Sem título Sermão (4)
A cura do filho do oficial demonstra o poder de Cristo e destaca que a fé dos galileus era dependente de milagres (4.43–54).
Se não ver, não crer?
A cura do filho do oficial demonstra o poder de Cristo e destaca que a fé dos galileus era dependente de milagres (4.43–54).
Este parágrafo apresenta um problema. Diz que Jesus retornou para a Galileia porque “um profeta não tem honra na sua própria terra”. Mas o que isso quer dizer exatamente? Da lista de explicações disponíveis, selecionamos as seguintes:
(1) Alguns defendem que Jesus se mantém fiel ao seu plano de ir para a Galileia, a despeito de saber que um profeta não tem honra em sua própria terra (isto é, na Galileia).104 Não podemos aceitar esta explicação. A passagem expressa claramente que Jesus foi para a Galileia porque sabia que um profeta não tem honra em sua própria terra; não a despeito deste conhecimento, mas por causa dele. A palavra que conecta os versos 43 e 44 é a partícula porque (γάρ) em seu sentido causal.
(2) Outros dizem que Jesus vai de Sicar para a Galileia porque sabe que, em sua própria terra, isto é, a terra onde nasceu, a Judeia, seus esforços foram infrutíferos.105 Também rejeitamos esta explicação, pela simples razão de que o termo sua própria terra indica claramente a Galileia, e não a Judeia, em todas as demais ocorrências nos Evangelhos. Veja Mateus 13.54,57; Marcos 6.1,4; Lucas 4.16,24. Encontramos nestas passagens o mesmo provérbio, mas a região a que se refere é onde se localiza Nazaré. Jesus nasceu em Belém da Judeia, mas seus pais moravam na Galileia e foi ali que ele cresceu e se tornou adulto. Assim, a Galileia era a sua própria terra.
(3) Há, ainda, os que alegam: Jesus vai para a Galileia, mas não até ter obtido renome em Jerusalém, pois sabia que um profeta não tem honra em sua própria terra (isto é, a Galileia). Após ter obtido renome na Judeia, ele descobre que a Galileia agora também está pronta para honrá-lo.106 Diz-se que o verso 45 prova que esta teoria está correta. Lemos ali: “Assim, quando ele veio à Galileia, os galileus o receberam tendo visto tudo o que ele tinha feito em Jerusalém, na festa, pois eles também tinham ido à festa”. Deve-se admitir, em favor desta explicação, que: a) Faz jus ao sentido da partícula porque (relacionamento causal); b) Interpreta corretamente o termo sua própria terra como referente à Galileia; e c) Leva em consideração o contexto em certa medida.
Apesar disso, não aceitamos essa teoria. Nossas objeções são as seguintes: a) Ela insere no texto coisas que não estão lá. Dizer que Jesus “partiu dali para a Galileia, porque o mesmo Jesus testemunhou que um profeta não tem honras na sua própria terra” não é o mesmo que dizer: “Jesus não foi para a Galileia até ter obtido renome em Jerusalém, porque o mesmo Jesus testemunhou que um profeta não tem honras na sua própria terra”. No primeiro caso (o texto como realmente se apresenta), é dada uma razão para mostrar por que Jesus continuou em seu caminho para a Galileia. No segundo caso, é dada uma razão para indicar por que ele trabalhou em Jerusalém antes de ir para a Galileia. Estas são duas proposições diferentes, e não funciona supor que o leitor já conhece o conteúdo do verso 45 antes de ter lido o verso 44! b) Esta teoria assume que o texto quer dizer que Jesus foi honrado na Galileia. Contudo, nas outras passagens em que ocorre este mesmo provérbio, ensina-se claramente o oposto (Mt 13.54–58; Mc 6.1–6; Lc 4.16–30: em vez de honrá-lo, as pessoas tentaram matálo). Além disso, quando 4.45 declara que os galileus o receberam porque tinham visto seus milagres, isso não deve ser interpretado como significando que eles o honraram (4.48 ensina o contrário). Entusiasmo exterior, em geral por motivos egoístas, não é honra.
(4) Ainda há outra explicação: Jesus foi para a Galileia porque ali não precisaria temer honrarias que o colocassem em colisão imediata com os fariseus, gerando uma crise prematura.107 Aceitamos esta explicação pelas seguintes razões:
a) É de longe a mais simples e óbvia. Faz jus à expressão sua própria terra (interpretando-a à luz das passagens paralelas nos demais Evangelhos) e também à conexão causal expressa pela partícula porque. Além disso, interpreta literalmente os versos 43 e 44, assim como estão, sem tentar sobrecarregá-los com inserções mentais ou construções históricas pré-concebidas. O conteúdo destes dois versos pode, então, ser analisado brevemente assim: após dois dias, Jesus partiu de Sicar. Foi para a Galileia, sua própria terra. Fez isso porque sabia que um profeta não tem honras em sua própria terra, como ele mesmo testificara.
b) Está inteiramente em harmonia com o contexto precedente. Quanto a isso, deve-se lembrar que os versos 43 e 44 resumem o pensamento expresso nos versos 1 a 3. O relato da conversa de Cristo com a mulher samaritana e de sua obra entre os samaritanos (4.4–42) é, na verdade, um interlúdio. A sensatez desta explicação surge quando se lê consecutivamente os textos de 4.1–3 e 4.44, assim:
Ora, quando o Senhor soube que os fariseus tinham ouvido: “Jesus está ganhando e batizando mais discípulos que João” 2 – embora Jesus mesmo não estivesse batizando, mas seus discípulos – 3 ele saiu da Judeia e voltou novamente para a Galileia. […]Pois o próprio Jesus tinha testificado: “Um profeta não tem honra em sua própria terra.”
c) Está inteiramente em harmonia com o contexto subsequente. Embora os galileus estivessem obviamente felizes em receber um fazedor de milagres em seu meio (4.45), eles não o honraram (4.48). Pouco a pouco começaram a murmurar contra ele (6.41) e finalmente o deixaram, em grandes números (6.66).
Jesus lamenta que este homem, que já tinha ouvido (e, talvez, visto) tanto sobre o Cristo, ainda permanecia no degrau mais baixo da escada da fé. Sua confiança, assim como a de outros como ele, precisa ser constantemente alimentada por sinais e prodígios. Ele não crê na pessoa divina de Cristo, nem em sua palavra, se esta não vier acompanhada de um milagre.
Ele assumiu que, para curar, Jesus precisaria viajar de Caná para Cafarnaum e ir até a cama do menino.
Ele também estava convencido de que o poder de Cristo não ia além da morte. Jesus precisa vir logo, pois a criança estava à morte. Se houvesse algum atraso e o menino morresse antes de ele chegar, tudo estaria perdido.