Quem são os Filhos de Deus?
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Primeira Carta de João (Filhos de Deus (2.29–3.6))
FILHOS DE DEUS
(2.29–3.6)
Nessa passagem João retorna à questão da conduta moral das pessoas como um teste do verdadeiro cristianismo. Já vimos que um dos seus propósitos nessa carta é apresentar vários testes por meio dos quais a igreja poderia reconhecer os verdadeiros crentes e os verdadeiros mestres. Os testes, que estão espalhados em diversos pontos da carta, abordam o caráter moral, a sensibilidade social e a pureza doutrinária dos que professam ser cristãos. Na passagem que estudaremos nessa seção, João retorna ao teste moral. Ele é apresentado agora de uma forma bastante sofisticada. João reúne diversos conceitos e os entrelaça em duplas, de forma a apresentar um quadro bastante complexo e profundo. Os seguintes temas são relacionados: (1) Ser nascido de Deus e a prática da justiça; (2) A segunda vinda de Cristo e a purificação moral; (3) A obra salvadora de Cristo e a prática do pecado.
Aquele que professa ser cristão, mas não vive em obediência, amor e verdade está enganado ou é um enganador. Pertence não às fileiras de Cristo, mas às fileiras do anticristo, e na segunda vinda de Cristo ficará envergonhado.
Warren Wiersbe está certo quando diz que a vida real é uma vida que consiste em prática, não apenas em palavras. Não basta saber, é preciso fazer (Ef 5.1; 1Pe 1.14,15; 2Co 13.5).
os que praticam a justiça são filhos de Deus (ver 3.7,10; cf. Mt 7.16–18). “O filho exibe o caráter do pai porque participa da natureza do pai” (J. Stott). Praticar a justiça não significa “meramente obras de justiça que visam justificar o homem diante de Deus” (J. Gill). Significa, estando em Cristo, fazer pela fé o que é certo, de acordo com os mandamentos de Deus. Isso se constitui na evidência de que a pessoa é nascida de Deus. Dessa forma, os leitores de João poderiam discernir quem é nascido de Deus ou não.
No seu Evangelho, João faz uma distinção entre nascer dos homens e nascer de Deus, que ele também chama de nascer de novo (Jo 1.13; 3.3–5; veja também Tg 1.18; 2Pe 1.4). João se refere à regeneração, o ato soberano de Deus pelo qual ele dá vida espiritual ao pecador, nascido morto em suas ofensas e pecados. Dessa forma, o pecador regenerado é chamado de nascido de Deus e filho de Deus, em distinção aos não regenerados, que nasceram apenas do homem.
A humanidade vem de Adão, “filho de Deus” (Lc 3.38). Porém, no sentido bíblico mais restrito, Deus é Pai como salvador daqueles que ele escolheu e chamou, os quais creram em Jesus Cristo e o receberam (Jo 1.12). É nesse sentido que João usa a expressão nascido de Deus aqui em sua carta.
Vede que grande amor nos tem concedido o Pai, a ponto de sermos chamados filhos de Deus; e, de fato, somos filhos de Deus (3.1a). João está enlevado diante do fato que somos nascidos de Deus e convida seus leitores a perceber a grandeza do amor de Deus neste fato. Esse amor consistiu em ter Deus enviado Jesus Cristo ao mundo para morrer por pessoas pecadoras como nós, e assim nos fazer filhos do Deus santo (4.9–10; Jo 3.16; Rm 5.8). Podemos perceber três coisas que despertam a admiração do apóstolo. Primeira, que essa dádiva foi concedida por Deus a pecadores indignos. Segunda, também desperta admiração aquilo em que essa dádiva os transformou: filhos de Deus. E terceira, que tudo isso foi algo concedido,palavra que aponta claramente para o caráter gracioso do amor de Deus. Não foi por mérito nosso, mas por seu amor livre e gracioso. O fato de Deus amar seres humanos caídos a tal ponto provoca a admiração do apóstolo; ele deseja que os cristãos da Ásia, assim como os de todas as épocas e lugares, compartilhem de seu deslumbramento.
Por essa razão, o mundo não nos conhece, porquanto não o conheceu a ele mesmo (3.1b). Os filhos de Deus, que praticam a justiça, certamente são diferentes em meio a um mundo decaído e não regenerado, provocando a estranheza dos incrédulos. O motivo da estranheza do mundo para com a igreja de Cristo reside no fato de que o mundo não conhece a Deus e consequentemente também não conhece os que dele são nascidos.
Da mesma forma que o mundo não reconheceu que Jesus, o carpinteiro, era o Messias, o Salvador do mundo, o Filho de Deus (Jo 1.10; ver também Jo 14.17; 17.25), também não reconhece os cristãos como sendo filhos de Deus. A causa da hostilidade é a cegueira espiritual, as trevas nas quais o mundo vive. Em João 15.18–19 o Senhor Jesus ensina que essa estranheza pode chegar ao ponto de se traduzir em ódio e perseguição.
Amados, agora, somos filhos de Deus, e ainda não se manifestou o que haveremos de ser (3.2a). No presente, a glória plena dos filhos de Deus permanece velada e oculta aos olhos do mundo, que continua sem conhecê-los. Juntamente com a criação, os filhos de Deus aguardam essa gloriosa manifestação (Rm 8.18–21). Ela ocorrerá, ensina João no verso seguinte, por ocasião da segunda vinda de Cristo.
Sabemos que, quando ele se manifestar, seremos semelhantes a ele, porque haveremos de vê-lo como ele é (3.2b). A glória dos filhos de Deus, ainda a ser manifesta, consiste no fato de que serão semelhantesa Cristo (Cl 3.4). João tem em mente a transformação dos corpos dos crentes na semelhança do corpo ressurreto e glorificado do Senhor Jesus (Fp 3.21), fato que Paulo chama de “a redenção do nosso corpo” (Rm 8.23). Isso ocorrerá mediante a ressurreição dos crentes mortos e a transformação dos vivos (1Co 15.50–52).
E a si mesmo se purifica todo o que nele tem esta esperança, assim como ele é puro (3.3). João ensina aqui que o efeito dessa certeza no cristão é a sua purificação presente. A palavra “esperança” é frequentemente usada no Novo Testamento no sentido de “certeza”: esperamos algo que sabemos que certamente virá. A esperança certa de que seremos semelhantes a Cristo, que é puro, desperta em nós o desejo de pureza. A pureza referida por João certamente não é a pureza cerimonial praticada pelos judeus, muito bem conhecida por ele, que consistia de lavagens e abluções com sangue de animais e água (veja Jo 2.6; 3.25; 11.55), mas sim a pureza moral.
da injustiça vem pelo sangue de Jesus Cristo, quando confessamos sinceramente os nossos pecados a Deus (1.7–9). Agora, ele explica que os cristãos também participam dessa purificação: “a si mesmo se purifica…” (3.3). O apóstolo se refere à santificação, processo diário no qual, pela graça de Deus e na força do Espírito, o crente mortifica os desejos pecaminosos e as tentações, revestindo-se mais e mais de Cristo (Ef 4.22–24). Purificar-se significa se limpar da sujeira moral que o pecado produz na mente, no coração, nos sentimentos. Isso é feito mediante quebrantamento, arrependimento, confissão de pecados e especialmente pelo afastamento contínuo do pecado e da sua sujeira. “O que coloca sua esperança, pela fé, no Filho de Deus experimenta uma purificação interior.
Em terceiro lugar, o grande amor de Deus deve ser correspondido (3.3). “E a si mesmo se purifica todo o que nele tem esta esperança, assim como ele é puro.” O apóstolo João não roga nem ordena aos filhos de Deus que se purifiquem. Ele declara um fato. Aqueles que aguardam a segunda vinda de Cristo automática e necessariamente se purificam, assim como ele é puro. Essa purificação não é cerimonial, mas moral, uma vez que a palavra grega hagneia, “pureza”, é liberdade de mancha moral.
- João passa a falar da obra de Jesus Cristo e em seguida volta a falar sobre a vida de quem é Deus e de quem não é.
Todo aquele que permanece nele não vive pecando; todo aquele que vive pecando não o viu, nem o conheceu (3.6). Essa é a consequência lógica da declaração anterior, que vem sob a forma de um teste moral. O verdadeiro cristão permanece em Cristo “como o galho da videira, derivando dele toda luz, vida, graça, santidade, sabedoria, força, alegria, paz e conforto” (J. Gill). Se Cristo não tem pecado e ele se manifestou para tirar os pecados de seu povo, segue-se que aquela pessoa que permanece nele, e que, portanto, é parte do seu povo, não vive na prática do pecado. A santidade de vida, assim, é mais uma vez apresentada por João como um teste do verdadeiro cristianismo. O filho de Deus não vive transgredindo a Lei de seu Pai. Quem leva uma vida de pecado nunca viu nem conheceu a Deus, mesmo que professe ser cristão. As suas obras falam mais alto que sua profissão de fé.
APLICAÇÕES
Pessoas que professam o Cristianismo, mas levam uma vida mundana (nos termos de 2.15–16), estão falhando no teste moral, o que indica que possivelmente algo está radicalmente errado no seu relacionamento com Deus.
Que teste tremendo para nós! João declara que quem vive pecando não conhece a Deus e, portanto, não pode ser filho de Deus. Porém, o que permanece em Cristo vence o pecado em sua vida. Teremos nós a coragem de aplicar a nós mesmos esse teste com sinceridade e seriedade diante de Deus?
É assim que podemos conhecer os verdadeiros filhos de Deus. Eles vivem na expectativa de ver o Senhor Jesus, preparando-se para isso mediante a limpeza diária de suas vidas. Eles sabem que o Senhor é puro e ama a pureza. Portanto, para agradar o Senhor, preparam-se para esse maravilhoso encontro. Em contraste, os que vivem no pecado, tendo vidas sujas e manchadas pela injustiça e iniquidade, demonstram que realmente não creem e nem vivem na expectativa desse encontro com o Senhor. Dessa forma podemos conhecer os verdadeiros crentes.
FILHOS DO DIABO E FILHOS DE DEUS
(3.7–10)
Em sua carta João aponta aos seus leitores algumas das características que identificam os filhos de Deus. Tais características funcionam como um teste, para que eles pudessem desmascarar os falsos mestres que se apresentavam como cristãos e que, ao mesmo tempo, introduziam doutrinas errôneas e ameaçavam a pureza doutrinária da igreja. O apóstolo ensina que o nascido de Deus pratica a justiça. Ele se purifica moralmente, na expectativa de encontrar-se com o Senhor Jesus, na sua vinda. Ele não pratica o pecado, pois o Senhor se manifestou para tirar os pecados. É dessa maneira que se pode reconhecer o verdadeiro cristão, declara João.
Filhinhos, não vos deixeis enganar por ninguém (3.7a). João continua o teste moral com essa advertência: que os falsos mestres parassem de tentar enganá-los, dizendo que a salvação era mediante um conhecimento (gnose) secreto e que a conduta moral das pessoas não fazia a menor diferença para Deus. Esse ensinamento era obviamente falso. Que os verdadeiros cristãos ficassem precavidos, pois, mesmo possuindo a unção da parte de Deus, havia a necessidade de vigiar e se cuidar contra o erro religioso. Aqui o apóstolo está exigindo uma atitude mais firme da parte das igrejas para com aqueles pregadores, do que simplesmente a de não lhes dar ouvidos. Os cristãos deviam quebrar de uma vez por todas o fascínio que aqueles encantadores porventura estivessem exercendo sobre eles. Em outra carta, o apóstolo determinou à igreja: “Se alguém vem ter convosco e não traz esta doutrina, não o recebais em casa, nem lhe deis as boas-vindas” (2Jo 10). É isso que os crentes da Ásia deveriam fazer.
Aquele que pratica a justiça é justo, assim como ele é justo (3.7b). Deus é justo (1.9; 2.9) e Jesus Cristo é justo (2.1). Quem é nascido de Deus é tornado justo mediante a obra substitutiva de Cristo e a imputação de sua justiça. Consequentemente, vive na prática da justiça. Essa é a verdade, e não o ensinamento dos falsos mestres. “Provavelmente diriam que a justiça de Deus estava profundamente arraigada no fundo de seus corações, mas a iniquidade de seus atos estava claramente evidente em seus olhos, pés, mãos e língua” (J. Calvino).
Aquele que pratica o pecado procede do diabo, porque o diabo vive pecando desde o princípio (3.8a). Essa é a consequência lógica do versículo anterior. Se quem pratica a justiça é justo e nascido de Deus, segue-se que quem pratica o pecado é do diabo. A doutrina dos pregadores combatidos por João, que seguia a dicotomia profunda entre o espírito e a matéria do gnosticismo incipiente de sua época, acabava produzindo indiferença para com o pecado e até mesmo a negação deste. João já alertara a igreja contra essa mentira (1.8,10). O pecado é uma realidade e se constitui na violação da lei de Deus (3.4); e da mesma forma que a prática da justiça identifica os que procedem de Deus (3.7), a prática do pecado identifica os que procedem do diabo.
O conceito de que os praticantes do pecado procedem do diabo tem origem no ensino do próprio Jesus: “Vós sois do diabo, que é vosso pai”, disse Jesus aos fariseus (Jo 8.44). Jesus declara nessa passagem que desde a criação do mundo o diabo foi assassino: ele foi o responsável primeiro pela “morte” de Adão e Eva, e de toda a raça humana. Logo, todos aqueles que têm desejos assassinos – como os fariseus tinham em relação a Jesus – são propriamente descendentes espirituais do diabo (Mt 13.38; Ef 2.2). Quando o diabo peca, faz apenas o que lhe é peculiar, o seu costume. E as pessoas que estão acostumadas a pecar como se isso fosse natural, são como o diabo, e, portanto, seus descendentes ou filhos. É nesse sentido que o Senhor Jesus se referiu a Judas como sendo do diabo (Jo 6.70); da mesma forma, João se refere a Caim nessa sua carta (3.12).
Nessa passagem que estamos estudando (3.8) o apóstolo claramente divide a humanidade em dois grupos apenas: aqueles que são filhos de Deus e os que são filhos do diabo. Com isso ele quer dizer que os filhos de Deus são guiados e governados pelo Espírito de Deus, enquanto que os outros são iludidos por Satanás e vivem debaixo do seu governo (5.19). Cada um desses grupos se dá a conhecer por suas obras, os de Deus pela prática da justiça e os do diabo pela prática do pecado. Não existe terreno neutro aqui: ou somos de Deus ou do diabo.
Para isto se manifestou o Filho de Deus: para destruir as obras do diabo (3.8b). Quem continua pecando pertence ao diabo, denuncia o apóstolo João. Entretanto, há esperança para os cativos de Satanás. O que o diabo tem feito é espalhar o pecado e a morte entre a humanidade. “Moralmente, sua obra é tentar para o pecado; fisicamente, é infligir doença; intelectualmente, seduzir para o erro. Ele ainda ataca a alma, o corpo e a mente do homem dessas três maneiras” (J. Stott). Essas são as suas obras. Jesus Cristo, o Filho de Deus, manifestou-se ao mundo com o específico propósito de destruir (no original, desfazer) essas obras, ou seja, soltar as amarras do pecado, dissolver seu poder e influência na vida dos pecadores (cf. 3.5).
Todo aquele que é nascido de Deus não vive na prática de pecado (3.9a). Aqueles que são alcançados por Cristo e por sua obra de destruição do pecado se tornam filhos de Deus; como resultado, não vivem mais pecando, como antes.
Pois o que permanece nele é a divina semente; ora, esse não pode viver pecando, porque é nascido de Deus (3.9b). Aqui o apóstolo declara a razão pela qual o filho de Deus não vive na prática do pecado. “Divina semente” tem sido entendido por alguns como uma referência de João ao Espírito Santo, que é dado aos nascidos de Deus e que neles permanece, e controla suas paixões, mortifica o pecado e os habilita a viver uma vida santa (3.24; 4.13).
o nascido de Deus não pode viver pecando, porque é nascido de Deus (3.9b). Muito embora permaneçam nele restos da natureza pecaminosa, prevalece a nova natureza, ou seja, a vida divina, a semente de Deus, que não permite que o nascido de Deus continue pecando e que o impulsiona diariamente a buscar a Deus e a fazer o que agrada ao Pai. João não está dizendo que o nascido de Deus não peca – mas sim que não vive na prática do pecado.
Nisto são manifestos os filhos de Deus e os filhos do diabo: todo aquele que não pratica justiça não procede de Deus, nem aquele que não ama a seu irmão (3.10). É aqui que reside o tremendo teste ao qual João submete seus leitores e os falsos mestres. “Tal declaração não é muito popular numa época como a nossa, que deseja remover todas as distinções entre os crentes e o mundo” (A. T. Robertson). Os verdadeiros cristãos são reconhecidos pelo fato de que não vivem pecando, enquanto que os falsos crentes e falsos mestres, que João chama de filhos do diabo, esses não praticam a justiça (isto é, vivem habitualmente no pecado) e não amam seu irmão. Esses não procedem de Deus, mas do diabo. João termina o teste moral mencionando o amor aos irmãos. Sem dúvida, o amor é o resumo dos mandamentos (Rm 13.9); e logo em seguida, João apresenta, mais uma vez, o teste do amor, que é o tema da próxima seção.
APLICAÇÕES
Durante os cultos em uma igreja local, todos parecem ser cristãos, assentados, ouvindo a Palavra, cantando e participando do culto. É pela conduta após o culto que se revela quais são os verdadeiros cristãos.