Segundo Mandamento
IMAGENS DE JESUS
Mesmo admitindo que é legítimo ter imagens na igreja, muitos se recusam a ter imagens de Jesus. Jesus é Deus encarnado, então uma imagem de Jesus é uma imagem do próprio Deus. Como vimos, o Catecismo Maior proíbe “fazer qualquer imagem de Deus, de todas ou de qualquer das três Pessoas” (CMW, 109). Isso certamente inclui Jesus, a segunda pessoa da Trindade.
No entanto, preciso discordar novamente do Catecismo. Como vimos no capítulo 25, o segundo mandamento não proíbe fazer imagens, nem mesmo de Deus. Ele proíbe fazer imagens para adorá-las. A seguir respondo a alguns argumentos contra o uso pedagógico de retratos de Jesus.
Como Jesus é Deus, e Deus não pode ser representado, Jesus não pode ser representado também. Rejeito a premissa desse argumento de que Deus não pode ser representado. Embora Deus seja imaterial e invisível, ele tem muitas imagens. Cada ser humano é uma imagem dele, e Jesus é a imagem de Deus por excelência, é “a imagem do Deus invisível” (Cl 1.15; cf. Hb 1.3). Jesus reflete Deus, não apenas nos seus poderes e caráter, mas também no seu ser físico. Ele disse a Felipe: “Quem me vê a mim vê o Pai” (Jo 14.9).
Portanto, não há razão para assumir que Jesus não pode ser representado. Os apóstolos relembram o ministério do Cristo encarnado como uma pródiga festa visual (1Jo 1.1–3). Eles o viram e o observaram, ele se manifestou a eles. A natureza visual da encarnação era algo precioso para eles. Quando os docetistas surgiram negando que Jesus veio em carne, João identificou isso como uma terrível heresia (1Jo 4.2–3; 2Jo 7). Se houvesse câmeras naquele tempo, alguém podia ter fotografado Jesus. Se o Sudário de Turim se provar autêntico algum dia, fornecerá uma verdadeira semelhança do nosso Senhor.
Como não sabemos qual era a aparência de Jesus, qualquer imagem dele é necessariamente uma mentira. Na verdade, sabemos muitas coisas sobre a aparência de Jesus. Ele era um homem semita, com cerca de 30 anos na época do seu ministério. Às vezes usava um manto. Não temos mais detalhes (embora, repito, se o Sudário de Turim for autêntico, pode nos dar muitas informações adicionais).
Obviamente, nenhuma imagem, nem mesmo uma fotografia, revela tudo sobre uma pessoa. Retratos formais revelam apenas a frente, não as costas, e certamente não os órgãos internos. Não é justo dizer que um retrato é mentiroso porque exclui alguns detalhes. As pessoas em geral percebem a quantidade de detalhes que um artista usa em sua imagem, e elas não o consideram responsável por nada mais do que isso. Uma charge com uma caricatura de um político pode ser bem diferente do próprio político, mas quem entende as convenções da caricatura reconhecerá que a imagem capta a verdade. Ninguém sugere por aí que os caricaturistas mentem porque suas charges são muito diferentes das pessoas retratadas.
Às vezes, a relação entre uma imagem e seu tema é quase puramente convencional. Cornelius Van Til representou Deus como um círculo, colocado acima de um círculo menor que representa a criação. O círculo não se parece com Deus, nem mesmo com uma teofania. Mas as pessoas aceitam sem problemas as convenções desse tipo de diagrama, e ninguém o chama de mentiroso.
Portanto, é possível fazer uma figura genuína de Jesus, mesmo se a imagem não ficar muito parecida com Jesus. Qual é a utilidade disso? Isso nos lembra que Jesus é uma pessoa real e visível que se encarnou entre nós.
Alguns materiais para Escola Dominical, buscando respeitar o Catecismo Maior, incluem figuras de personagens e lugares bíblicos, mas não de Jesus. Essa prática gera no aluno a impressão de que Jesus era uma presença invisível durante seu ministério terreno. Isso incentiva o docetismo, a heresia a respeito da qual o apóstolo João nos preveniu nas passagens citadas antes. O docetismo diz que Jesus não veio realmente em carne. Esse é um erro muito sério, não algo que devamos incentivar nos nossos filhos. Pelo contrário, devemos incluir figuras de Jesus no nosso material de ensino, de modo a dar aos nossos alunos um senso da profunda visibilidade da vinda de Deus em nosso meio.
Imagens de Jesus limitam sua natureza divina ou a separam da sua natureza humana. Os iconoclastas da Igreja Oriental argumentavam que uma imagem de Jesus tenta representar sua natureza divina ou sua natureza humana. Se ela representa sua natureza divina, argumentam que ela a torna finita, limitada pelo meio artístico. Se ela representa apenas sua natureza humana, então faz uma separação entre as duas naturezas, uma heresia atribuída a Nestório e condenada pelo Concílio de Calcedônia em 451.
A resposta a esse dilema, penso, é que uma imagem de Jesus não é uma imagem de sua natureza divina ou de sua natureza humana, mas da sua pessoa. O Concílio de Calcedônia declarou que Jesus tinha duas naturezas numa só pessoa. Uma natureza não pode ser o objeto de um retrato. Naturezas são propriedades abstratas. Quando as pessoas viam Jesus na Terra, viam sua pessoa, um homem com duas naturezas, um homem que também era Deus. Certamente, elas o viam, o que significa que havia imagens de Jesus na retina e na mente delas. Só isso já mostra que imagens de Jesus são possíveis (de fato, inevitáveis) e legítimas.
Se sua natureza divina ficou limitada de algum modo, foi a limitação da sua encarnação, não de algum artista. Se alguém tirasse uma fotografia de Jesus, teria simplesmente registrado o resultado dessa limitação, a pessoa divino-humana Jesus, num filme. A questão de como a natureza divina pode se limitar à carne é um mistério da fé, mas é igualmente misteriosa quer haja ou não retratos de Jesus.
Portanto, não conheço nenhuma razão para se proibir figuras de Jesus. É claro, devemos ser cautelosos no uso dessas figuras, assim como com as demais formas de figuras analisadas na seção anterior. Pessoas que tendem a adorar imagens podem preferir especialmente adorar figuras de Jesus. Porém, em muitas situações hoje (como uma Escola Dominical comum para crianças), o perigo é mínimo ou inexistente. E há razões positivas para usar retratos de Jesus na pedagogia da igreja.