Êxodo 5.1-21
Série expositiva no Livro do Êxodo • Sermon • Submitted • Presented
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· 14 viewsO autor divino/humano esclarece aos leitores/ouvintes do texto as intenções nefastas do exatores e opressores da igreja, ao imporem sofrimento ao povo de Deus.
Notes
Transcript
"São estes os nomes..." (Êx 1.1).
Pr. Paulo U. Rodrigues
Introdução
Após o ratificação de Moisés como sendo a ferramenta usada por Deus na declaração ao povo (e consequentemente ao Faraó) da redenção que será executada, o autor retoma a narrativa concernente à situação do povo em aflição na terra do Egito. Essa retomada serve como introdução ao momento em que a execução da libertação será iniciada, trazendo consigo a manifestação dos prodígios divinos prometidos pelo SENHOR a Moisés, que por sua vez, obrigariam o monarca egípcio a deixar ir os filhos de Israel (cf. 3.19-20).
Nada obstante, o registro narrativo salienta os objetivos ou motivos implícitos à opressão experimentada pelos filhos de Israel: o anúncio das intenções do SENHOR de fazer seu povo ir "para que me celebre uma festa (i.e. culto) no deserto" (v.1).
Diante da comunicação da vontade divina, o rei do Egito mostra-se contrário não apenas à libertação dos hebreus, mas também ao próprio SENHOR (cf. v. 2 "Quem é o SENHOR para que lhe ouça eu a voz...?"), e intensifica sua ação opressora sobre os hebreus, a fim de que "não deem ouvidos a palavras mentirosas" (v.9); isto é, que não ouçam as palavras que lhes anunciam a libertação.
Esses dois pontos circunscrevem e evidenciam a natureza do endurecimento do coração do rei egípcio: em primeiro lugar, a tentativa de impedir que o povo preste culto ao Deus de seus pais, obstruindo assim a fruição e cumprimento da palavra da aliança proferida no passado; e em segundo, por meio da opressão, desviar a atenção do povo, para que não creiam nas palavras que lhe garante tal feito.
Assim, a presente seção resume no que consistia a aflição a que o povo de Israel estava sendo submetido, o que à luz do caráter exortativo anexo ao texto, centraliza o dever que os filhos de Deus possuem diante do SENHOR: lhe prestar culto e servir, crendo nEle (tal como fizeram ao terem sido expostos ao emissário enviado (vs. 4.18-31) como seu redentor e salvador.
Diante disso, a síntese teleológica do texto de Êxodo 5.1-21 consiste na demonstração do caráter opositivo/opressor imposto contra o povo de Deus.
Elucidação
Após terem os filhos de Israel crido nas palavras proferidas por Arão e nos sinais concedidos por Deus através de Moisés, de que o SENHOR de fato os haveria de libertar das cargas da opressão, o autor, como introduzido, volta a tratar da tensão criada a partir da aflição imposta sobre os hebreus por Faraó.
O versículo 1 do presente capítulo registra a ida de Moisés e Arão à corte egípcia, para lá comunicarem ao Faraó o edito divino. A exigência do Deus dos hebreus é clara: havia chegado o momento em que a vontade do SENHOR era de que seu povo o adorasse e servisse. Israel, como filho primogênito de Deus (cf. 4.22), deveria servir ao seu único e verdadeiro senhor. A relação de filiação apresentada anteriormente estabelece o vínculo entre o povo e seu Deus, e tal união seria expressa mediante o serviço que a descendência de Abraão prestaria diante de seu Redentor, em adoração.
Um terceiro integrante nessa conexão está terminantemente excluído, principalmente se este intenta dividir ou impedir que o serviço/adoração que Israel deve direcionar ao SENHOR, seja exclusivo.
Assim, a ordem emitida está embasada nesse princípio: "Deixa ir o meu povo, para que me celebre uma festa no deserto" (v.1). Por outro lado, Faraó apresenta sua antagonia, como introduzido, não somente contra a exigência divina, mas também contra o próprio SENHOR, e faz isso de forma desdenhosa: "Quem é o SENHOR para que lhe ouça eu a voz e deixe ir a Israel?".
A irônica fala do rei egípcio qualifica sua rivalidade contra o Deus dos hebreus, ao passo que também seu desconhecimento quanto a quem é o SENHOR, identifica sua condição de estranho em relação a este; o que passa a ser usado por Moisés e Arão como uma ameaça ao monarca.
Ao ouvirem a resposta de Faraó, Moisés e Arão enfatizam a ordem divina que lhes foi direcionada, como segue:
Eles prosseguiram: O Deus dos hebreus nos encontrou; deixa-nos ir, pois, caminho de três dias ao deserto, para que ofereçamos sacrifícios ao Senhor, nosso Deus, e não venha ele sobre nós com pestilência ou com espada.
Se Deus estaria disposto a disciplinar aqueles a quem chamou de "meu filho, meu primogênito" (cf. 4.23), com pestilência e espada, muito mais faria com aquele que, de maneira insolente, colocou-se entre Deus e seu povo. O aviso de Moisés não aponta (apenas) para a seriedade da ordem que receberam do SENHOR quanto ao serviço de culto, mas reflete o risco que Faraó estava correndo ao tentar contrariar tão grave ordenança. A postura contumaz de Faraó em não deixa ir o povo (v.2), verdadeiramente poderia fazê-lo sentir o peso da mão forte do SENHOR (cf. 3.19-20) que traria pestilência e espada sobre a terra do Egito.
Ignorando tamanha advertência, segundo o registro autoral, Faraó resiste em obedecer o edito divino, e nesse ponto, Moisés inicia descrição do movimento opositor do rei egípcio contra as palavras e os planos divinos de libertação de seu povo: Faraó intensifica a aflição que fora imposta sobre os filhos de Israel:
Então, lhes disse o rei do Egito: Por que, Moisés e Arão, por que interrompeis o povo no seu trabalho? Ide às vossas tarefas. Disse também Faraó: O povo da terra já é muito, e vós o distraís das suas tarefas.
Os versículos de 6 à 21, demonstram a truculência egípcia em rebelar-se contra o SENHOR. Faraó ordena que seus superintendentes interrompam o fornecimento da matéria-prima para confecção de tijolos, que era entregue aos hebreus (cf. vv.7,10-11, 18-19), exigindo, todavia, que fosse produzida a mesma quantidade. Contudo um ponto é reiterado pelo autor: em primeiro lugar, como já aludido, Faraó quer realmente impedir que os hebreus prestem culto (i.e. sirva (cf. 1.13)) ao SENHOR. Tal intento é registrado enfaticamente nos versículos 8 e 17:
Êxodo 5.8
E exigireis deles a mesma conta de tijolos que antes faziam; nada diminuireis dela; estão ociosos e, por isso, clamam: Vamos e sacrifiquemos ao nosso Deus.
Êxodo 5.17
Mas ele respondeu: Estais ociosos, estais ociosos; por isso, dizeis: Vamos, sacrifiquemos ao Senhor.
Contudo, ligado a isso, a intenção mais profunda do rei egípcio consiste numa contrariedade (segundo apontado desde o início das análises do texto de Êxodo) à própria obra redentiva/libertadora, que foi mencionada por Moisés e Arão, que beneficiaria os filhos de Israel. Ao ter recebido a exigência divina, Faraó mobiliza os egípcios para afligirem os hebreus com mais trabalhos a fim de que "nele se apliquem e não deem ouvidos a palavras mentirosas" (v.9).
O pensamento do mandatário egípcio é obstruir que os filhos de Israel atentem às palavras mencionadas por Moisés, e nelas confiem ao ponto de aguardar que o SENHOR verdadeiramente cumpra o que lhes foi prometido. A antagonia egípcia está para além do interesse em manter os hebreus como seus escravos; centraliza-se numa oposição à salvação referida pelo SENHOR.
O tom exortativo direcionado por Moisés relembra os filhos de Israel de que a opressão egípcia envolveu todo uma estratagema antagônico a fruição da benção divina por parte de povo de Deus. Faraó estava motivado não somente a subjugar a descendência de Abraão à escravidão, mas, através disso, a também afastar o povo de seu Deus.
Um argumento usado por Moisés posteriormente, para que Deus usasse de clemência para com os filhos de Israel devido o pecado de rebeldia/idolatria que haviam cometido, foi "Não é, porventura, em andares conosco (uma referência à relação entre Deus e Israel) de maneira que somos separados, eu e o teu povo, de todos os povos da terra? (Êx 33.16). Ao intensificar a aflição sobre os filhos de Israel, tentando-os fazer não dar ouvidos às palavras de anúncio da libertação proferidas por Moisés, Faraó buscou anular a aliança, tornando Israel submisso não a Deus, mas si. A escravidão tornava o povo servos, não daquele que os havia chamado, em seus pais (i.e. Abraão, Isaque e Jacó) como seu povo, através do qual seu nome seria glorificado sobre em toda a terra, mas de Faraó, fazendo a promessa abraâmica ser invalidada.
A queixa final dos filhos de Israel a Moisés e Arão resume a tensão entre o povo de Deus e o Faraó, introduzindo a seção seguinte, onde ocorrerá a rememoração das palavras divinas que reafirmam o compromisso do SENHOR de, mesmo diante a oposição faraônica, retirar seu povo de sob as cargas da escravidão:
e lhes disseram: Olhe o Senhor para vós outros e vos julgue, porquanto nos fizestes odiosos aos olhos de Faraó e diante dos seus servos, dando-lhes a espada na mão para nos matar.
Transição
A situação aflitiva enfrentada por Israel no passado, é usada pelo autor como ponto exortativo a partir do qual toda a dificuldade vivida por Israel é interpretada.
Faraó, em sua rebeldia contra Deus, buscou afastar o povo da aliança de seu redentor, fazendo Israel ignorar ou não crer nas palavras que lhe ratificava o compromisso divino de os tirar de fornalha de ferro do Egito.
A partir dessa compreensão, o povo de Deus, ao ver-se em aflição, deve compreender que as intenções de seus exatores consistem em romper a relação redentiva que os torna filhos de Deus, conduzindo-os para longe de seu Libertador. A igreja, neste mundo, vivendo num ambiente avesso ao Deus da Aliança que os redimiu em Cristo, é alvo do desconhecimento dos ímpios quanto a quem é o SENHOR, tal como Faraó (cf. v. 1-2). A opressão e perseguição que o mundo direciona ao povo de Deus, para além da sórdida intenção de infligir sofrimento, centraliza a gana diabólica dos rebeldes ao Reino de Deus, de invalidar o pacto redentivo que reserva glória ao nome do SENHOR, mediante a libertação de seu filho (i.e. o povo).
Compreendendo esse princípio, o texto de Êxodo 5.1-21, sintetiza as seguintes verdades a serem observadas pela igreja:
Aplicações
1. A busca incansável dos opressores da igreja, é fazer o povo de Deus experimentar sofrimento e aflição, impedindo-os de crer nas palavras que lhe garante a redenção/libertação.
Embora a intenção seja exatamente a mesma, a forma por meio da qual os inimigos da igreja (o pecado, o diabo, o sistema anticristão mundano etc) buscam lograr êxito na tentativa de fazer a igreja desviar-se das palavras redentivas proferidas pelo SENHOR através de seu Profeta (i.e. Cristo Jesus), mostra-se diferente em nosso tempo.
Os adversários do povo de Deus não usarão mais a escravidão ou servidão para nos distrair ou tirar nosso foco da promessa divina de salvação. Os próprios encargos dessa vida, a cultura, as filosofias que guiam o estilo de vida das pessoas, todas essas coisas podem ser ferramentas usadas pelos faraós desse mundo, na tentativa de fazer o povo não mais atentar às voz do SENHOR.
Quantos cristãos atualmente, perdem-se em seus trabalhos, cuidados pessoais, riquezas, projetos próprios, não refletindo que toda a eternidade está diante deles? Quantos crentes em Cristo Jesus, não tem sido escravizados a pensarem somente nessa vida, como o fim último de sua existência? Até mesmo princípios válidos aos olhos de Deus, como nosso sustento, podem se tornar armadilhas por meio das quais somos atados aos pesados fardos de um mundo que apenas deseja nos fazer perder de vista, que Deus ouviu o clamor de seu povo e está descendo a fim de livrá-los da fornalha de ferro, e levá-los à Terra Prometida.
É preciso que a igreja esteja vigilante e mantenha seus olhos fixos no SENHOR e em sua palavras. Como afirma o autor aos Hebreus: “guardemos firme a confissão da esperança, sem vacilar, pois quem fez a promessa é fiel” (Hb 10.23).
Viver nesse mundo indica que estamos cercados de ilusões que tem como objetivo cegar nossos olhos e obstruir nosso entendimento quanto à salvação que se aproxima. Se cedermos e desistirmos de lutar contra a opressão de Faraó, viveremos sob o chicote daquele que deseja apenas nos fazer sofrer, distanciando-nos cada vez mais de nosso único e verdadeiro senhor.
2. Ligado a isso, a base da perversa iniciativa mundana de opressão dos filhos de Deus, é o desejo de fazê-los distanciar-se de sua relação pactual-salvífica com o SENHOR, impedindo a igreja de servir seu único e verdadeiro senhor: o Deus Triúno.
O alvo do engano presente em nossa natureza corrupta, potencializado pela ação de Satanás e do mundo, sempre serão desfazer aquilo que Deus criou bom e perfeito, o que inclui nossa adoção como filhos de Deus. Embora seja impossível que isso efetivamente aconteça, os inimigos do povo de Deus farão tudo o que estiver ao seu alcance para que, como igreja, vivamos nesse mundo mais como seus servos do que como servos do Deus Altíssimo.
O pecado, o diabo, o mundo e seus prazeres, seus convites maldosos, o sistema cultural em que vivemos, todas essas coisas, sendo os “faraós do nosso tempo”, tentarão nos colocar de joelhos diante deles, a fim de que os sirvamos, e não ao nosso Deus.
O chamado e ordem de Deus aos filhos de Israel foram claros: celebrem uma festa ao SENHOR. Só ao SENHOR, nosso Deus, é devido culto; somente à ele nosso coração deve adorar e servir, de toda nossa alma, força, e entendimento. Se fraquejarmos, devido a aflição imposta por nossos inimigos, e vivermos para servir a outro além de Deus, estaremos agindo não como filhos de Abraão e herdeiros do Deus que lhe apareceu e prometeu que nele seriam abençoados todas as famílias da terra, mas como mundanos, e não há pior jugo que pode ser colocado sobre um filho de Deus, do que o do mundo.
O brado divino publicado na corte de Faraó, ecoa geração após geração, chamando os eleitos de Deus a resistirem firmes diante da aflição que o mundo tenta impor sobre a igreja. Mantenhamos acesa a esperança e confiança na palavra de adoção que recebemos do SENHOR em seu Cristo, de que como seus filhos, seremos libertados do cativeiro, e rumaremos à Terra Prometida; à Nova Jerusalém, quando celebraremos uma eterna festa ao SENHOR.
Conclusão
Os filhos de Deus — seu povo — estão sendo oprimidos por aqueles que, em sua rebeldia contra o SENHOR, os querem tornar seus servos mediante opressão e aflição. Mas, embora tentem apagar da memória do povo as palavras da redenção, a igreja, ainda que seja vista como odiosa pelo mundo, aguardará que a mão forte do Deus da Aliança os guie ao lugar onde celebrarão e cultuarão o seu nome.