Confia no Senhor e Faze o Bem (Salmo 37)
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Salmos não são um compêndio de versos legais para se tornarem frases de caminhão. Bem, eu sei que nesse salmo temos pelo menos dois versículos que se tornaram conhecidos por serem utilizadas como frases de efeito (vs. 4 e 5), principalmente fora do contexto original - vamos tentar entendê-los. Mas amados, como ouvimos no início dessa série, os salmos são uma radiografia da alma. É muito improvável que você não encontre nos salmos o ressoar de vários de seus sentimentos ao longo da vida: tristeza profunda, júbilo, lamentos, triunfo, indignação, imprecação, confiança, etc.
Este salmo é especialmente um destes (juntamente com seu irmão 73). Trata-se de nossa indignação diante da prosperidade dos malvados, dos perversos (ímpios aqui tem frequentemente essa conotação). Sabe o sentimento de assistir um filme ou ler uma história em que, no final, o bandido se dá bem? Bem, é verdade que na ficção isso é raro (talvez ainda), mas na vida real isso é bem comum. Condenados em várias instâncias da justiça soltos. Corruptos declarados com processos intermináveis. Assassinos de crianças soltos. Talvez você, como um morador de Fortaleza-CE, já tenha sido assaltado ou alvo de alguma injustiça e o ladrão provavelmente está solto. É compreensível que você, como Davi levanta aqui, questione como pessoas que odeiam o Senhor (em palavras ou em ações - algumas delas ainda que vestidas de ovelhas) tenham mais riquezas, às vezes, até mais paz que você. É provável ainda que caíamos na cilada de olharmos para nossa “justiça própria” como frequentadores da igreja, pessoas com relação com Deus e pensarmos que muitos perversos tem casas melhores, cargos melhores, e parecem até sofrer menos que nós (“pois sofrem em Paris”). Assim, este salmo ajuda-nos a olhar o problema do perverso da perspectiva de Deus.
Falando de sua estrutura, ainda que ele pareça um pouco “desorganizado” do ponto de vista temático, percebemos que ele está muito bem organizado de forma acróstica (como os salmos 9, 10, 25 e 34), onde todas as letras do alfabeto hebraico estão inclusas, e dois versículos são destinados a cada letra (Allan Harman, p. 172). Por isso, temas semelhantes estão distribuídos ao longo de todo o salmo. Para nossa exposição, vamos dividir a exposição em três pontos:
1. O chamado a não desviar o olhar para a perversidade
Qual o nosso sentimento quando vemos que aqueles que não se interessam sobre qual a instrução da bíblia para qualquer assunto se dão bem? Mais que isso: se dão melhor nesse mundo debaixo do céu que nós. Parte deles não somente desconsidera a lei de Deus, mas perseguem o que estão no reto caminho (vs. 14,32) desde Abel, passando por Cristo, por Estêvão (Sl 37.12, At 7.54) até os dias de hoje.
A instrução de Deus é “não te aborreças por causa dos homens maus”. Vejamos bem, a ideia não é anular o nosso senso de justiça - nem descalibrar nossa bússola moral sobre o certo e errado. É que quando nos concentramos apenas e diligentemente no mal do mundo, podemos extrair de nós o que também é mal. O paralelismo no verso primeiro é que esse foco na prosperidade dos maus pode estar andando juntamente com um coração invejoso - como “por que não estou na mesma condição que ele?”. A resposta é: não tenha inveja dos perversos, pois eles não passam de relva, num momento está verdejante e logo está seca (v. 2).
O ponto de Davi, a esta altura um homem experiente (v. 25), era que essa irritação incisiva (bárbara) nos coloca em semelhança aos caminhos dos perversos (vs. 8 / 1,7,8 ordenam “não te aborreças, te irrites, te impacientes”, sendo mesma palavra no hebraico - significa “não te abrases, ‘fique quente’; ‘não esquente a cabeça’). Isso me lembra quando pessoas em governos anteriores estavam tão focados na corrupção, uma indignação lícita, mas feita de forma tão beligerante que ficavam transformadas, iradas e ressentidas. Hoje o movimento é semelhante quanto às indignações, também lícitas, contra o governo atual - conheci uma moça que ela não estava dormindo direito de tanta raiva.
Notamos, até com certa frequência, ativistas que, sedentos de justiça, se tornam repetidores dos comportamentos que abominam. Direitos femininos que não são para todas as mulheres, mas somente para as da causa. Igualdade que não é para todos, mas como numa obra de George Orwell, “uns são mais iguais que outros”. Jovens engajados - e com isso quero dizer pré-adolescentes- que os rostos expressam exclusivamente revolta.
Qual a instrução do Senhor? 3 “Confia no Senhor e faze o bem” (ver também o 27). Na verdade, é um imperativo. A maldade ao nosso lado pode exercer um poder paralisante. De pensarmos que não vale a pena lutar, trabalhar, fazer o bem. Pode gerar em nós um sentimento de “ah, vou deixar o mal se resolver por si só” - mas, veja, ele não vai. Aqui já fica a dica para nós: se há algum problema na tua vida pessoal, devocional, no teu casamento, nos teus relacionamento, etc… vai lá e resolve. Não joga para debaixo do tapete. Como veremos em breve, o problema do mal não é insolucionável para Deus - Deus já iniciou a solução em Cristo, e resolverá totalmente o problema do mal.
Mais do que nos concentrarmos no mal - mais do que evitarmos seu efeito paralisante: somos promotores do bem. E aqui não é um bem relativo, mas fincado na Palavra do Senhor que criou o mundo e reorganiza o mundo à condição moral que deve estar (vs. 30,31). Por isso, o bem operado pelo justo: a) é testificado por sua boca - o que tem lá dentro, no coração - a Palavra nutre o coração para que as palavras da boca sejam justas e retas; b) é expresso em compaixão - vê sua riqueza como uma forma de servir (21, 26), e não somente de arrancar mais; Não menosprezamos os serviços de mercado como um serviço à sociedade , mas o lucro pessoal do justo vem carregado de responsabilidade para servir: ganha mais, serve mais.
“Não se concentra, não se paralisa”: v. 34 “confia e segue seu caminho” continua fazendo o que tu fazes (34); Não é que diante da prosperidade do ímpio o fiel procurará uma forma de se sobressair e ser mais do que ele; é que se o justo, em meio a caminhada, parar para ver a grama verde do vizinho impiedoso, perceberá a loucura dessa distração e continuará a jornada (pela fé Hc 2.4).
2. A ordem para organizar o coração
Ao contrário da inveja, Davi ressalta que precisamos nutrir confiança no Senhor (vs. 3,4,5,7 e 34).
Como falamos no início, aqui estão dois versos que se tornaram espécies de frases de caminhão de crente. Aquelas frases que encaixam em contextos de vitória pessoal, prosperidade, mas que não são o sentido original do verso. Quantas vezes não vemos por aí alguém precisando de palavras de confirmação diante de algum desafio da vida e chega alguém e diz: agrada-te do Senhor e ele satisfará o desejo do teu coração; entrega teu caminho ao Senhor; confia nele, e ele tudo fará?
Veja que existe um trabalho anterior ao serviço de fazer o bem: confiar em Deus. Deus não quer ativistas do Reino, ele quer discípulos. Essa confiança é demonstrada em alguns aspectos:
que nossa herança é o Senhor. O salmista traz como pano de fundo a terra da promessa: onde o próprio Deus habitaria com seu povo (vs. 3,9,11,18,22,27,29,34,). A terra é um resumo das bênçãos da aliança. Confiar em Deus e fazer o bem é a única rota da jornada dos justos em direção ao gozo eterno com Deus. Algumas de nossas ansiedades são lançadas fora quando lembramos que a carreira do justo é formada na certeza de que já possui riquezas e morada permanente nos céus. Isso tira toda nossa ira e coloca mansidão (Mt 5.5).
que nossa satisfação deve estar em Deus. “Agrada-te - ele satisfaz” - não é possível ter satisfação perene senão primeiramente em Deus. Essa é a lógica quebrada em Gênesis 3: ter Deus como fonte primária de toda a satisfação e procurar pôr coisas no lugar. Aqui a relação entre fé e boas precisa ser observada: obras te ajudam a ter satisfação no Senhor, e te produzem corações prontos a servir.
que o que Deus quer para nós é melhor do que o que queremos. O verso 4 não é manipulação, é conformar o coração com aquilo que verdadeiramente Deus quer para você. O Senhor te dará o que você precisa, não o que você quer - mas a medida que seu coração é conformado, você começará a pedir o que você realmente precisa (Jo 14.13-14); Se não consegue ainda, ora 1Pe 5.7.
que ele sabe o que está fazendo - essa é a tônica do verso 5: não haverá injustiça cósmica (tema recorrente nos salmos). Vive confiando em Deus e prossegue - faz o bem, serve. A execução da Justiça está em suas mãos (v. 6 em diante; 10-15). Por isso, amados, Jesus não tinha inveja! Ele não olhava a riqueza ao lado e ficava ali remoendo. Ele sabia onde estava o seu coração e conhecia bem a verdade do verso 16. Ele cria no Pai e seguia (como carpinteiro, ou como Salvador).
3. A segurança do juízo
A resposta geral do salmo é: todo esse triunfo é ilusão! Um dos destaques do salmo é exatamente a transitoriedade da riqueza e prosperidade do ímpio (35 e 36; 10 a 13).
Quando vemos que o Senhor se ri (13) - é que Ele não está arrancando os cabelos por causa dos perversos; O movimento humano contra Deus é tolo - torna-se risível. O salmo nos lembra que na perspectiva de Deus toda história humana é breve - e assim é iminente também o juízo, seja na morte, seja na segunda morte. O que o homem não percebeu é que espada da injustiça transpassará o seu próprio corpo (15). Suas maldades serão seus algozes.
Mas isso deve gerar em nós um senso de temor - e temor diante de nossas tentações. O imperativo “afasta-te do mal” (27) é importantíssimo, pois uma das tentações de nosso coração insensato e do inimigo de nossas almas é nos convencer de que nã vale a pena seguir o Senhor; melhor mesmo é seguir as ofertas desse mundo. Mas não: o resultado das vidas não será o mesmo (v. 37). Se há alguma esperança para o homem, é a salvação que vem do Senhor (39,40), que a nós tem nome: é Jesus Cristo. Éramos também os malvados, os perversos, os malfeitores. No entanto, ao invés de nossa espada perfurar nossas entranhas, agradou ao Pai moê-lo (Is 53.10). O castigos que nos traz a paz esteve sobre ele, o Filho (Is 53.5). Nele está nossa justiça, e nele o poder de andarmos em retidão. Podemos crer em seu auxílio.
S.D.G