Êxodo 9.13-35
Série expositiva no Livro do Êxodo • Sermon • Submitted • Presented
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· 2 viewsO autor divino/humano demonstra a distinção salvadora causada pelo temor do SENHOR mediante a guarda de sua Palavra que separa ímpios de salvos.
Notes
Transcript
"São estes os nomes..." (Êx 1.1).
Pr. Paulo U. Rodrigues
Introdução
Avançando na narrativa da primeira parte do texto de Êxodo, onde o relato da ação soberana do SENHOR em redimir seu povo é descrita, Moisés registra a execução da sétima praga: a chuva de pedras.
Como tem sido estabelecido ao longo das ocorrências anteriores, o anúncio de um novo portento da parte de Deus é anexado à proclamação de sua ordem para que Faraó liberte Israel da escravidão, e novamente, a publicação da vontade divina é estendida e desenvolvida a fim de que aqueles aspectos idiossincráticos de cada ação miraculosa do SENHOR sejam compreendidos.
Na ocasião, outro fator distintivo é apresentado pelo autor, como sendo a vontade de Deus no cumprimento de seu planos redentivos. Todavia, um caráter mais amplo é referido; isto é, antes, a separação feita por Deus teve como fundamento a divisão entre hebreus e egípcios (cf. 8.19; 9.4); agora, o ponto nevrálgico dessa diferenciação gira em torno do temor ao SENHOR, manifesto mediante consideração à sua palavra transmitida por Moisés.
Ligado a isso, novamente ocorre a repetição do objetivo divino em realizar todas aquelas maravilhas: "para isso te hei mantido (i.e. Faraó), afim de mostrar-te o meu poder, e para que seja o meu nome seja anunciado em toda a terra" (v.16). Esse conhecimento amplo do nome de Deus, é usado noutras narrativas como instrumento do processo de salvação, como é o caso de Raabe, no livro de Josué, que ao ouvir a fama do Deus de Israel, teme, sendo então salva da destruição de Jericó (cf. Js 2.8-10; 6.22-27).
Como registrado na passagem, alguns oficiais de Faraó, "que temia[m] a palavra do SENHOR" (v.20), atenderam ao que disse Moisés, e resguardaram-se de serem vitimados pela praga. Outros, que "não se importavam com a palavra do SENHOR", agindo temerariamente, foram destruídos (v.25). Isto posto, a tônica do autor consiste na observação da relação do temor ao SENHOR e à sua palavra, como razão última da diferenciação executada por ocasião do derramamento do juízo divino: a palavra de Deus é o instrumento por meio do qual a salvação é anunciada aos homens, mediante o conhecimento que recebem dele como único SENHOR.
Em síntese, a passagem de Êxodo 9.13-35, estabelece como tese central a declaração da soberania do SENHOR na Redenção do seu povo: a sétima praga - YHWH, o Deus da palavra.
Elucidação
A narrativa da presente seção segue o padrão da execução divina de seus portentos, tal como registrado até este ponto. Todavia, um dos acréscimos característicos que peculiarizam o trecho, é a menção divina da intensificação dos flagelos que sofrerá Faraó e todo o Egito.
A recalcitrância do monarca em libertar o povo de Deus do Egito e da condição de escravos, o conduziu pela via advertida por Deus a Moisés: Faraó somente deixaria ir o povo, se fosse obrigado por mão forte (cf. 3.19-20), e a cada novo episódio catastrófico, tanto Deus pesa a mão sobre a nação inimiga quanto enrijece o coração do mandatário, fazendo-o um instrumento no seu plano de auto-glorificação, como é referido a partir do versículo 14:
Pois esta vez enviarei todas as minhas pragas sobre o teu coração, e sobre os teus oficiais, e sobre o teu povo, para que saibas que não há quem me seja semelhante em toda a terra. Pois já eu poderia ter estendido a mão para te ferir a ti e o teu povo com pestilência, e terias sido cortado da terra; mas, deveras, para isso te hei mantido, a fim de mostrar-te o meu poder, e para que seja o meu nome anunciado em toda a terra.
Como dito, a afirmação de que desta vez Deus enviaria "todas as [suas] pragas" indica que o próximo grupo de flagelos deverá ser mais destrutivo e veemente do que os anteriores. A progressão da intensidade das pragas está ligada a pecaminosidade do Faraó em sua rebeldia, como ressaltado, mas também à própria intenção divina de, por meio disso, fazer seu nome conhecido, e esta possui um desdobramento mais amplo.
O modus operandi escolhido pelo SENHOR para que seu nome se tornasse célebre em toda terra, foi o estabelecimento e cumprimento da promessa abraâmica que registra a salvação da descendência do patriarca da situação de escravidão a qual seria submetida, até que a medida da iniquidade dos povos residentes na terra de Canaã fosse atingida (Gn 15.13-14). O julgamento divino de ímpios atrelado à uma ação salvadora, formava o conceito básico que explicava o que estava acontecendo no Egito por ocasião das pragas e flagelos mandados por Deus.
Assim, o teor judicial-salvífico das pragas (principalmente da que está sob análise) centraliza este último aspecto da ação divina, mediante a publicação da fama do SENHOR. Essa perspectiva aparece na presente narrativa, logo após o SENHOR mencionar qual seria o próximo sofrimento que Faraó e os egípcios deveriam experimentar, como consta a partir do versículo 17: Deus faria chover pedras sobre o Egito; pedras que estariam envoltas em chamas. Tal sinal devastaria por completo as vegetações do campo, e até mesmo os homens que lá estivessem (v.19). A soberania do SENHOR manifestar-se-ia do céu contra os egípcios.
Nada obstante, o autor, em sua descrição do ocorrido, adentra mais detalhadamente o relato, tecendo um comentário que elucida o aspecto exortativo da passagem. Nos versículos 20-21, Moisés alude que:
Êxodo 9.20–21
Quem dos oficiais de Faraó temia (ou literalmente tinham temor da palavra (hb. "הַיָּרֵא֙ אֶת־דְּבַ֣ר")) a palavra do Senhor fez fugir os seus servos e o seu gado para as casas; aquele, porém, que não se importava com a palavra do Senhor (ou, literalmente, “não colocou no coração” (hb. "לֹא־שָׂ֛ם לִבֹּ֖ו")) deixou ficar no campo os seus servos e o seu gado.
A menção do profeta ao sentimento de alguns dos oficiais de Faraó, especifica o caráter teleológico da seção. A atenção de alguns oficiais de Faraó ao que o SENHOR havia dito, demarca uma mudança de postura em pelo menos alguns dos egípcios, e é exatamente essa alteração de perspectiva que enfatiza o aspecto distintivo-redentivo mencionado previamente. Ao atentarem à palavra do SENHOR, aqueles homens estavam sendo expostos ao conhecimento de Deus, porém, de um modo diferente daquele que Faraó estava recebendo. A palavra do SENHOR, penetrada no coração de alguns dos oficiais do rei, os colocou numa situação semelhante ou até igual a dos hebreus na terra de Gósen (v.26): em chovendo fogo e pedras do céu, foram salvos do juízo divino.
O temor do SENHOR e à sua palavra tematiza a tese da intenção de Moisés na redação do texto. Os filhos de Israel, ao recordarem-se do ocorrido, deveriam interpretar aqueles fatos de acordo com a ótica que lhes está sendo comunicada mediante o presente relato. Deus, desde o início de suas ações de julgamento, teve como alvo apenas os egípcios, pesando fortemente sua mão contra eles de maneira exclusiva, como é o que narra a descrição das pragas dos enxames de moscas (cf. 8.20-32) e da peste nos animais (cf. 9.1-7). Agora, entretanto, apresentando novamente o objetivo de ter seu nome anunciado sobre toda a terra, o autor clarifica que um dos efeitos da glória do SENHOR ser publicada, é o enxerto de sua palavra no coração de alguns que, temendo a ele e colocando em seus corações o que ele diz, são salvos da ira.
Nada obstante, o autor retorna atenção ao Faraó, a fim de demonstrar sua postura diante da nova praga. Assim como ocorrido por ocasião do flagelo das rãs que invadiram o Egito (cf. 8.8-15), inicialmente, vendo a devastação causada pelo braço do SENHOR, Faraó retroage em sua rebeldia, e roga a Moisés que YHWH retire sua mão de sobre ele e seu povo, com um acréscimo: o rei do Egito, aparentemente, reconhece-se como ímpio:
Então, Faraó mandou chamar a Moisés e a Arão e lhes disse: Esta vez pequei; o Senhor é justo, porém eu e o meu povo somos ímpios. Orai ao Senhor; pois já bastam estes grandes trovões e a chuva de pedras. Eu vos deixarei ir, e não ficareis mais aqui.
Porém, após as reiteradas advertências que emitiu e ciente da ação do SENHOR no coração do monarca, Moisés alude que, embora vá rogar que Deus cesse o flagelo, ele sabe que “Faraó e [seus] oficiais (…) ainda não teme[m] ao SENHOR Deus” (v.30). Neste ponto, o reconhecimento de Moisés da dureza do coração do rei, salienta a tese exposta anteriormente: o temor do SENHOR que alguns dos servos de Faraó colocaram no coração mediante atenção à palavra divina, os excluiu de serem destruídos pela chuva de pedras, ou seja, o conhecimento divino referido pela palavra do SENHOR crida por aqueles homens, os fez serem distinguidos, tal como os próprios hebreus, dos que, como Faraó, não tomaram conhecimento de Deus como único soberano, logo, não sendo poupados do furor do Deus de Israel. E de fato, como registra o texto:
Tendo visto Faraó que cessaram as chuvas, as pedras e os trovões, tornou a pecar e endureceu o coração, ele e os seus oficiais. E assim Faraó, de coração endurecido, não deixou ir os filhos de Israel, como o Senhor tinha dito a Moisés.
O registro da postura contumaz de alguns dos oficiais de Faraó ligada à dele mesmo, isto é, de terem endurecido o coração, confirma a tônica distintiva da presente seção: o temor do SENHOR demonstrado pela guarda de sua palavra, é o instrumento que encaminha os homens à recepção da revelação da glória de Deus, e o efeito disso é a salvação da ira divina.
Transição
O princípio salvífico anexo à publicação da glória do SENHOR sobre toda terra, provocando temor no coração dos homens que, atendendo à sua palavra, recebem tal dádiva, é centralizado pelo autor no presente texto, servindo também como princípio exortativo ao povo de Deus.
Que o SENHOR estava glorificando seu nome sobre Faraó e o Egito, não restam dúvidas. Porém, os desdobramentos da fruição desse propósito, pouco a pouco expõem a grandeza e complexidade do intento divino.
A união deses dois temas; quais sejam, a glória de Deus difundida sobre toda a terra, ligado a proclamação da palavra como instrumento salvífico, nos conduzem à observação daquele que anexa em si ambos os princípios: Cristo Jesus; a palavra de Deus (Jo 1.1). o Verbo Encarnado encena toda a narrativa exposta pelo texto de Êxodo 9.13-35, pois ele é aquele que revela a glória e a majestade de Deus, e por meio do quem os homens são salvos da ignorância de seus corações.
A Palavra Divina, Cristo, conduz os homens ao temor do SENHOR e ao conhecimento dele e do plano redentivo que executa, e mediante sua obra, livrando-s da punição que recai sobre aqueles que, à revelia da misericórdia divina em os avisar da iminência do pesar de seu braço (cf. v.19), ignoram o Senhor Jesus à moda dos oficiais que não se importaram com a palavra divina pronunciada por Moisés e, não temendo a Deus, porém agindo dolosa e impiamente, atraem sobre si todo furor do Altíssimo.
Em face desses princípios, o texto de Êxodo 9.13-35, salienta duas verdades a serem compreendidas pelo povo de Deus hoje:
Aplicações
1. Cristo Jesus é a Palavra salvadora de YHWH; aquele que publica sua glória e traz os homens à salvação do juízo vindouro.
Como registrado em João 1.1, Cristo Jesus é a Encarnação da Palavra de Deus, e portanto, toda a obra da salvação está circunscrita ao reconhecimento da glória de Deus (objetivo de todo o plano redentivo) mediante a compreensão de que ele é o meio através do qual os homens são salvos.
Assim como no passado a palavra referida por Deus através de Moisés foi o divisor de águas entre salvos e condenados, da mesma forma hoje, Cristo é o fator distintivo entre os que são salvos dos que se perdem; isto é, é a partir da apreensão dos homens quanto à realidade gloriosa de que somente podem ser livrados da condenação eterna mediante a fé no Senhor Jesus Cristo, guardando-o em seu coração como seu Salvador, que o homem alcança tamanha graça.
A vontade divina é que seu nome seja anunciado sobre toda a terra, e é em Cristo que esse propósito é fruído em sua totalidade, pois pelo poder do Espírito Santo, o anúncio da redenção é mais poderosamente direcionado à todos os homens, o que por outro lado, intensifica a demarcação referida pelo texto entre rebeldes e crentes.
Se por ocasião do anúncio da palavra divina através de Moisés a linha entre tementes a Deus e resistentes a ele era saliente, muito mais em Cristo (a manifestação da palavra de YHWH) a separação entre um e outro grupo ficará evidente. O que nos leva ao segundo ponto.
2. O temor do SENHOR, mediante a guarda de sua palavra, é o fator que distingue os que são salvos dos que se perdem.
Até este ponto da narrativa, o SENHOR, segundo já esclarecido, traçou uma espessa linha divisória entre hebreus e egípcios, preservando os primeiros da ira derramada sobre os últimos. Todavia, o caráter salvífico de sua obra redentiva é agora expandido na narrativa do presente texto, incluindo pessoas dentre a própria nação egípcia, para serem alvos de seu favor, apontando para o aspecto amplo da obra da salvação; isto é, que a graça redentiva sempre foi manifesta e irradiada para além das fronteiras étnicas de Israel.
O símbolo ou referência chave dessa alternância, é a centralidade do princípio do Temor do SENHOR anexado à alta consideração que se deve ter por sua palavra. O Deus dos hebreus havia dito que faria milagres e maravilhas através dos quais libertaria seu povo da escravidão no Egito. Crer nisso, era não somente uma demonstração de sensatez — tendo em vista que todas as promessas de execução de pragas foram cumpridas — mas também de uma aproximação do conhecimento redentivo do SENHOR mediante o reconhecimento de sua glória, e tal compreensão foi e continua sendo um demonstrativo de distinção entre os que são preservados dos que são julgados.
É o sentimento que se tem quanto à palavra do SENHOR que separa salvos de ímpios. Mesmo tendo sido misericordiosamente advertido, Faraó deu às costas à palavra do SENHOR, e mesmo quando viu a devastação que assolou seu reino, e aparentemente reconheceu sua impiedade, tornou atrás e manteve a palavra divina distante de seu coração.
O mesmo quadro ocorre hoje. Apesar de Deus ser um justo juiz, que com rigor, executa sua sentença contra aqueles que, de maneira contumaz, resistem vê-lo como único Soberano (tese da seção anterior (cf. 9.8-12)), ele constantemente adverte o mundo da iminência de seu implacável juízo, a partir das palavras deixadas pelo seu grande profeta, Cristo Jesus, ecoadas por sua igreja. Entretanto, os homens fazem o mesmo que muitos dos oficiais de Faraó: não se importam com a palavra do SENHOR, até o dia em que cairá fogo e pedras do céu, consumindo a todos eles.
Nada obstante, embora o texto fale da postura ímpia dos que se rebelam contra Deus e sua palavra, a advertência também é direcionada à igreja de Cristo: o temor do SENHOR deve nos fazer colocar sua palavra no coração, como diz o próprio salmista: “guardo no coração as tuas palavras, para não pecar contra ti (Sl 119.11)”. O temor do SENHOR só é verdadeiro, quando parte de dentro de um coração verdadeiramente convencido pela palavra, de que o SENHOR é o rei da glória, a quem é devida a obediência e serviço sinceros, e essa perspectiva nos leva ao terceiro ponto.
3. O temor do SENHOR, a partir da guarda de sua palavra, é evidenciado na prática, através da obediência e da vivência de acordo com aquilo que nos revelou o SENHOR como sua vontade.
Olhando para o princípio apresentado no texto, é inevitável que vejamos que o temor do SENHOR só pode ser verdadeiro quanto flui de um sincero apego à sua palavra; coisa que infelizmente tem se tornado cada vez mais rara em nosso tempo.
Desde o tempo que é gasto por nós na leitura das Escrituras, até a seriedade que damos à pregação da palavra, é nítido que muitos de nós brincamos com fogo, ao termos um conceito tão baixo e pobre da palavra do SENHOR.
Domingo após domingo somos expostos ao conhecimento da glória de Deus a partir de sua palavra, e ao findar do culto, saímos da igreja sem nem nos lembrar do texto que foi exposto. Ler a Bíblia é algo tão raro, que nossa familiaridade com o Texto Sagrado é vergonhosa, e isso impacta diretamente na nossa vida diante do SENHOR e do mundo, ao qual comunicamos (às vezes sem palavras) a existência de um único Deus Soberano.
O exemplo bíblico é nítido: aqueles que temiam (colocaram no coração) a palavra do SENHOR, agiram de conformidade com a mesma: recolheram seu gado e seus servos do campo, sendo salvos. Por outro lado, os que não tinham a palavra de Deus em alta conta, ao invés de (como poderia ser esperado) manifestarem sua oposição contra YHWH, agiram da forma como nós muitas vezes agimos: sendo indiferentes. O quadro da igreja hoje explicita que nos parecemos mais com os oficiais ímpios, do que com aqueles que foram sábios em guardar a palavra de Deus no coração.
Se tememos ao SENHOR verdadeiramente, esse temor precisa redundar num apego constante e profundo à palavra de Deus. Quanto mais vemos o SENHOR derramar sua ira sobre o mundo, mais precisamos compreender que ele tem um alto compromisso com o que fala. Deus nunca fala nada sem que essa palavra não seja relevante e útil, e assim, todo o conselho de Deus diante de nós deve ser diligentemente guardado no fundo de nosso coração, para que possamos genuinamente temê-lo, expondo nossa condição de servos do Deus Altíssimo, e agraciados com o conhecimento salvífico de sua glória.
Conclusão
O Deus da glória emite sua palavra a fim de que, por meio da guarda desta, alcancemos um coração que o teme verdadeiramente, sendo então salvos por ele da ira que cai e cairá sobre este mundo rebelde.
Cristo Jesus é esta palavra que salva; aquele ao qual nosso coração foi exposto, pelo poder do Espírito Santo, que por seu turno, irrompeu em nós o temor a Deus mediante a contemplação de sua glória nele.