Êxodo 8.1-15
Série expositiva no Livro do Êxodo • Sermon • Submitted • Presented
0 ratings
· 4 viewsO autor divino/humano enfatiza a paciência e soberania do SENHOR, como atributos que revelam sua soberania e superioridade sobre tudo e todos.
Notes
Transcript
"São estes os nomes..." (Êx 1.1).
Pr. Paulo U. Rodrigues
Introdução
Ao ter iniciado o registro narrativo da execução do julgamento do SENHOR contra Faraó e o Egito por sua opressão contra os filhos de Israel, como exposto na seção anterior (cf. 7.14-25), Moisés avança em seu relato descrevendo os fatos relacionados à execução da segunda praga.
Porém, em que pese a intenção do autor de retratar os atos portentosos do Deus de Israel na redenção de seu povo da escravidão, cada novo episódio acumula informações que proporciona todos os dados necessários para que os hebreus compreendam o enredo do que aconteceu ao terem saído da terra do Egito, de acordo com a perspectiva divina: os atos redentivos do SENHOR culminam com a proclamação do nome de YHWH como único soberano sobre toda a terra, como analisado anteriormente.
Cada sinal executado toca esse ponto a partir de um viés peculiar; desta feita, a humilhação e reconhecimento (ainda que momentâneo) de Faraó, exibe a volatilidade do coração do monarca que, sob a mão divina, é dobrado a fim de que nele seja exibido um traço mais específico do caráter do SENHOR. A mão poderosa de YHWH estendeu-se mais uma vez para ferir o Egito; contudo, o remorso do Faraó é respondido com clemência, evidenciando o coração nefasto do rei egípcio, que, ao ver alívio, torna a endurecer seu coração (v.15), ao passo que a magnanimidade e longanimidade do SENHOR, que ainda assim, fez cessar a praga, são destacadas na narrativa como exemplos claros da superioridade de Deus sobre o Faraó.
Além de sua soberania, justiça e glória, o SENHOR declara sua paciência e misericórdia, mesmo em favor de alguém cujo coração está completamente afastado de uma revelação redentiva que o conduza ao verdadeiro arrependimento por agir recalcitrantemente.
Isto posto, o texto de Êxodo 8.1-15 sintetiza como tese central a declaração da soberania do SENHOR na Redenção do seu povo: a segunda praga - YHWH, o Deus longânimo.
Elucidação
Ao observar-se o período pelo qual vigorou a primeira praga (i.e. "sete dias" (cf. 7.25)) e estruturação sequencial que inicia o capítulo 8 (i.e. "וַיֹּ֣אמֶר" = waw conj. + partícula int. ao discurso direto), levando em consideração a paragrafação (conforme a BHS) que divide a narrativa a partir do versículo 25 do capítulo 7, constata-se a intenção de Moisés em fazer com que as pragas sejam percebidas a partir de um fluxo contínuo. O braço do SENHOR avançará executando, momento após momento, milagres que revelam seu poder sobre o Egito e seu rei.
Assim, subtende-se que não muito tempo depois de o SENHOR ter ferido o Nilo, proclamando seu senhorio sobre a vida, o Todo-poderoso agiu novamente, trazendo juízo sobre os opressores de seu povo. Os versículos 1 e 2 do capítulo 8 iniciam-se com a emissão de outra ordem da parte do Deus dos hebreus à Moisés:
Depois, disse o Senhor a Moisés: Chega-te a Faraó e dize-lhe: Assim diz o Senhor: Deixa ir o meu povo, para que me sirva. Se recusares deixá-lo ir, eis que castigarei com rãs todos os teus territórios.
O motivo central da exigência divina continua sendo o cumprimento da aliança estabelecida por Deus com os antepassados de Israel (i.e. Abraão, Isaque e Jacó). "Deixe ir o meu povo para que me sirva" é a sintetização da promessa de relacionamento direto entre Deus e os hebreus (como analisado anteriormente), e Faraó novamente interpõe-se como obstáculo na concretização desse propósito. Por essa razão, outra manifestação do poder divino será executada, a fim de que Faraó saiba quem é o SENHOR; aquele cuja mão não pode ser resistida.
Os versos 2 à 5 enfatizam a promessa de execução de um novo sinal: diante da dureza do coração do monarca, que persiste em negar a libertação dos hebreus, o SENHOR anuncia uma nova praga contra o Egito: "Castigarei com rãs todos os teus territórios" (v.2).
Nesse ponto, há dúvidas quanto a peculiaridade dessa praga em específico. Uma das divindades egípcias, Hequete, responsável pela fertilidade, era representada na forma de uma rã. Todavia, levando em consideração o argumento anterior, de que as pragas não estão voltadas diretamente contra as divindades egípcias, mas contra o Faraó especificamente, é mais certo crer que através do uso do presente flagelo, o SENHOR deseja trazer o caos sobre toda a terra do Egito, e por sua vez, sobre seu rei. A multiplicação exacerbada de rãs por toda extensão do Egito, nas casas, no palácio, nas vias, para além da margem do rio vs.3-6), deveriam fazer com que o rei egípcio se visse sem qualquer controle sobre seu próprio reino.
E assim ocorre. Tendo novamente o bordão de Deus sido erguido, Arão evoca rãs que ocupam todo o território egípcio, de maneira a trazer desordem à todos, como assimila o verso 6: Arão estendeu a mão sobre as águas do Egito, e subiram rãs e cobriram a terra do Egito".
Nesse ponto, embora os magos de Faraó tenham novamente reproduzido o mesmo feito (v.7), o autor registra a peculiaridade que circunda este segundo portento do SENHOR: diferentemente do que ocorreu quando as águas do Nilo tornaram-se em sangue, Faraó volta-se à Moisés e Arão, pedindo que ambos "roga[ssem] ao SENHOR que tire as rãs de mim e do meu povo; então, deixarei ir o povo, para que ofereça sacrifícios ao SENHOR" (v.8).
O aparente amolecimento do monarca egípcio ocorre inusitadamente. Faraó parece ter compreendido que o SENHOR era o único soberano sobre toda a terra, e diante do sofrimento e desordem de seu reino, solicita que Moisés interceda por ele junto a Deus para que a praga cessasse.
De pronto, o profeta atende ao pedido do rei (v. 11), e acrescenta que o atendimento daquela solicitação, por si, também era outro demonstrativo de que o SENHOR era verdadeiramente o único que detinha o controle absoluto sobre tudo e todos, e com isso, o ponto central da passagem é clarificado.
A interrupção do flagelo sobre o Egito, segundo Moisés, ratificaria a compreensão de que "ninguém há como o SENHOR, nosso Deus" (v.10). Noutras palavras, nesse caso em específico, a declaração da soberania do SENHOR não estaria ligada somente a execução o portento, mas o domínio divino seria evidenciado quando Deus dissipasse o caos que acometeu o Egito. Os versículos 13 e 14, registram a ação reversiva do SENHOR:
E o Senhor fez conforme a palavra de Moisés; morreram as rãs nas casas, nos pátios e nos campos. Ajuntaram-nas em montões e montões, e a terra cheirou mal.
Nesse ínterim, uma reviravolta (do ponto de vista narrativo) é descrita:: "Vendo, porém, Faraó que havia alívio, continuou endurecido e não os ouviu, como o SENHOR tinha dito" (v.14). O monarca egípcio, em sua campanha rebelde e arrogante, torna atrás de sua decisão e não permite a saída dos filhos de Israel. Contudo, antes de isso representar alguma novidade, é na verdade a concretização da palavra que o SENHOR proferira a Moisés. Na presente seção não há menções há um endurecimento prévio do coração do Faraó, o que remete os leitores/ouvintes aos momentos passados em que Deus predissera que faria isso ao mandatário, como é mencionado momentos antes de Moisés iniciar a execução da primeira praga (cf. 7.3).
Faraó ter manifestado um ânimo dobre, isto é, não ter mantido sua palavra, é mais um símbolo da própria incapacidade de controlar o que quer que seja naquela situação, o que inclui seu próprio coração. Tendo sido oprimido pela mão do SENHOR, a ação do rei foi buscar alívio para si e para os egípcios; porém, diante da declaração do domínio irrestrito de YHWH na remoção da praga de sobre seu território, a reação do mandatário foi de dureza e rebeldia, o que ressaltou a realidade de que YHWH era superior, a partir da publicação de seu caráter longânimo e paciente.
O autor encerra o bloco textual com a menção ao já conhecido fato de que o rei manteve seu coração impenitente, o que significa que, pelo menos naquele momento, Deus manteve sua palavra e as rãs não mais assolaram o Egito. A paciência divina clarifica a condição do SENHOR como superior sobre Faraó, ao controlar a si mesmo diante da afronta sofrida, ao passo que o pobre rei não pôde fazê-o, numa que seu coração não estava sob seu domínio, mas permanecia nas mãos de YHWH.
Transição
O relato, conforme estruturado por Moisés, deveria ecoar na mente do povo de Israel essa compreensão: o SENHOR a quem serviam era superior a tudo e todos, também por ter ele domínio inclusive sobre si mesmo, não respondendo de maneira instintiva ou desmedida à afrontas. A paciência e longanimidade de YHWH eram atributos que, além de revelar seu caráter misericordioso, apontavam para sua nobreza e austeridade. Os homens não podem conter-se ou dominar-se, sendo escravizados devido a natureza corrupta que possuem; Deus, por outro lado, por ninguém ou nada é dominado, mas controla todas as coisas para promoção da glória do seu excelso nome.
A contemplação da magnanimidade divina, guia os olhares do povo de Deus à glória do SENHOR: a força de YHWH mostra-se em ter ele domínio sobre si mesmo, e se domina a si, domina a tudo, incluindo o coração dos homens perversos que oprimem seu povo, mal sabendo que são instrumentos de um plano maior, que e inexoravelmente resultará no enaltecimento do Senhor daqueles que tanto perseguem.
Em face disso, o texto de Êxodo 8.1-15, salienta algumas verdades a serem compreendidas pelo povo de Deus hoje:
Aplicações
1. A paciência e longanimidade do SENHOR, declaram quão poderoso e soberano ele é.
Ao refletirmos sobre tais atributos, geralmente os conectamos ao caráter benigno de Deus, isto é, seu amor, graça, bondade e etc; mesmo aplicado aos ímpios, a partir da conceituação produzida por muitos teólogos que, nesse caso, usam os termos “graça comum” ou “misericórdia” (este último levando em consideração o fato de que graça seria o amor especial direcionado aos eleitos redimidos).
Ainda que esse raciocínio seja verdadeiro, os atributos da longanimidade e paciência divina destacam, sobretudo, quão poderoso é o SENHOR, nosso Deus. Como o presente texto bíblico enfatiza, a grandeza do SENHOR mostra-se em ele não responder de maneira imediata a afronta e teimosia do Faraó, ao ter voltado atrás em sua palavra, tendo dito que libertaria os hebreus se Deus fizesse cessar a praga.
Stephen Charnock, puritano do século XVII, ao explicar a dinâmica da exaltação do SENHOR como soberano, por meio do exercício de sua paciência afirma:
"Os homens que são grandes no mundo sofrem rápido impulso da paixão, e não se dispõem a perdoar logo, ou a tolerar um ofensor, como alguém de nível inferior. É a falta de poder sobre o próprio ego que os leva a fazer coisas impróprias sob provocação. Um príncipe capaz de sujeitar as suas paixões é um rei sobre si mesmo, bem como sobre os seus súditos. Deus é tardio em irar-Se porque é grande em força. Ele não tem menos poder sobre Si mesmo do que sobre as Suas criaturas" (PINK (1886-1952), 2012, p.97).
A segunda praga demonstrou a Israel, ao Egito (embora naquele momento Faraó não tivesse chegado a essa compreensão, por causa do endurecimento de seu coração) e à toda terra, que Deus é paciente e tardio em irar-se, mas isso somente revela quão digno de glória e ele é (cf. Na 1.3). Seu povo deve, portanto, ao contemplar a parcimônia divina em julgar definitivamente esse mundo, compreender que isso assegura pouco a pouco a publicação da superioridade do SENHOR sobre todos aqueles que, achando-se poderosos, não podem conter a si mesmos, agindo tolamente em sua rebelião contra o SENHOR.
O que nos leva ao nosso segundo ponto.
2. A paciência e longanimidade do SENHOR revelam quão rebelde e fraco é o coração humano.
Ainda levando em consideração o que enfatiza o profeta Naum, a paciência do SENHOR não inocenta o culpado. O fato de Deus estar usando, por hora, de paciência com o ímpio, não o isenta de ser visto como cruel, com o agravante de fazer pouco caso de que, estando sob sentenciamento, age de maneira néscia, fazendo-se ainda mais culpado ao insistir em sua campanha rebelde contra o SENHOR.
Ao passo que a igreja percebe, dia após dia, que o julgamento divino está em plena execução, os ímpios, com seus corações endurecidos, continuam promovendo a pecaminosidade como expressão de sua condição de antagonia contra o Reino de Deus.
A pecaminosidade no coração daqueles que não foram despertos para a compreensão da soberania do SENHOR, provoca em seus corações o sentimento de impunidade; os ímpios pensam que poderão continuar pecando desenfreadamente, sem serem nunca contidos por algo maior do que eles, e isso significa que o endurecimento de seus corações carrega em si um toque de arrogância e orgulho, tal como o rei do Egito, que via-se como detentor de grande poder. Porém, da mesma forma que paulatinamente ocorreu com ele, os ímpios estão sendo lembrados, pela paciência do SENHOR, de que há um governo absoluto no universo.
Alguém, há muito tempo, tratando da longanimidade divina para com os ímpios, afirmou: “a moenda do SENHOR moi devagar, porém moi fino”. O que o ímpio está assistindo não é a vagarosidade do Deus da igreja em não responder à altura seus pecados, mas a preparação do Justo Juiz, que dia após dia encurrala pecadores contra a parede, tornando estes incapazes de defender-se, pois tolerou seus pecados por tanto tempo apenas para demonstrar de seu auto-domínio, mas também quão mal e corrupto é o coração dos que se valem de sua longanimidade para pecar ainda mais.
Conclusão
O SENHOR assegura a publicação de sua soberania não apenas por meio do julgamento imediato contra o pecado, mas também por meio de seu auto-domínio e paciência, tolerando que pecadores vivam em rebeldia contra si, a fim de torná-los cada vez mais culpados de seus crimes.