Convite às Nações
Notes
Transcript
1 Louvai ao Senhor, vós todos os gentios,
louvai-o, todos os povos.
2 Porque mui grande é a sua misericórdia para conosco,
e a fidelidade do Senhor subsiste para sempre.
Aleluia!
Meus irmãos, este é o menor salmo do Saltério. E também é o menor capítulo da Bíblia. É como um pequeno frasco, que contém o melhor perfume: há muitas verdades neste salmo.
Como na maioria dos salmos, não sabemos muito bem quando ele foi escrito. Mas podemos imaginar como ele era usado. Trata-se de um hino de louvor, um Salmo de Hallelu, que era entoado em ocasiões cúlticas.
Mas o que nos chama atenção neste salmo, e o que eu quero observar com você, é o convite que ele faz a todas as nações. Este salmo antecipa uma ênfase do Novo Testamento: a de que Deus tem interesse em trazer pessoas de todos os povos e tribos para junto de seu reino, para que o adorem.
Há duas lições que eu quero observar aqui, relacionada ao tema das missões que estamos estudando hoje:
O combustível das missões é adoração (v. 1)
O combustível das missões é adoração (v. 1)
A primeira lição aqui, meus irmãos, diz respeito ao que deve nos motivar a fazer missões, a nos envolver com missões. O combustível das missões é a adoração (v. 1).
Um chamado à adoração (v. 1)
Um chamado à adoração (v. 1)
Como vimos, este conjunto de salmos que vai do 113 ao 118 é chamado de “Salmos de Hallelu”. Há um outro conjunto mais à frente. A razão desse nome deve-se à primeira palavra do salmo: "Louvai". No hebraico, é hallelu.
Louvar significa elogiar. Muitas vezes as pessoas não sabem o que é “louvar”, mas significa exatamente isso: elogiar. Em Provérbios 31.28, é dito sobre a mulher virtuosa que o “seu marido a louva, dizendo: Muitas mulheres procedem virtuosamente, mas tu a todas sobrepuja”.
É o que nós fazemos quando adoramos a Deus: nós elogiamos Deus, nós exaltamos os atributos, a santidade, a grandeza, a glória de Deus. E é por isso que nos preocupamos aqui que os nossos cânticos e hinos de adoração sejam mais sobre Deus que sobre nós, que cantamos.
E aqui no Salmo, “Louvai” é um imperativo, o que pode ser um pedido, um convite, mas no caso aqui é uma convocação. Todos são convocados a adorar o SENHOR, Yahweh, o Deus de Israel.
No segundo verso, vemos uma outra expressão, traduzida como "louvai-o", no idioma original é um outro verbo: sabehu. O significado é o mesmo: louvar, exaltar, elogiar. Mas o curioso aqui é que esse verbo é uma palavra estrangeira. É um aramaísmo, uma palavra derivada da língua dos babilônicos.
O aramaico era a língua franca, o idioma mais falado na região que fora o império babilônico, tanto que os judeus falavam até os dias de Jesus. É como se o salmista , escrevendo em português, de repente falasse em inglês, para que todos entendam e atendam a convocação.
Um chamado às nações e povos (v. 1)
Um chamado às nações e povos (v. 1)
O que nos leva ao fato de que a convocação é dada a todas as nações e povos. Novamente, duas palavras são usadas aqui. A primeira, traduzida como "os gentios", significa "as pessoas que vivem num determinado território". Esta convocação não tem barreiras geográficas. É para pessoas de todos os lugares, nações, desde a cidade vizinha até os confins da terra.
Já o segundo termo, "povos", traz a ideia de uma comunidade, etnia, grupo pertencente a uma família. Pode ser traduzido como "tribo". Pense não apenas nas nações, mas naquelas pessoas que vivem entre nós, mas são diferentes de nós.
Pense, por exemplo, nos indígenas, nos quilombolas, naqueles que estão em subculturas urbanas, underground, punk, góticos. Todos eles devem receber esta convocação. Ou seja, todo tipo de gente, de toda origem, todas as famílias, são convocadas a adorarem a Deus.
Meus irmãos, aqui temos uma evidência de como Deus, já no Antigo Testamento, estava interessado em alcançar todos os povos. Se engana quem pensa que só no Novo Testamento esse interesse era presente. No Antigo Testamento vemos isso na história de Tamar, Raabe, Rute, dentre outras.
Os judeus tinham o papel de viverem de tal maneira que as nações seriam atraídas a conhecer o seu Deus, de maneira que glorifica a Deus entre as nações. Nós vemos isso no texto que lemos na liturgia, e quero lê-lo novamente com você:
5 Eis que vos tenho ensinado estatutos e juízos, como me mandou o Senhor, meu Deus, para que assim façais no meio da terra que passais a possuir. 6 Guardai-os, pois, e cumpri-os, porque isto será a vossa sabedoria e o vosso entendimento perante os olhos dos povos que, ouvindo todos estes estatutos, dirão: Certamente, este grande povo é gente sábia e inteligente. 7 Pois que grande nação há que tenha deuses tão chegados a si como o Senhor, nosso Deus, todas as vezes que o invocamos? 8 E que grande nação há que tenha estatutos e juízos tão justos como toda esta lei que eu hoje vos proponho?
Esse chamado foi ignorado pelos líderes israelitas ao longo dos séculos. Eles negligenciaram seu dever. Nós vemos nos evangelhos que no tempo de Jesus, que eles eram exclusivistas, criavam barreiras, exigiam dos gentios o que Deus não exigia, que cumprissem as ordenanças que Deus impôs apenas aos israelitas. Até mesmo os judaizantes, queriam exigir dos gentios que fossem circuncidados e praticassem os costumes judaicos. Eles não permitiam que o gentio se aproximasse do evangelho sem também abraçar sua cultura
Mas esse salmo nos aponta para o fato de que era a intenção de Deus alcançar todos os povos. Era propósito de Deus criar uma comunidade que unia em si judeus e gentios, em Cristo Jesus. O apóstolo Paulo cita esse Salmo, junto de outros textos da Escritura em Rm 15.8-12, e todos eles apontam para tal realidade:
8 Digo, pois, que Cristo foi constituído ministro da circuncisão, em prol da verdade de Deus, para confirmar as promessas feitas aos nossos pais; 9 e para que os gentios glorifiquem a Deus por causa da sua misericórdia, como está escrito:
Por isso, eu te glorificarei entre os gentios e cantarei louvores ao teu nome.
10 E também diz:
Alegrai-vos, ó gentios, com o seu povo.
11 E ainda:
Louvai ao Senhor, vós todos os gentios, e todos os povos o louvem.
12 Também Isaías diz:
Haverá a raiz de Jessé, aquele que se levanta para governar os gentios; nele os gentios esperarão.
Aqui temos uma expressão do que podemos chamar de "universalismo evangélico". Há um tipo de universalismo que prega que Deus salvará todos no final. Isso é chamado de "universalismo absoluto". Não é nisso que cremos. Nem todos serão salvos, mas muitos serão condenados. Mas cremos que o convite do evangelho, o chamado universal, é dirigido a toda as nações e etnias.
Muitas vezes nós agimos tal qual os fariseus do tempo de Jesus: excluindo alguns, impedindo que pessoas de diferentes culturas se juntem a nós. Devemos nos lembrar de que o chamado do evangelho é para todas as nações e etnias. Isso inclui o islamita. Isso inclui os refugiados. Isso inclui o imigrante. Isso inclui aqueles de quem discordamos.
Isso significa que devemos nos envolver com a obra missionária em outros países, mas também em alcançar diversas tribos aqui mesmo em nossa cidade.
É muito fácil e natural para nós alcançar pessoas parecidas conosco. Pessoas que tem os mesmos gostos, costumes, idade, situação econômica. Até na igreja nos organizamos assim, não é mesmo? É difícil para nós alcançar o diferente, em especial aquele que não entendemos ou não concordamos. Muitas vezes até os consideramos "caso perdido".
Quero que você pense: como você pode se esforçar para compartilhar o evangelho com alguém diferente de você? Esta semana mesmo, tente falar com aquele parente difícil, com aquele vizinho diferente, com aquele colega de trabalho difícil. Essa pessoa também precisa ouvir a convocação de Deus. Você também era caso perdido, e Deus te salvou.
E o que deve nos motivar a fazer isso? Aqui vemos que a adoração é o verdadeiro motivo das missões. O propósito central da igreja não é missões, mas adoração. A coisa principal que fazemos é adorar. O culto ao Senhor é a principal tarefa da igreja. Missões vem em decorrência disso. Queremos que o nome de Deus seja mais glorificado na terra, que o mundo seja cheio de sua glória. E é por isso que pregamos o evangelho: para que mais pessoas glorifiquem a Deus.
Irmãos, se te falta ímpeto missionário, talvez o que te falte seja o desejo de ver Deus sendo adorado.
Muitas vezes, cristãos são motivados às missões por discursos de medo e culpabilização. Você já deve ter visto isso alguma vez, um terrorismo: “você tem que pregar pra sua família hoje, senão eles irão par ao inferno!”
Isso pode funcionar por algum tempo, mas não funcionará para sempre. Ninguém consegue viver muito tempo motivado pelo medo. O nosso combustível deve ser a adoração e o desejo de ver Deus sendo adorado por mais gente.
O que te impede de evangelizar? É a timidez? O medo de que te rejeitem? O receio de perder posições ou prestígio? E o que te impede de contribuir, de se envolver, de orar e doar à causa missionária? É medo de as contas não fecharem no fim do mês? Ou simples avareza, considera isso uma perda de tempo e dinheiro?
Se pensarmos em missões como um ato horizontal, motivado apenas por aquilo que gera aqui, é difícil vencermos tais barreiras. Mas pense que missões é uma decorrência da adoração a Deus. Lembre-se de que cada semente que esse envolvimento é um ato de adoração, de serviço, com o propósito de magnificá-lo. Então vá e se envolva.
O propósito das missões é levar o evangelho (v. 2)
O propósito das missões é levar o evangelho (v. 2)
No segundo versículo desse salmo, vemos a razão do apelo, o motivo que deve levar os povos a louvarem o Senhor. A expressão “porque”, assim como vemos em outros salmos de louvor, nos traz a razão pela qual Deus deve ser louvado.
E isso nos mostra o que deve conter o nosso apelo às nações. Qual mensagem devemos levar às nações a fim de que louvem ao Senhor? E assim vemos que o propósito das missões é levar o evangelho (v. 2).
Devemos louvar a grande misericórdia de Deus (v. 2)
Devemos louvar a grande misericórdia de Deus (v. 2)
O salmista apresenta razões pelas quais os gentios devem louvar ao Senhor. Uma delas é a sua grande misericórdia para com Israel. O termo misericórdia pode ser traduzido também como como "amor pactual", que é aquele amor, aquela bondade, que é demonstrado num contexto de aliança. “Eu amo, e por isso eu me comprometo com você.” Esse é o amor de Deus para com o seu povo: ele se compromete a resgatar, salvar, preservar e levar o seu povo ao destino final.
Israel testemunhou esse amor leal de Deus ao longo da história. O Senhor os livrou do Egito, deu a eles a Lei, foi paciente com eles por muito tempo. os disciplinou, mas depois os livrou da Babilônia. Por isso, o salmista fala que essa misericórdia é "mui grande". Ela prevalece sobre todas as dificuldades. O termo traduzido aqui como “grande” também pode significar “aquilo que prevalece, que vence, que é superior”. É o que vemos em Êxodo 17.11, a mesma palavra no Hebraico, na luta de Israel contra Amaleque.
11 Quando Moisés levantava a mão, Israel prevalecia; quando, porém, ele abaixava a mão, prevalecia Amaleque.
Isso pode nos trazer a ideia também de que esse amor de Deus é um amor que vence, que prevalece. Ele prevalece contra todas as dificuldades, sobre tudo o que poderia nos separar de Deus, principalmente o nosso pecado.
Devemos louvar a Deus por sua fidelidade eterna (v. 2)
Devemos louvar a Deus por sua fidelidade eterna (v. 2)
Outra razão pela qual Deus deve ser adorado é a sua fidelidade (v. 2). Fidelidade é a característica de alguém que é confiável, verdadeiro no que diz, aquele que você pode crer em suas promessas. E o salmista diz que a fidelidade do Senhor é eterna. Aquelas promessas que Deus fez, ele irá cumprir.
Tanto o termo misericórdia como fidelidade aparecem num dos textos bíblicos preferidos dos judeus no período pós-exílico: Êxodo 34.6-7.
6 E, passando o Senhor por diante dele, clamou: Senhor, Senhor Deus compassivo, clemente e longânimo e grande em misericórdia e fidelidade; 7 que guarda a misericórdia em mil gerações, que perdoa a iniquidade, a transgressão e o pecado, ainda que não inocenta o culpado, e visita a iniquidade dos pais nos filhos e nos filhos dos filhos, até à terceira e quarta geração!
Ali, quando Deus revela sua glória a Moisés, ele se revela como Deus misericordioso e fiel. A sua misericórdia está no fato de que ele não derrama imediatamente sua ira, mas é paciente e perdoador. E a sua fidelidade no fato de que essa misericórdia é estendida por geração após geração.
O remanescente fiel de Israel pôde vislumbrar essa fidelidade de Deus ao longo da História. Deus os perdoou os pecados, diversas vezes. E eles puderam ver a salvação sendo passada de geração em geração, os filhos seguindo e guardando a aliança com Deus.
Amor e fidelidade resumem o relacionamento pactual de Deus para com o seu povo. E o amor e a fidelidade de Deus são demonstradas a nós principalmente no fato de ter Deus entregue Jesus Cristo para expiar os pecados de seu povo. Conforme Romanos 8.32, o fato do Pai nos ter dado a Cristo é uma expressão de seu grande amor.
32 Aquele que não poupou o seu próprio Filho, antes, por todos nós o entregou, porventura, não nos dará graciosamente com ele todas as coisas?
João 3.16 também fala desse amor, de Deus ter dado seu próprio filho para nos salvar.
16 Porque Deus amou ao mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigênito, para que todo o que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna.
Em suma, misericórdia e fidelidade são demonstrados no fato de que Deus enviou Jesus Cristo para salvar pecadores. Então, no apelo que faremos às nações para que adorem a Deus, qual a razão que devemos apresentar? É a misericórdia e fidelidade de Deus. E onde elas são demonstradas? No perdão dos pecados e na salvação oferecida ao que crê. Em outras palavras, o apelo às nações é o anúncio do evangelho. O evangelho, meus irmãos, é o que devemos levar aos povos.
Evangelizar é proclamar o evangelho de Jesus Cristo. É compartilhar Jesus Cristo, sua obra e convidar as pessoas a crerem nele e se arrependerem. Jesus é o conteúdo do evangelho, o conteúdo do apelo.
Muitas vezes nós confundimos a tarefa. Houve momentos na história em que a igreja pensou que a sua missão era civilizar os povos, educá-los, oferecer ajuda social, promover transformação sociopolítica.
Além disso, muitas vezes a igreja faz apelos bem diferentes aos pecadores. Queremos que os povos venham a Deus, mas em nosso apelo, fazemos bem diferente do salmista, pois ao invés de falar da misericórdia e fidelidade de Deus expostas no evangelho, prometemos coisas que a Bíblia não promete.
Evangelizar não é o mesmo que oferecer palavras de consolo (embora haja momentos para isso). Evangelizar não é fazer afago ao ego, dizendo que as pessoas têm um valor ou são especiais para Deus. Evangelizar não é prometer conforto psicológico, dizendo às pessoas que terão uma "chance de recomeço" ou jargões do tipo.
Evangelizar é dizer aos pecadores o que Deus fez para salvá-los. É falar do amor e da fidelidade de Deus, que perdoa pecadores e salva todo aquele que crê e toda sua família. Evangelizar é falar de Jesus Cristo!
Há mais uma coisa neste salmo que você deve se atentar. O salmista termina com um "Aleluia!". Alguns veem nisto um sinal de que este salmo tem um quiasmo, ele termina do mesmo jeito que começa, chamando pessoas à adoração.
De fato, Aleluia é, na verdade, uma junção de duas palavras do hebraico: "Hallelu Yah!", que significa, "Louvem a Yahweh!". Mas aqui isto forma uma interjeição, uma expressão de exultação, como se o próprio salmista agora resolvesse louvar ao Senhor. O salmista, que convoca outros à adoração, é exemplo daquilo que chama a outros a fazer.
E esta é a conclusão, meus irmãos: o evangelho é o conteúdo do apelo às nações. Devemos pregar o evangelho. Mas a nossa mensagem deve ser acompanhada pela nossa vida, pela nossa conduta, pela nossa devoção pessoal.
Uma mensagem acompanhada de um coração que ama o Senhor será poderosa, pois será pregada com o poder de Deus, e será crível aos olhos de quem vê. Pois antes de você pregar qualquer coisa, sua vida será observada. Mas além disso, o foco na adoração, como vimos antes, livra-nos de evangelizar como se tudo dependesse de nós, e nos volta os olhos àquele que é a razão do nosso viver: o nosso Senhor.
Meus irmãos, que assim seja. Que a adoração seja o combustível para o nosso envolvimento missionário. E que o evangelho seja o nosso apelo, a nossa bandeira, a nossa mensagem acompanhada de uma vida que ama a Deus. Que Deus nos abençoe!