.28).
Esse duplo objetivo realça o Messias e seu papel como salvador do seu povo, tornando também a visão dos discípulos com relação a quem é Cristo e qual a expectativa do Pai em relação aos agentes do Reino, ainda mais clara.
Assim a mensagem central da seção de Mateus 20.29-33 consiste na reafirmação e de Cristo como rei-messiânico e servo sofredor.
Elucidação
A iminência da crucificação torna a narrativa evangélica ainda mais específica, no que concerne a exibição de Cristo como aquele que haverá de publicar o Reino de Deus, levando seu povo à redenção prometida. Naturalmente, desde o início do evangelho, Mateus elenca uma série de evidências que declaram que Jesus de fato é aquele agente vindo da parte do Pai, outrora prometido para efetivar seu plano salvador.
Não obstante, se por um lado o papel de Cristo como Rei prometido explicita o fato de que é o Messias, o sofrimento predito por ele mesmo - repetindo o teor dramático das profecias veterotestamentárias - depõe em favor da compreensão paralela de que esse mesmo rei também deve surgir numa condição de servo.
A narrativa é iniciada com a constatação de que uma grande multidão acompanhava Cristo em sua jornada à Jerusalém. No meio dessa multidão, dois personagens ganham foco: dois cegos. Ao compararmos a narrativa de Mateus com a dos outros evangelistas, percebe-se uma diferença no número dos cegos: Mateus é o único que conta dois, enquanto que Marcos e Lucas, narram apenas um. Essa aparente contradição é facilmente resolvida ao se observar a própria narrativa: provavelmente, Mateus levou em consideração quantos cegos foram curados ao todo. Marcos por outro lado, registrou apenas aquele dos dois cegos que dialogou com o Senhor e clamou pelo socorro, informando inclusive seu nome: Bartimeu (cf. Mc 10.46). Quanto a Lucas, ao ter provavelmente usado o evangelho de Marcos como fonte primária, também preferiu manter a narrativa concentrada naquele que foi o interlocutor do Mestre (cf. Lc 18.35).
O ponto em questão e que chama a atenção na narrativa é que ambos os cegos, declaram sua fé no Messias usando uma titulação muito específica para se referirem à Cristo, como está registrado no versículo 30: "[...] tendo ouvido que Jesus passava, clamaram: Senhor, Filho de Davi, tem compaixão de nós!". A designação referida sugere um conhecimento específico do narrativa do Antigo Testamento, e também uma expectativa peculiar quanto ao cumprimento dos tempos em que os textos dos profetas e demais escritos seriam cumpridos. Bartimeu não está usando uma expressão genérica, que poderia, por exemplo, ser usada para todo aquele que nascesse na cidade de Davi (i.e. Belém de Judá), ou que tivesse algum parente que pertencesse à árvore genealógica davídica, embora fosse esse o caso de Cristo (cf. Mateus 1.6-16). Se a consideração dos cegos é tão superficial quanto esta suposição, todo aquele que nasceu da descendência direta (ou até indireta) de Davi, poderia ser chamado de "Filho de Davi".
Entretanto, a perspectiva dos cegos não é genealógica, e sim, teológica, pois atribuem a Cristo a filiação segundo a aliança feita com o antigo rei de Israel, por meio da qual a salvação do seu povo seria garantida, conforme lemos o texto de 1Crônicas 17.7-14
Agora, pois, assim dirás ao meu servo Davi: Assim diz o Senhor dos Exércitos: Tomei-te da malhada e de detrás das ovelhas, para que fosses príncipe sobre o meu povo de Israel. E fui contigo, por onde quer que andaste, eliminei os teus inimigos de diante de ti e fiz grande o teu nome, como só os grandes têm na terra. Prepararei lugar para o meu povo de Israel e o plantarei para que habite no seu lugar e não mais seja perturbado; e jamais os filhos da perversidade o oprimam, como dantes, desde o dia em que mandei houvesse juízes sobre o meu povo de Israel; porém abati todos os teus inimigos e também te fiz saber que o Senhor te edificaria uma casa. Há de ser que, quando teus dias se cumprirem, e tiveres de ir para junto de teus pais, então, farei levantar depois de ti o teu descendente, que será dos teus filhos, e estabelecerei o seu reino. Esse me edificará casa; e eu estabelecerei o seu trono para sempre. Eu lhe serei por pai, e ele me será por filho; a minha misericórdia não apartarei dele, como a retirei daquele que foi antes de ti. Mas o confirmarei na minha casa e no meu reino para sempre, e o seu trono será estabelecido para sempre.
De acordo com o texto, um dos pontos de destaque do pacto estabelecido entre Deus e Davi, consiste em o SENHOR suscitar da descendência do rei, um que se assentará no seu trono, governando para sempre, o qual será considerado como Filho de Deus (hb. “וְה֖וּא יִֽהְיֶה־לִּ֣י לְבֵ֑ן” - trad. lit. “e ele me será para mim filho” (cf. 1Cr 17.11)). A forma específica da referência dos cegos a Cristo, confirma não somente sua fé nessa promessa, mas também que o próprio Jesus é o seu cumprimento.
Contra a própria vontade da multidão, os cegos insistem em reafirmar sua compreensão quanto à quem estavam clamando:
Mas a multidão os repreendia para que se calassem; eles, porém, gritavam cada vez mais: Senhor, Filho de Davi, tem misericórdia de nós!
Atentando ao apelo, Cristo os convoca à sua presença, perguntando: "que quereis que eu vos faça?" (v.32). Mediante a resposta quanto a restauração da visão, a comparação da réplica de Cristo, conforme registrada por Marcos e Lucas à solicitação dos cegos, também confirma a posição de Cristo como o Filho de Davi, pois, assim como visto ao longo dos vários milagres que Mateus narrou, o caráter expansivo da obra realizada também se faz presente na cura dos dois cegos no caminho de saída de Jericó, isto é, a outorga da cura não tenciona expor apenas o poder curativo do Senhor, mas conjuntamente, seu poder salvífico.
Porém, segundo já comentado, a preocupação de Mateus também é estabelecer a perspectiva de que o Senhor Jesus é aquele que veio dar sua vida em resgate por muitos, segundo salienta o final da narrativa antecedente, e esse papel de servo sofredor é retratado de maneira imagética através da reação do mestre no atendimento aos cegos. Realizando a comparação proposta das respostas do Senhor Jesus, temos os seguinte acréscimo:
Marcos 10.52: "Jesus lhe disse: vai, a tua fé te salvou.
Lucas 18.42: "Jesus lhe disse: Recupera a tua vista; a tua fé te salvou".
Mateus 20.34: "Condoído (gr. “σπλαγχνίζομαι” lit. “movido nas entranhas”), Jesus tocou-lhes os olhos e imediatamente recuperaram a vista…”.
Levando em consideração que Marcos e Lucas concentram-se na afirmação e apenas Mateus na ação, é perfeitamente possível chegar a conclusão de que os três estão certos quanto a como o milagre aconteceu, observando aspectos diferentes do mesmo evento. Mateus foca o gesto do Senhor em tocar os olhos dos cegos, a fim de expressar mais intensamente sua compaixão por eles, o que reforça o princípio clarificado anteriormente: a narrativa do milagre dos cegos não prova apenas que Cristo é o Rei da linhagem de Davi, mas atrela esse título ao Servo Sofredor que, misericordiosamente, se compadece daqueles que estão num estado de miséria e perdição.
Transição
É esse princípio que Mateus direciona ao seu público: Sua Majestade, Cristo Jesus, apieda-se daqueles que estão presos no estado de miséria do pecado.
Esse princípio deve ser compreendido por nós, a igreja do Senhor hoje, a partir do seguinte ponto:
Aplicação
Cristo é o Alto e Sublime Rei que em sua misericórdia, nos resgata do nosso estado de miséria e desgraça.
Pensando de maneira análoga à narrativa do texto, nós estávamos à beira do caminho que leva a Deus, tal como os dois cegos no caminho de Jericó à Jerusalém. Assim como eles mendigavam (cf. Lc 18.35) e amargavam uma vida infeliz, nós, de igual forma, vivíamos no caos do pecado, e numa situação ainda pior, pois nossa miséria era espiritual, e nada nesse mundo poderia reverter nosso quadro.
Cristo, o Rei dos reis e Senhor dos senhores, em sua majestade e excelência, condoeu-se de nossa situação, e veio em nosso socorro. Abrindo mão de sua glória, ele veio manifestar a graça do Pai, servindo-nos ao dar sua vida para resgatar a nossa.
Como diz J. C. Ryle:
Meditações no Evangelho de Mateus A Cura de Dois Cegos (Leia Mateus 20.29–34)
Deparamos aqui com uma ilustração daquela antiga verdade, a misericórdia de Cristo para com os filhos dos homens, a qual nunca podemos conhecer em sua plenitude. O Senhor Jesus não é apenas um Salvador poderoso; ele também é misericordioso, gentil e bondoso, e em um grau que vai além de nossa compreensão.
Se ele nos tivesse perguntado: “que quereis que eu vos faça?”, nem a essa pergunta teríamos condições de responder, tal era nossa cegueira. Mas, conhecendo nossa necessidade, e tendo nos amado antes da fundação do mundo, ele nos salvou e nos tornou seus súditos, concedendo-nos um lugar em seu Reino Eterno.
Conclusão
Cristo é o único exemplo de um Superior que, com graça verdadeira, inclina-se para servir inferiores. Verdadeiramente o Filho de Davi é Servo e Senhor… nossa completa redenção.