Aula: Os Decretos de Deus

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A NATUREZA DOS DECRETOS DIVINOS.

O decreto de Deus é o seu plano ou propósito eterno, no qual preordenou todas as coisas que acontecem. É natural, pois, que Deus, que controla todas as coisas, tenha um plano definido com o qual opera não só na criação e na providência, mas também no processo de redenção. Esse plano inclui muitas particularidades, é por isso que muitas vezes se fala dos decretos divinos no plural, embora na realidade haja um só decreto. Para o conteúdo concreto de seu decreto, Deus fez uso do conhecimento ilimitado que ele tem de todos os tipos de coisas possíveis. Desse grande acervo de possibilidades, ele reuniu em seu decreto somente as que realmente acontecem. A inclusão delas no decreto não significa necessariamente que ele mesmo as trará ativamente à existência, mas em alguns casos quer dizer que, com permissão divina e de acordo com o seu plano, elas serão certamente realizadas por suas criaturas racionais. O decreto abrange todas as obras de Deus na criação e na redenção, e inclui também as ações de seus seres morais livres, sem excluir suas ações pecaminosas. Porém, embora a entrada do pecado no mundo, com suas manifestações várias na vida dos anjos e dos homens, fossem tidas como certas, isso não quer dizer que o próprio Deus resolveu efetuá-las. O decreto de Deus com referência ao pecado é permissivo.

AS CARACTERÍSTICAS DO DECRETO DIVINO

O decreto de Deus tem diversas características:

1. ESTÁ FUNDADO NA SABEDORIA DIVINA.

Isso se deduz da declaração de que o propósito de Deus é “conforme o conselho da sua vontade” (Ef 1.11). Embora haja nele muitas coisas que não entendemos, é certo que Deus elaborou seu plano com sabedoria.

2. É ETERNO.

Isso não significa meramente que o decreto fosse estabelecido antes do princípio do tempo, mas também que, embora se relacione com coisas que acontecem no curso da História, sua elaboração é, e permanece sendo, um ato no interior do ser divino e, por isso, é eterno no sentido mais estrito.

3. É EFICAZ.

O fato de Deus ter feito um plano divino não quer dizer que tenha decidido fazer acontecer por seu próprio ato tudo que nele estava incluído; porém, o que ele decidiu acontecerá certamente, e nada pode alterar o seu propósito (Sl 33.11; Pv 19.21; Is 46.10).

4. É IMUTÁVEL.

Às vezes, os homens mudam os seus planos por várias razões. Pode ser que num segundo pensamento os considerem imprudentes, ou que lhes falte poder para efetuá-los. Porém, em Deus, nem uma coisa, nem outra é concebível. Ele não muda o seu plano, porque ele é fiel e verdadeiro (Jó 23.13–14; Is 46.10; Lc 22.22; At 2.23).

5. É INCONDICIONAL.

O decreto não depende, em nenhuma de suas particularidades, de qualquer coisa que lhe seja exterior, como, por exemplo, das ações livres das criaturas morais e racionais de Deus, da sua desobediência ou fé, previstas. Deus não só determinou o que vai acontecer, mas também em que condições será realizado (At 2.23; Ef 2.8; 1Pe 1.2).

6. É TODO-ABRANGENTE.

Inclui as boas ações dos homens (Ef 2.10), suas ações ímpias (Pv 16.4; At 2.23; 4.27–28), os acontecimentos contingentes (Gn 45.8; 50.20; Pv 16.33), os meios, bem como o fim (2Ts 2.13; Ef 1.4), a duração da vida humana (Jó 14.5; Sl 39.4); e o lugar de sua habitação (At 17.26).

7. COM REFERÊNCIA AO PECADO É PERMISSIVO.

O decreto de Deus com referência ao pecado é comumente chamado decreto permissivo; torna o ato pecaminoso futuro absolutamente certo, mas não significa que Deus por seu próprio ato o fará acontecer. Deus decretou não impedir o ato pecaminoso da autodeterminação da criatura, no entanto, regula e controla os seus resultados (Sl 78.29; 105.15; At 14.16; 17.30).

OBJEÇÕES À DOUTRINA DOS DECRETOS.

Fora dos círculos reformados, a doutrina dos decretos é muito pouco aceita. Os pelagianos e socinianos rejeitam-na como antiescriturística e irracional, e os arminianos ou a ignoram completamente, ou representam o decreto de Deus como base em sua presciência. Há especialmente três objeções à doutrina:

1. É DECLARADA COMO SENDO INCONSISTENTE COM A LIBERDADE MORAL DO HOMEM.

Se Deus decretou todas as ações do homem, então necessariamente o homem é obrigado a agir como age e fazer o que faz, e não pode ser responsabilizado por suas ações. Porém, a Bíblia ensina não só que Deus decretou os atos livres do homem, mas também que o homem é livre e responsável pelos seus atos (Gn 50.19–20; At 2.23; 4.27–28); e a Bíblia não faz nenhuma tentativa para conciliar os dois pensamentos. Talvez não possamos harmonizá-los, mas isso não significa necessariamente que são inerentemente contraditórios. Alguns concebem a liberdade da vontade e ela se torna incompatível com o decreto divino, mas essa concepção do livre-arbítrio do homem não é correta.
A liberdade moral é a capacidade do homem para determinar livremente suas ações morais em harmonia com seus pensamentos e juízos prévios, com suas inclinações e desejos, e até com o seu caráter essencial. Essa liberdade tem suas leis, e quanto mais forem entendidas, mais certo se torna o que o homem fará sob certas circunstâncias. Deus entende plenamente essas leis e, por isso, é muito concebível que determinasse as ações futuras do homem de tal maneira que não lhe coagisse a liberdade moral, mesmo que não entendamos como pode ser isso.

2. É DITO QUE ESSA DOUTRINA DESPOJA O HOMEM DE TODOS OS MOTIVOS PARA PROCURAR A SALVAÇÃO.

Se todas as coisas acontecem como Deus decretou, o homem sentirá que não precisa se preocupar com o futuro, nem fazer esforço algum para obter a salvação. Se sua destruição já está predestinada, ele se perderá a despeito de seus melhores esforços, e se sua salvação está decretada, será salvo, embora negligencie todos os meios de salvação. Em resposta a essa objeção, pode-se dizer: (a) que o decreto oculto de Deus não pode ser de maneira nenhuma a regra de ação do homem, a qual se acha só na lei e no evangelho; (b) que Deus não só decretou o destino final do homem, mas também os meios que a ele conduzem. Era absolutamente certo que todos os que estavam com Paulo no navio seriam salvos, mas era igualmente certo que, para assegurarem esse fim, os marinheiros tinham de permanecer a bordo; e (c) desde que o decreto associa meios e fins conjuntamente, e os fins são decretados somente como o resultado de meios, isso incentiva o esforço em vez de desencorajá-lo (Ef 2.10; Fp 2.13).

3. ESSA DOUTRINA FAZ DE DEUS O AUTOR DO PECADO.

Se Deus decretou o pecado, deve ser considerado autor do pecado; todavia, isso não pode ser, em vista do fato de que ele é santo, que ele mesmo proíbe o pecado e a Escritura lhe realça a pureza moral (Sl 92.15; Ec 7.29; Hc 1.13; Tg 1.13; 1Jo 1.5).
Pode-se dizer, contudo, que o decreto meramente faz de Deus o autor de seres morais, livres, os quais são, eles mesmos, os autores do pecado. O decreto com referência ao pecado não é eficiente, mas permissivo. Deus não decretou produzir o pecado por direta eficiência divina. Essa consideração, na verdade, não elimina completamente a dificuldade. O problema da relação de Deus com o pecado continua um mistério para nós, que não conseguimos resolvê-lo plenamente.1
1 Louis Berkhof, Manual de Doutrina Cristã, trad. Joaquim Machado, 2a edição (São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2012), 67–70.
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