Atos 4.32-35

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O autor demonstra a comunhão como uma das marcas da comunidade de discípulos de Cristo que, ao lado do anúncio do evangelho, é essencial para cumprimento da missão testemunhal da igreja.

Notes
Transcript
"(…) E sereis minhas testemunhas (…) até aos confins da terra" (Atos 1.8).
Pr. Paulo U. Rodrigues
Introdução
Após a descrição da reação da igreja diante da perseguição e ameaças sofridas por parte dos que desejavam opor-se ao testemunho prestado pelos discípulos, Lucas prepara-se para adentrar numa nova seção de seu texto, estruturando um padrão que estabelece a progressão do cumprimento da missão testemunhal recebida pela igreja desde o Pentecostes.
O sinal (i.e. milagre) do derramamento do Espírito Santo em Atos 2.1-13, seguido pela conversão dos três mil através do discurso apostólico (cf. 2.14-41) e demonstração da ação do Espírito na igreja (2.42-47), é o arquétipo replicado ao longo dos capítulo 3 e 4: 1) Na cura do coxo, como realização de um sinal ou milagre que aponta para a glória do Cristo ressurreto (cf. 3.1-26, equivalente ao falar noutros idiomas), que proporciona, por sua vez, 2) o chamamento de pecadores ao arrependimento e fé no Senhor a partir da pregação de Pedro (cf. 4.1-5), sendo anexo a este último, o tópico da perseguição contra a comunidade dos discípulos (cf. 4.5-22), e por fim, 3) o último item, de acordo com tal padrão, seria exatamente um relato resumido de como viviam os discípulos do Senhor Jesus, de acordo com a operação do Espírito Santo, que é apresentado na presente seção dos versículo 32 ao 35 deste capítulo 4.
A síntese descritiva da vida da comunidade demarca o início de uma nova seção que, como dito, alude à expansão da obra de anúncio da ressurreição de Cristo e sua respectiva glorificação, o que por seu turno, incide diretamente na motivação da igreja em ecoar o chamado à salvação. Todavia, um fator principal é centralizado por Lucas na presente narrativa: a mentalidade comunitária radicada na igreja.
Embora já tenha sido mencionado no capítulo 2.44-45 que "os que creram estavam juntos e tinham tudo em comum. [Que] vendiam suas propriedades e bens, distribuindo o produto entre todos", o autor enfatiza esse ponto novamente em 4.32-35, tanto como uma exortação à unidade, que rememora àquele primeiro relato, como também prepara o cenário para a narrativa seguinte, em que exemplos positivos e negativos quanto a essa mentalidade são demonstrados.
A comunhão experienciada pela igreja, a fazia orbitar ao redor dos princípios antes clarificados: perseverança na doutrina, comunhão sincera e adoração reverente, são expostos através do sentimento de que os discípulos viviam verdadeiramente unidos, tendo uma mesma compreensão quanto a seu papel como testemunhas do Cristo glorificado, e o reflexo disso, segundo Lucas, era a própria comunhão.
Tendo como base essas considerações, o texto de Atos 4.32-35 enfatiza a comunhão como marca da progressão do testemunho evangélico.
Elucidação
A narrativa parte do registro da fé dos que receberam a palavra (cf. v.1); número que foi acrescido mediante o testemunho prestado pelos apóstolos, conforme é visto no versículo 32: "Da multidão dos que creram...". O crescimento numérico da comunidade não alterou a essência que a caracteriza como testemunha de Cristo, e tal ênfase, aliada ao argumento posterior, enquadra a exortação de que ter um mesmo pensamento (cf. v. 32 "era um o coração e a alma"), é um dos símbolos da operação do Espírito Santo no meio da igreja.
De acordo com que fora introduzido, embora a presente seção possa ser um desdobramento daquela registrada em 2.42-47, o aspecto central que resume todos os outros princípios (i.e. doutrina e adoração) é a mentalidade comunitária da igreja. Levando em consideração o principal tema do texto de Atos dos apóstolos, que é o cumprimento da missão testemunhal da igreja "até aos confins do mundo" (cf. 1.8), a insistência na temática da comunhão e caridade presente entre os discípulos, centraliza essa marca como tão importante ao cumprimento do papel testemunhal da igreja, quanto o movimento de anúncio do evangelho aos pecadores propriamente dito. Lucas enfatiza formalmente que ao lado da ação testemunhal dos apóstolos e demais discípulos, está o sentimento comunitário, como fica claro a partir da continuação do versículo 32: "Ninguém considerava exclusivamente sua nem uma das coisas que possuía, tudo porém, lhes era comum".
O cuidado pessoal que cada discípulo tinha em ver-se como parte de um todo maior, o conduzia à uma mentalidade que colocava a necessidade de um irmão acima de seu bem-estar. A repetição do termo "κοινά" ao longo de toda narrativa até este ponto (cf. 2.42,44; 4.32), demonstra uma busca da parte do autor de intercambiar sua aplicação à realidade da comunidade. Tão forte era a ligação entre os discípulos de Cristo na igreja, que a comunhão que desfrutavam eram externada a partir da partilha de seus próprio bens.
Entre essa descrição e a seguinte, no versículo 34, que continua o relato do espírito comunitário da igreja, o autor confirma esse aspecto da vida do ajuntamento dos discípulos como próprio à comunidade dos que creram em Cristo, descrevendo o andamento da execução de sinais e prodígios operados através dos apóstolos:
Atos dos Apóstolos 4.33 ARA
Com grande poder, os apóstolos davam testemunho da ressurreição do Senhor Jesus, e em todos eles havia abundante graça.
Nesse ponto, é possível acrescentar ao presente relato a compreensão extraída da seção anterior. Tendo sido ameaçados, os discípulos oraram ao SENHOR clamando que lhes fosse concedido "anunc(iar) com toda a intrepidez a tua palavra, enquanto estendes a mão para fazer curas, sinais e prodígios" (v.29-30a).
O referido testemunho dos apóstolos prestado com grande poder, consiste numa forma de Lucas demonstrar a resposta do SENHOR às orações da comunidade. A preocupação fundamental da igreja não foi abandonada, mas, como salientado reiteradamente, estava sendo expresso também com a própria comunhão que experimentavam.
A mão estendida do SENHOR não somente proporcionava o avanço do testemunho evangélico através dos apóstolos, concedendo intrepidez aos discípulos, mas também confirmava sua identidade testemunhal a partir do cultivo de um sentimento corporativo poderosamente presente na vida da igreja.
Os resultados disso, são apresentados na sequência:
Atos dos Apóstolos 4.34 ARA
Pois nenhum necessitado havia entre eles, porquanto os que possuíam terras ou casas, vendendo-as, traziam os valores correspondentes
Naturalmente, a perspectiva do texto não é declarar que não haviam pobres, ou que todos, a partir das doações feitas, foram nivelados à uma mesma condição sócio-econômica. O ponto de Lucas é salientar que a preocupação com os necessitados por parte dos próprios discípulos era verdadeira a tal ponto de as necessidades serem supridas pelo socorro prestado voluntariamente por aqueles irmãos que tinham alguma posse.
Os próprios apóstolos recebiam essas doações e administravam “à medida que alguém tinha necessidades” (v.35), tamanha era a entrega e empatia vivida pela comunidade naquele momento.
Transição
O testemunho apostólico era central à obra de expansão da igreja até os confins do mundo. Todavia, não era a única forma por meio da qual a igreja testificava da glória de Cristo mediante o poder do Espírito. A comunhão verdadeira proporcionava um fiel quadro de como aqueles que creram devem viver na comunidade dos discípulos.
Lucas direciona a seus leitores uma exortação franca sobre como o testemunho do evangelho não é algo apenas direcionado para fora, isto é, a partir de um movimento expansionista que alcança os perdidos, mas é uma realidade completa, que abarca todos os aspectos da vida da igreja, principalmente mediante a introdução de cada discípulo numa corporação que, com “um mesmo coração e alma” vive a redenção.
A comunhão vivida pela igreja reflete a obra do Espírito que dá glória a Cristo. E tal princípio é exibido no início do trajeto testemunhal da igreja, a fim de que faça parte de toda sua história, até o momento em que fruirá seu objetivo: alcançar o mundo inteiro com a mensagem evangélica.
Isto posto, o texto de Atos 4.32-35, salienta a seguinte verdade à igreja contemporânea:
Aplicação
O poder do Espírito e a glória de Cristo são testemunhados pela igreja, não apenas a partir da vocalização ou anúncio externo que propagamos ao mundo, mas de igual modo, a partir da comunhão presente entre aqueles que creram na palavra da salvação.
De acordo com o relato de Lucas, a comunhão da igreja não era um mero acessório ou valor decorativo da comunidade dos discípulos. Era na verdade uma manifestação parelha à capacitação do Espírito para a testificação do evangelho aos confins do mundo, que também conduzia a igreja à fruição desse propósito.
Estar em comunhão não era um mero pensamento belo que pairava sobre a cabeça dos nosso irmãos no passado, mas uma realidade perene, que movia o coração dos discípulos à verem-se como um corpo. Isso era um indicativo de que tão importante quanto a ação dos apóstolos em propagarem o evangelho para o arrependimento e salvação dos perdidos, era o modo como vivia a própria igreja, pois aqueles que eram chamados à fé, eram introduzidos nessa comunidade, onde deveriam continuar experimentando a glória do Cristo ressurreto, demonstrada pelo poder do Espírito que agia na igreja, agora, por seu turno, mediante o cuidado mútuo.
A pregação do evangelho certamente é o pilar central de sustentação de uma igreja, sem a qual, todo o edifício eclesiástico é construído como que sobre areia. Todavia, esse pilar é composto pela comunhão verdadeira vivida pela comunidade, que é efeito do testemunho apostólico radicado em seu meio e publicado ao mundo. Se há reservas entre nós no que tange à comunhão, há um grave defeito em nosso conceito de igreja, e consequentemente, falhamos em testificar de Cristo aos perdidos.
Se não há comunhão legitima entre nós, como o mundo crerá que de fato há comunhão entre nós e Cristo? A comunhão operada por Deus no meio do seu povo, consiste numa real entrega de si mesmo à igreja. No passado, essa entrega era externada a partir da partilha de bens; as pessoas doavam o que queriam e podiam, entendendo que não poderiam permitir que seus irmãos passassem por quaisquer necessidades. Em nosso tempo, talvez não se faça necessário — embora devamos estar prontos, caso sim — a doação de bens ou valores, mas o imperativo e princípio de “um só coração e alma” vigora sem alterações.
É através da comunhão que experimentamos e vivemos aqui dentro, que o Espírito nos faz capaz de publicar o evangelho lá fora.
Conclusão
O texto de Atos 4.32-35 fornece uma das mais gloriosas definições de igreja de todo o Novo Testamento: “era um o coração e alma” (v.32).
O Espírito Santo têm agido no meio de cada comunidade de discípulos de Cristo, fazendo-os conformarem-se ao princípio da comunhão, para que, vivendo como um, unam-se a todos quantos, no passado, no presente e no futuro, manifestam o testemunho da glória de Cristo até os confins da terra.
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