Êxodo 17.1-7

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O autor divino/humano demonstra a provisão substitutiva de Deus no derramamento de seu juízo sobre Aquele (Cristo) que foi provido no lugar do povo pecador, recebendo este vida no lugar de morte.

Notes
Transcript
"São estes os nomes..." (Êx 1.1).
Pr. Paulo U. Rodrigues
Introdução
De acordo com o que fora analisado na seção anterior, o início da segunda seção do texto do Êxodo, na qual Moisés trata da Lei como expressão do relacionamento de YHWH com o povo de Israel, destina-se a estabelecer alguns princípios que proporcionam uma compreensão mais aprofundada e detalhada quanto ao que realmente representa a Lei do SENHOR que será promulgada mais adiante (e.g. Êx 20).
A presente narrativa abrange dois episódios nos quais a misericórdia divina são novamente demonstradas em favor dos filhos de Israel; cada um enfatizando aspectos específicos dessa graça. No primeiro caso (vv.1-7), novamente a provisão divina se mostra condescendente e, ao invés de o SENHOR ter ferido o povo em vista do pecado deste, faz com que sua sede seja saciada mediante o ferimento da Rocha (v.6). No segundo episódio (vv. 8-16), a mão de YHWH, representada pelos braços de Moisés, concede ao povo vitória num contexto adverso, e assim o SENHOR mostra-se como sendo a bandeira de Israel (cf. 15).
Analisando pormenorizadamente a primeira narrativa (vv. 1-7), a intenção de Moisés gira em torno da compreensão de que apesar dos tantos pecados do povo (da dureza de seus corações), o SENHOR não os trata como merecem, mas provê que seu juízo seja direcionado à um substituto, por meio do qual, ao invés de receberem morte, são agraciados com vida.
Próximo de receberem a Lei, os israelitas são novamente lembrados de que apesar da vileza de suas trangressões, Deus é longânime, e desvia de sobre eles a execução de seu juízo.
O texto de Êxodo 17.1-7 centraliza como ideia central a longanimidade de YHWH: a provisão da vida como resposta ao pecado.
Elucidação
Novamente, o curso peregrino dos filhos de Israel é mencionado, demarcando o movimento que aproxima a narrativa do ponto central desta segunda seção, como já comentado: a promulgação da Lei. O povo, "tendo partido (...) do deserto de Sim, fazendo suas paradas, segundo o mandamento do SENHOR, acamparam-se em Refidim" (v.1). Ao chegarem a esse ponto, novamente um contexto de adversidade e necessidade suscita murmuração da parte do hebreus contra YHWH, sendo desta vez expressa como uma contenda (hb. "וַיָּ֤רֶב"), isto é, segundo o modo como retrata o autor, há uma intensificação do pecado do povo, principalmente ao ser comparado o presente episódio ao anterior.
O questionamento do profeta em relação as queixas do povo (cf. v.2), semelhantemente ao que fez em 16.8, visa advertir os filhos de Israel de que novamente estavam se colocando contra o SENHOR, principalmente pela repetição do argumento que é usado: "Por que nos fizeste subir do Egito, para nos matares de sede, a nós, a nossos filhos e aos nossos rebanhos?" (cf. v.3 - 16.3). A centralização do questionamento dos hebreus usando novamente sua situação de escravidão no Egito — inclusive fazendo parecer que estavam em melhores condições lá do que agora no deserto —, exibe alguma incompreensão do povo quanto a ação redentora realizada por Deus naquela ocasião.
A retirada dos hebreus do Egito demarca o cumprimento da aliança abraâmica, que garantiu um povo como descendência do patriarca; um povo separado ao próprio Deus. Se YHWH realizou aqueles atos poderosos, a fim de executar a redenção, o suprimento do mesmo durante sua peregrinação até a terra prometida (algo que também fazia parte do pacto patriarcal) deveria ser crido por eles. Nada obstante, o povo volta-se contra Deus, se permitindo duvidar da efetividade do plano redentor do SENHOR a seu favor.
A contenda dos filhos de Israel não era apenas a expressão de uma necessidade, mas de sua fragilidade em crer no cuidado paternal divino, e sobretudo, na mão salvadora do SENHOR. Todavia, a resposta divina a essa iniciativas pecaminosas é centralizada pelo autor, como expansão do princípio anteriormente elucidado.
No capítulo 16, também num contexto de pecado e determinação de ordenanças, YHWH mostrou como sua Lei, apesar de revelar a incapacidade do povo em cumprir seus mandamentos, aponta concomitantemente para seu suprimento gracioso, provendo o meio através do qual a fraqueza do povo seria fortalecida mediante o maná (i.e. o Pão do Céu (rf. a Cristo, cf. Jo 6.35, 51)). Na presente seção, essa mesma ênfase bondosa do SENHOR é aprofundada, agora mediante o desvio do julgamento merecido pelos pecados do povo. Ouvindo as queixas e contendas do povo, o SENHOR ordena a Moisés:
Êxodo 17.5–6 ARA
Respondeu o Senhor a Moisés: Passa adiante do povo e toma contigo alguns dos anciãos de Israel, leva contigo em mão o bordão com que feriste o rio e vai. Eis que estarei ali diante de ti sobre a rocha em Horebe; ferirás a rocha, e dela sairá água, e o povo beberá. Moisés assim o fez na presença dos anciãos de Israel.
O ferimento na rocha da qual sairia água para saciar os filhos de Israel, lhes serviria como demonstrativo: Deus, ao invés de fazer com que seu juízo caísse sobre o povo impenitente, novamente provê que sua justiça fosse saciada juntamente com a aplicação da graça. A rocha é alvo do castigo que os filhos de Israel mereciam por sua desconfiança na ação salvadora do SENHOR.
A narrativa conclui proporcionando uma visão clara quanto ao pecado do povo, sendo usado isso como um recurso no qual o episódio de manifestação da graça divina é publicado e sintetizado mais intensamente:
Êxodo 17.7
E chamou o nome daquele lugar Massá e Meribá, por causa da contenda dos filhos de Israel e porque tentaram ao Senhor, dizendo: Está o Senhor no meio de nós ou não?
A presença de YHWH, como será demonstrado adiante, é uma das marcas por meio das quais o SENHOR demonstra sua graça salvadora para com o povo. Como dito, o questionamento de Israel em relação a isso, prova a fraqueza de seus corações em crer nessa verdade, e isso em razão de uma necessidade que também deveriam crer que Deus os supriria. Por outro lado, Moisés direciona a atenção dos filhos de Israel para a compreensão de que aquele episódio somente ressaltou a todos eles o quanto a Lei do SENHOR também aponta para sua misericórdia: ao tentarem YHWH, cada um deles era digno de ser ferido, o que não aconteceu; a rocha o foi, cujo ferimento proporcionou vida como resposta ao pecado do povo.
Transição
Ao chegarmos no Novo Testamento, temos uma compreensão ainda mais ampla do episódio ocorrido em Massa/Meribá. Em primeiro lugar, o apóstolo Paulo, em sua prédica à igreja de Corinto, afirma:
1Coríntios 10.1–4
Ora, irmãos, não quero que ignoreis que nossos pais estiveram todos sob a nuvem, e todos passaram pelo mar, tendo sido todos batizados, assim na nuvem como no mar, com respeito a Moisés. Todos eles comeram de um só manjar espiritual e beberam da mesma fonte espiritual; porque bebiam de uma pedra espiritual que os seguia. E a pedra era Cristo.
Ao enfatizar que o povo de Israel bebeu da uma pedra, o apóstolo faz referência direta ao texto de Êxodo sob análise. A pedra que forneceu água para os filhos de Israel, tendo sido ferida, era um “tipo” (gr. τύποι) de Cristo; uma referência direta ao Senhor Jesus e sua obra.
Noutras palavras, Paulo salienta que ao terem visto a água sair da rocha, eles estavam testemunhando uma encenação da obra redentiva definitiva que seria executada para livrar o povo de seu estado de pecado e condenação. A rocha sobre a qual se postou o SENHOR (cf. Êx 17.6) era o Messias, o Filho de Deus que haveria de ser ferido no lugar do povo, provendo também a salvação de toda a igreja de Deus, ao invés de esta receber a justa punição de seus pecados.
Ligado a isso, então ele adverte o povo quanto ao fato de que aquele fato foi “se torn[ou] exemplo para nós, a fim de que não cobicemos as coisas más, como eles cobiçaram”(1Co 10.6), e seguindo esse tom exortativo, o autor Aos Hebreus, salienta citando o Salmo 95.7-11:
Hebreus 3.16–19 ARA
Ora, quais os que, tendo ouvido, se rebelaram? Não foram, de fato, todos os que saíram do Egito por intermédio de Moisés? E contra quem se indignou por quarenta anos? Não foi contra os que pecaram, cujos cadáveres caíram no deserto? E contra quem jurou que não entrariam no seu descanso, senão contra os que foram desobedientes? Vemos, pois, que não puderam entrar por causa da incredulidade.
Ambas as passagens reportam-se ao evento ocorrido em Massá e Meribá, como demonstrativos da pecaminosidade do povo contra Deus, mas também como emblemas de um procedido que deve ser evitado pela igreja, a fim de que compreendam a natureza graciosa do favor redentivo do SENHOR, a ser contemplado em Cristo; o substituto penal que favorece seu povo com o provimento de vida em lugar de morte.
Frente a compreensão desse princípio, o texto de Êxodo 17.1-7 esclarece os seguintes pontos de aplicação:
Aplicações
1. Êxodo 17.1-7 (rf. 1Co 10.1-6; Hb 3.16-19) serve como advertência para nós quanto ao real significado de nossas ações pecaminosas, exemplificadas pelo pecado do povo de Israel: ao pecarmos contra o SENHOR, demonstramos incompreensão (ou mesmo oposição) quanto a sua obra salvadora.
Tendo em vista que devemos ler as Escrituras buscando que ela interprete a si mesma (CFW I.IX), precisamos compreender Êxodo 17.1-7 à luz dos dois textos supracitados: 1Co 10.1-6 e Hb 3.16-19.
O pecado de Israel, em seu murmúrio e contenda contra Deus, revelaram de forma clara a incompreensão do povo quanto a sua situação de redimidos por Deus, e dos benefícios que agora gozavam; maiores do que quaisquer necessidades que poderiam enfrentar, ainda mais que, em razão dos atos poderosos efetuados pelo SENHOR para sua redenção, eles deveriam esperar com certeza infalível de que YHWH lhes proveria o necessário para que chegassem à salvo na terra prometida a Abraão.
Paulo, entretanto, afirma que “estas coisas se tornaram exemplos para nós” (cf. 1Co 10.6), isto significa que a advertência mosaica reverbera ao longo da história progressiva da revelação do SENHOR, afim de que também nós fôssemos lembrados de que nossa remonstrância pecaminosa contra Deus (seja por meio da desconfiança em sua providência, ou por meio de quaisquer outras manifestações de iniquidade e transgressão à sua Lei e Mandamentos), incide no mesmo grave erro que Israel cometeu no passado.
Eles duvidaram quanto a estar o SENHOR em seu meio ou não (cf. Êx 17.7), isto é, se o SENHOR verdadeiramente os tinha redimido, e ainda fizeram pouco caso dessa obra, como mostrado no contexto anterior (cf. Êx 16.3).
Nossos pecados são afrontas ao caráter santo e puro do nosso Deus, e nossa condição como salvos não pode ser usada como desculpa para que descuidemos disso, pois mesmo dentre aquela multidão que foi tirada do Egito, o SENHOR não se agradou de alguns, “razão por que ficaram prostrados no deserto” (1Co 10.5).
Ligado a isso, o autor Aos Hebreus nomeia de maneira específica o pecado de Israel: eles foram incrédulos.
A murmuração e contenda do povo de Israel contra Deus, na verdade era uma forma de desobediência; eles estavam alimentado em seus corações uma aversão ao trato salvífico do SENHOR que estavam recebendo, opondo-se, como já frisado, à obra realizada por Deus que os havia tirado com mão forte de debaixo das cargas da escravidão.
O aviso bíblico funciona de igual maneira para nós hoje: devemos lembrar da ação pecaminosa de Israel, a fim de não afrouxarmos nossos padrões morais, permitindo que pequemos deliberadamente contra o SENHOR, achando que não seremos alvos de sua disciplina.
Ou que desconfiemos de tal forma do SENHOR (que paternalmente cuida de seus filhos), de tal maneira que nos vejamos assediados pelo pensamento de que a obra salvadora é algo de somenos importância, e assim, passemos a agir como rebeldes e incrédulos que, ao invés de reportar-se a Deus como a nosso Senhor e Salvador, damos vazão aos pensamentos ímpios que nos afastam da contemplação grata da obra salvadora da qual fomos feitos beneficiários.
De contra partida, também é mister lembrar que, apesar de nossa natureza contumaz, Deus, é gracioso, e como afirma o salmista, “não nos trata segundo os nossos pecados, nem nos retribui consoante as nossas iniquidades” (Sl 103.10). Apesar de merecer, o pecado do povo de Deus é tratado mediante a justa aplicação de sua ira santa, sobre Aquele provido para ser ferido em nosso lugar: Cristo Jesus, a Rocha ferida para matar nossa sede. O que nos leva a segunda aplicação.
2. Cristo é a providência divina que soluciona a tensão entre nosso pecado e a justiça divina. sendo provido como aquele que nos substitui, sofrendo o julgamento divino em nosso lugar, dando-nos vida quando a morte era o que merecíamos.
Matthew Henry, comentando o presente texto, observa que:
Embora a maldição de Deus pudesse ter sido executada com justiça sobre nossas almas culpadas, eis que o Filho de Deus foi ferido por nós (Matthew Henry e Thomas Scott, Matthew Henry’s Concise Commentary (Oak Harbor, WA: Logos Research Systems, 1997), Êx 17.1.
Da mesma forma que no contexto anterior, um ambiente de pecado é respondido com o provimento para a fraqueza do povo (i.e. Maná), agora, no capítulo 17, o Espírito direciona a igreja a compreensão quanto ao modo por meio do qual o SENHOR proveu que permanecêssemos como alvos de seu amor e graça, apesar de nossos pecados e misérias.
A odiosidade de nossa natureza corrupta teve como resposta o derramamento da ira do SENHOR sobre aquele que, por seu sofrimento, nos deu vida. Tal como da rocha no deserto correu água para saciar a sede dos filhos de Israel, do ferimento de Cristo correu o sangue nos dá vida em lugar de morte.
O caráter justo de nosso Deus não permite que ele simplesmente revogue um sentenciamento merecido. O pecado deve ser rebatido com ira e furor da parte do SENHOR. É assim que seu amor brilha mais forte, pois não foi o povo que foi ferido pelo cajado (instrumento usado por Deus anteriormente para julgar o Egito em sua oposição contra Deus) de Moisés, mas a rocha, essa rocha, como disse Paulo, é Cristo (1Co 10.4).
Conclusão
No Senhor Jesus contemplamos a misericórdia da Lei e a justiça da graça: o pecado não é inocentado, não seria justo; nem o transgressor é executado, pois não suportaria. Somente a Rocha que é Cristo, tem a firmeza necessária para suportar a ira divina, sendo o meio através do qual milagrosamente flui água da vida.
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