Mateus 5.43-48

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Cristo demonstra através da Lei, que a vontade de Deus é que demonstremos misericórdia e graça, para com nossos inimigos, assim como Deus usou de graça para conosco quando ainda éramos rebeldes à ele.

Notes
Transcript
“[...] Porque é chegado o Reino dos céus” (Mateus 3.2).
Pr. Paulo Rodrigues
Introdução
Prosseguindo com mais uma aplicação que reflete o modo de como a justiça do Reino dos céus é superior ao legalismo dos fariseus, Cristo volta-se agora a ampliação do princípio que abordou na seção anterior quando observou o comportamento dos agentes do Reino em relação a vingança ou ao tratamento para com pessoas que não lhes são favoráveis.
Elucidação
Há um tom de aprofundamento da parte de Jesus, quando volta-se não só a pessoas desfavoráveis, mas ao tratamento que deve-se ter para com os próprios inimigos, tendo em vista que também a este os fariseus haviam elaborado a noção de que deveriam ser desprezados ou resistidos. A graça e misericórdia devem ser estendidas agora também aqueles que são nossos adversários, para que através disso possa ser destacado a diferença entre os ensinos dos mestres da lei e a Lei de Deus, segundo corretamente interpretada por Cristo.
À luz daquilo que fora abordado anteriormente, o SENHOR Jesus Cristo continua sua crítica a doutrina ensinada pelos escribas e fariseus, que destoava completamente da verdade Bíblica conforme encontrada no Antigo Testamento, especificamente na Lei de Moisés. Tendo determinado que, para os agentes do Reino, a postura natural a ser tomada diante de alguém que não nos é favorável, é estender-lhe o braço da misericórdia e da graça, agindo com benevolência ao invés de simplesmente querer achar-se como lesado em todas as situações, reclamando assim algum direito de vingar-se do próximo.
Cristo agora salienta que é parte da nova vida em Deus que os seus filhos desistam de darem ouvidos a doutrina separatista que era pregada pelos mestres da Lei. O ponto agora é o grave equívoco perpetrado pelos escribas de amar apenas ao compatriotas, ou às pessoas próxima, odiando e desprezando todo aqueles que não fosse judeu. Como coloca Lloyde-Jones:
[Os fariseus e escribas] Asseveravam eles que o “próximo” era apenas algum outro israelita. E ensinavam os judeus a amarem a outros judeus, mas, ao mesmo tempo, ensinavam que os judeus precisavam considerar todas as pessoas de outras raças e nações não somente como estrangeiras, mas como inimigas. Efetivamente, chegavam ao extremo de sugerir que a tarefa dos judeus, e quase mesmo seu direito e dever, era odiarem essas outras pessoas. Através da história secular tomamos conhecimento do ódio e do amargor que dividia os povos do mundo antigo. Os judeus consideravam todos os outros povos meros cães, e também muitos povos gentílicos desprezavam os judeus. Interpunha-se entre judeus e gentios aquela terrível “parede da separação que estava no meio” (Efésios 2:14), a qual dividia o mundo e provocava uma intensa animosidade. Assim sendo, havia muitos, entre os mais zelosos fariseus e escribas, que ensinavam que os judeus estariam honrando a Deus se desprezassem a todos aqueles que não fossem judeus. Julgavam que tinham o dever de odiar àqueles que consideravam seus inimigos. Entretanto, essas duas afirmações não podem ser encontradas justapostas em qualquer porção do Antigo Testamento.
Evidentemente, os mestres da Lei apenas tinham consideração por aqueles que eram seus irmãos, demonstrando claramente uma graça seletiva ou um favor orientado para aqueles que devem ser considerados seus próximos.
Este ensino do SENHOR Jesus Cristo pode também ser considerado, como já aludimos, um desenvolvimento daquele que ele trata nos versos de 38 a 42. O amor exposto neste texto, antes de ser algum tipo de consideração salvífica universal de Deus, é a resultante da própria graça comum de Deus em ser benevolente para com todos os que vivem neste mundo, mesmo os que são ímpios e reprovados pelo Soberano quanto a salvação. O próprio Criador é o exemplo (v. 48) do procedimento esperado daqueles a quem foi manifesto o Reino dos céus: uma benevolência tamanha, a ponto de amar ao inimigo ou adversário.
Outro fator que deve ser destacado, é a comparação realizada por Cristo quanto aos “publicanos”, no sentido de exceder sua justiça ou procedimento. Conforme lemos nos versos 46 e 47, o SENHOR chama a atenção de seus ouvintes a considerar que, se o amor deve ser direcionado apenas aos pares, isto é, aqueles que nós definimos como irmãos, “que fazeis de mais” (v. 47)? Como comenta Ferguson:
O povo de Deus deveria ser diferente. Deveria ser óbvio que somos “extra-ordinários”, pois nosso Pai é “extra-ordinário”. Isso é o que Jesus quer dizer quando nos diz para sermos perfeitos como o Pai é perfeito. Ele não supõe que podemos atingir perfeição moral nesta vida, mas, ao invés disso, se refere à maneira como o amor do Pai é manifesto em perfeição pela forma como ama Seus inimigos. O homem que assim o faz mostra que o objeto do seu amor não o controla, mas é controlado por sua própria vontade e pelo compromisso que tem aos caminhos do Pai.
De maneira contrária às seções anteriores, Cristo não cita nenhum princípio da Lei quanto afirma: “ouvistes que foi dito: amarás o teu próximo, e odiarás o teu inimigo” (v.43). Esta afirmação de Jesus claramente é a exposição do pensamento farisaico de seu tempo, que mais uma vez distorce a Lei de Deus.
O texto antitético à essa conclusão e que pode ter sido usado pelos mestres da lei de maneira leviana e errônea, é Levítico 19.18, onde a primeira parte da Lei mosaica era considerada pelos fariseus e escribas e usada para interpretar o restante do enunciado, isolando o significado à algum sentimento aceptivo: “Não te vingarás, nem guardarás ira contra os filhos do teu povo; mas amarás o teu próximo como a ti mesmo. Eu sou o Senhor”. Mais uma vez, o ensino torto dos escribas e fariseus consistiam em uma orientada ênfase de um ponto da Lei a fim de que suas próprias ideias fossem vistas como amparadas no Antigo Testamento, ao passo de concluírem que o amor deveria ser direcionado apenas aos naturais de Israel, e não aos publicanos e gentios (ou ainda pecadores, de acordo com alguns manuscritos antigos do NT).
Como também já se mostrou um padrão, a análise de Cristo se ampara corretamente na percepção da intenção original da passagem, que era a intenção de Deus de preservar e refrear o mal dentre o povo de Israel, porém, nunca foi a intenção da Lei mosaica restringir o amor apenas aos limites do povo, e assim, o termo próximo na passagem de Levítico “לְרֵעֲךָ֖” (hb. trans. “lêrearrah” = “outro, próximo, companheiro”) já continha uma noção mais ampla do que simplesmente ‘outro judeu’. Outro ponto que reforça essa compreensão é o contexto em que a passagem está inserida, onde do versículo 9 até o 18, as considerações legais enfatizam a relação justa tanto para o natural da terra quanto para o estrangeiro, como é percebido no verso 10:
Quando também segares a messe da tua terra, o canto do teu campo não segarás totalmente, nem as espigas caídas colherás da tua messe. Não rebuscarás a tua vinha, nem colherás os bagos caídos da tua vinha; deixá-los-ás ao pobre e ao estrangeiro. Eu sou o SENHOR, vosso Deus. Não furtareis, nem mentireis, nem usareis de falsidade cada um com o seu próximo; nem jurareis falso pelo meu nome, pois profanaríeis o nome do vosso Deus. Eu sou o SENHOR. Não oprimirás o teu próximo, nem o roubarás; a paga do jornaleiro não ficará contigo até pela manhã. Não amaldiçoarás o surdo, nem porás tropeço diante do cego; mas temerás o teu Deus. Eu sou o SENHOR. Não farás injustiça no juízo, nem favorecendo o pobre, nem comprazendo ao grande; com justiça julgarás o teu próximo. Não andarás como mexeriqueiro entre o teu povo; não atentarás contra a vida do teu próximo. Eu sou o SENHOR. Não aborrecerás teu irmão no teu íntimo; mas repreenderás o teu próximo e, por causa dele, não levarás sobre ti pecado. Não te vingarás, nem guardarás ira contra os filhos do teu povo; mas amarás o teu próximo como a ti mesmo. Eu sou o SENHOR.
Nunca fora tencionado pela Lei de Deus algum tipo de diferenciação entre israelitas e gentios, de maneira que o amor fosse direcionado apenas aqueles, e estes deveriam ser desprezados. Jesus aponta que o amor ao próximo é a demonstração evidente de um nascimento do Alto, do Reino dos céus, através da exibição de uma graça e benevolência até mesmo para com inimigos, assim como o próprio Deus fez para conosco, quando, fazendo pouco caso de nossa condição de rebeldes, estendeu-nos o braço de misericórdia.
A ênfase comparativa de Cristo no verso 48 alude a essa verdade. A perfeição derivada do próprio Deus não se aplica à algum tipo de desfrute de uma transformação ontológica que nos iguale ao Criador, mas, agora trazidos ao Reino, somos capacitados a replicar a mesma atitude misericordiosa, tornando-nos assim "perfeitos, como é perfeito nosso Pai celeste".
Transição
De acordo com tudo o que foi visto, a perspectiva de Cristo com relação a correta aplicação da Lei mosaica, compreende uma clarificação do princípio que sempre fizera parte do significado da ordem “amai ao próximo”. “A ordem de amar o próximo e odiar o inimigo é elevada à ordem de amar os inimigos e orar pelos perseguidores”. Caminhando em consonância às exemplificações anteriores, Cristo Jesus trata da inclinação do coração dos agentes do Reino frente ao correto entendimento da Lei, que os leva a transcender a justiça dos escribas e fariseus, glorificando não seu próprio nome, mas o do Deus Triuno, por meio da manifestação da graça e da misericórdia na vida deles e que deverá se estender a outros, como também fora enfatizado nos versos de 38 a 42.
Aplicação
O amor aos inimigos demonstra a transformação resultante da entrada no Reino
Se a seção anterior já expõe um princípio que era absurdo para os mestres da lei, propondo que se deveria perdoar e "oferecer a outra face aos que nos perseguem", numa postura resiliente e graciosa que exibe a graça e a misericórdia com o que o próprio Deus nos tratou, perdoando aqueles que o ofenderam, amar os inimigos é algo que é radicalmente contra o pensamento daqueles homens, e também contra o modo de pensar do mundo no qual vivemos.
Assim como nos instrui Cristo no texto anterior, devemos nos lembrar que éramos inimigos, e através do amor de Deus em Jesus, fomos feitos filhos, isso por meio de um amor livre e incondicional, que não escolhe favorecimentos, até porque, como poderíamos favorecer a Deus? Diferentemente dos fariseus e escribas que achavam que somente aos “irmãos nacionais” deveria ser direcionado o amor e a benevolência, Cristo nos ensina a amar os inimigos, não escolhendo ou selecionando de forma elitista, quem é digno de receber nosso favor.
Se Deus olhasse para nós a fim de procurar algum tipo de qualidade que o pudesse atrair para que nos amasse, nada encontraria, senão, motivos para que sua ira se inflamasse ainda mais ao ponto de nos destruir. Porque, pois, nós selecionaríamos quem deve ser alvo de misericórdia e quem não, baseados em algum tipo de parcialidade corrupta que mais busca favorecimentos do que propriamente demonstrar graça?
O comparativo usado por Cristo no versículo 48 destaca para nós qual é o exemplo que devemos tomar ao amarmos os nossos inimigos: “sede perfeitos como perfeito é o vosso Pai celeste”. A perfeição de que Jesus fala, não é outra senão a de um favor irrestrito e livre que é direcionado a pessoas que não o merecem. Também não deve ser algo mecânico e falso, como quem ama o inimigo apenas para demonstrar a inferioridade daquele a quem o tal “amor” é direcionado. Para aqueles que nos perseguem e maltratam está posto a ordenança de amá-los, revelando-lhes a perfeição e benevolência de nosso Deus, que nos transformou a fim de que fosse possível replicar, ainda que numa escala infinitamente menor, a mesma postura dele para conosco, pois como afirmamos, ele amou aqueles que antes eram seus inimigos, para transformá-los em filhos.
Conclusão
Amar aos inimigos certamente é algo difícil para nós. Assim como os fariseus, sempre somos tendenciosos a selecionar quem deve ser amado por nós ou não, baseados no quanto somos favorecidos pelas pessoas. Porém, essa ordenança de Cristo contida na Lei, é o meio através do qual vivemos à luz do Evangelho e testemunhamos dele ao mundo, pois, é amando nossos inimigos que exemplificamos como o Deus Triuno é gracioso em perdoar pecadores.
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