Mateus 6.5-8

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Jesus exorta os agentes do Reino sobre como devem orar, demonstrando que são filhos de Deus e estão preocupados com a glória dEle.

Notes
Transcript
“[...] Porque é chegado o Reino dos céus” (Mateus 3.2).
Pr. Paulo Ulisses
Introdução
Desde o capítulo 5 o SENHOR Jesus Cristo elabora aplicações práticas de como os agentes do Reino devem responder a revelação de Deus em Cristo que os salvou, sendo esta o cumprimento das promessas veterotestamentárias, promessas essas que não foram compreendidas pelos mestres da lei, que por sua vez, transformaram os princípios legislativos divinos em meio através dos quais promovem-se por meio do legalismo e egocentrismo.
É exatamente na contramão desses ensinamentos que Jesus baseia seu sermão, norteando seus ouvintes quanto a qual é a verdadeira interpretação da Lei, e agora, no capítulo 6, qual é a forma como devemos nos relacionar com o Pai, principalmente em face das boas obras que são o meio por meio dos qual glorificaremos o nome de Deus.
A estrutura dupla, como vimos anteriormente, que visa instruir os ouvintes quanto a esfera espiritual e terrena de nosso relacionamento com Deus, se desdobra em mandamentos e exortações de Cristo, a fim de que os agentes do Reino vivam de acordo com a justiça do Pai.
Elucidação
Claramente nas palavras de Cristo, a advertência contra a vanglória é uma marca constante. A exortação franca de Jesus sobre como os discípulos devem ser relacionar com o Pai celeste através da oração, demarca um princípio claro de distinção entre os agentes do Reino e os hipócritas.
Introduzindo a perspectiva apresentada por Cristo em relação ao que está sendo dito no trecho de 5 a 8 deste capítulo 6, Martin Lloyde-Jones faz uma observação quanto a pertinência da aplicação de Cristo e de sua advertência aqui:
Coisa alguma é tão enganadora quanto a noção de que o pecado só existe em termos de ações, pois enquanto imaginarmos o pecado somente em termos de erros realmente praticados, haveremos de falhar na justa compreensão do mesmo. A essência do ensino bíblico a respeito do pecado é que, no âmago, trata-se de uma disposição. Assim sendo, o pecado é um estado do coração. Suponho que podemos fazer o sumário do pecado asseverando que ele, em última análise, consiste em auto-adoração e em auto-adulação; e nosso Senhor mostra-nos que essa nossa tendência para a auto-adulação (o que para mim parece algo alarmante e aterrorizante) é algo que nos acompanha até à própria presença de Deus. Algumas vezes produz o resultado aqui aludido, isto é, que mesmo quando procuramos persuadir-nos de que estamos adorando a Deus, na realidade estamos adorando a nós mesmos, e nada mais.
O ponto em discussão recai exatamente sobre a disposição do coração pecador em buscar sua própria glória. Mais uma vez a procura por visibilidade destaca os mestres da lei como homens que nunca conheceram a salvação prometida desde do Antigo Testamento – a despeito de serem conhecedores da Lei, pelo menos no que tange ao texto – e que estava sendo cumprida através de Cristo Jesus, por meio da correção de ótica que este realiza a fim de que os discípulos possam viver de acordo com o que fora tencionado pelo Deus Triuno para a vida de seu povo, culminando na glorificação de seu nome. E da mesma forma como fora demonstrado nos versos de 1 a 4, a recompensa alcançada por tais homens no afã de promoverem uma falsa piedade através dos olhares de outrem, restringe-se apenas a isso: “se desejam ser vistos, fingindo serem o que não são, que seja assim, e nada além disso”: “Em verdade vos digo que eles já receberam a recompensa” (v. 5).
Os versos de 6 a 7 encerram duas outras aplicações de Cristo, as quais naturalmente podemos observar como resultantes de sua advertência contra uma postura vil que usa a oração para fins errôneos. Ambos os versos estabelecem contraste entre os agentes do Reino e os hipócritas. Para o verso 6, fica a evidência de que, enquanto os hipócritas procuram os lugares mais visíveis para orar, tendo em vista que distorceram o foco da oração – que deve estar voltado para Deus e não para nós mesmos – os filhos do Reino devem atentar-se para o Pai que vê em secreto, e dessa forma, a oração torna-se o exercício da intimidade com Deus, e não um instrumento de promoção pessoal. Quanto ao verso 7, há um desdobramento que pode alcançar dois alvos através de uma mesma exortação. Se a referência aos hipócritas feita por Cristo restringe-se apenas aos mestres da lei, então o termo ‘vãs repetições’ (gr. “βατταλογήσητε” trad.: “palavras repetidas” “gaguejar”) refere-se ao ato de suplicar de maneira excessiva e visível. Por outro lado, se alcança também os pagãos ou gentios, o termo alude ao ato de prestar orações a vários deuses, visando ser ouvido pelo montante de entidades solicitadas. Aplicando então esse duplo alcance, Cristo também reafirma o lugar de proeminência que Deus deve possuir em nosso coração, nos submetendo a sua vontade por meio da oração, como será demonstrado por ele na própria oração dominical.
Por fim, em detrimento dessa relação filial com o Pai, as necessidades são atendidas, numa que são conhecidas pelo SENHOR. Nesse caso as provisões derivam de um relacionamento íntimo com Deus, não desfrutado por aqueles a quem o Reino não fora revelado. Esse princípio será desenvolvido por Jesus ao tratar, na segunda seção deste capítulo 6 sobre nossas necessidades matérias, mas já é introduzido aqui para expor a relação de nosso tratamento para com Deus de maneira que ele é aquele em quem devemos depositar toda nossa confiança. A ênfase contra a vaidade é reiterada nessa introdução do verso 8: se é o Pai que conhece minhas necessidades, como poderemos orar de maneira hipócrita e leviana, achando que buscando a vaidade do olhar público, obteremos aquilo de que precisamos? Orando a Deus em secreto, expomos nossa dedicação resoluta em descansar na providência do Pai celeste.
Lendo essa passagem, o paralelo é claro com Lucas 18.10-14 na parábola que Cristo usa como demonstrativo da arrogância e altivez dos mestres da lei através do fariseu que arrogantemente ora “de si para si” (Lc 18.11), enquanto que um publicando reconhece sua inferioridade, e com humildade recorre ao Pai celeste em busca de perdão. Até mesmo nas respectivas recompensas que ambos recebem, o ensino exposto no texto aqui analisado é refletido: o fariseu não recebeu o perdão, mas foi notado por outros com a mesma postura arrogante e hipócrita. Enquanto o publicano, foi justificado pelo SENHOR, por ter reconhecido sua necessidade de arrependimento e perdão.
Certamente o princípio ensinado aqui por Cristo no tocante ao Reino dos céus é que a relação com o Pai deve refletir na glorificação de seu nome como foco principal de vida cristã, e não uma busca pessoal desenfreada por ser notado ou visto como "piedoso". Tal postura só demonstra uma natureza caída e corrompida pelo pecado, que está apartada de Deus. Expandindo a compreensão quanto as palavras de Cristo nesta seção do evangelho de Mateus, Sinclair Ferguson argumenta:
No contexto do Sermão do Monte, Jesus aponta uma razão totalmente diferente para a hipocrisia espiritual que Ele vê nos fariseus. Note que, em Mateus 6.1–18, Deus é chamado de “Pai” em dez ocasiões diferentes. Durante essa parte do sermão, nosso Senhor afirma que o verdadeiro problema com o coração do hipócrita é o desconhecer a Deus como seu Pai celestial! O homem embebido em hipocrisia é inseguro perante Deus e, portanto, busca segurança no que os demais pensam a seu respeito. Ele é falaz no portar-se diante dos homens, pois não tem um relacionamento verdadeiro com Deus.
Não podemos perder de vista que estamos lidando com o desvelamento do Reino dos céus, e que tal ação evidencia a profunda diferença e distinção entre aqueles a quem Cristo fora revelado e aqueles a quem não o foram: a oração é o instrumento dado por Deus para que nos relacionemos com ele, porém, sem ter consciência do que significar verdadeiramente orar, e “utilizando” tal instrumento para a promoção pessoal, demonstra-se a inexistência de qualquer ligação com o Pai celeste e com seu Filho, Jesus Cristo.
Na pergunta 178 do Breve Catecismo de Westminster, encontramos a seguinte definição de oração:
Que é oração?
Oração é um oferecimento de nossos desejos a Deus, em nome de Cristo e com o auxílio de seu Espírito, e com a confissão de nossos pecados e um grato reconhecimento de suas misericórdias.
Sob a ótica da Escritura e analisando essa resolução do Catecismo, podemos definir a oração como “a bússola do coração”, isto é, nossa compreensão da oração e para quem oramos guia nossos sentimentos e pensamentos, buscando extrair de tal fonte o consolo ou provisão para o que precisamos, não somente em termos materiais, mas também espirituais. Na oração, buscamos receber o auxílio de nosso Pai celeste, pois, iluminados pela revelação de Cristo Jesus nosso redentor, passa-se a compreender que a obtenção do socorro só será efetiva devido nossa relação filial com Deus. Estar de fora dessa relação inevitavelmente acarretará numa busca desenfreada e não orientada por uma satisfação que jamais será atendida, pois não tem o SENHOR como alvo.
Transição
A oração é o exercício de nossa relação com Deus por meio de Cristo. Guiados por Cristo nessas orientações, vemos o quanto a manifestação do Reino dos céus nos abençoa com a dispensação abundante das ricas bênçãos do SENHOR, que acolhe como filhos aqueles a quem ele chamou tão poderosamente em seu Filho, a fim de que esteja próximo deles, prometendo-lhes não somente um mundo novo e transformado na consumação dos tempos, mas o amparo e socorro nessa vida.
Além, disso o texto nos encoraja a aplicarmos essas verdades, seguindo os seguintes princípios:
Aplicações
1. A oração é a evidência de que pertencemos ao nosso Pai celeste.
Os mestres da lei nada tinham de filhos de Deus, porque não lhes foi exposto o Cristo que fora enviado a fim de redimir os pecados de seu povo eleito. Dessa forma, ficaram a margem da interpretação correta do Texto Sagrado que lhe indicava o caminho da oração como meio através do qual glorificam ao Pai. Assim, transformaram a oração num palanque de falsa piedade e arrogância, donde foram desmascarados por Jesus.
De igual sorte, devemos entender que a oração consiste na relação que temos para com Deus, entregando a ele nossos anseios e o bendizendo, como é cabido aos agentes do Reino. É através da oração que explicitamos a Deus nossas necessidades, não para informá-lo de algo que não sabe, pois Cristo disse exatamente o contrário, nossas demandas são conhecidas por Deus antes de as expormos a ele. Porém, o objetivo da oração em termos de nossas necessidades é que esperemos o auxílio do único que realmente tem o poder para atendê-las: Deus.
A oração estabelece uma comunicação mediada por Cristo com Deus o Pai, e tal privilégio foi confiado aqueles aos quais fora dado o poder de serem feitos filhos de Deus. Por isso, lançar mão dessa ferramenta não é simplesmente dizer do que precisamos ou desabafar nossas frustrações, mas o exercício diário e constante de nossa filiação com Deus.
2. Uma oração hipócrita e arrogante jamais terá êxito na comunicação com Deus.
Bem diz a Escritura: “Deus resiste aos soberbos, mas dá graça aos humildes” (Tiago 4:6). Um coração legalista que busca apenas promover-se como piedoso, recebe a garantia divina de que jamais será ouvido. Se a oração é o meio através do qual exercitamos nossa filiação para com Deus, não há muita estranheza em ver Cristo nos advertindo de que usar esse meio de graça para fins que ferem a determinação do Criador, acarretará juízo. E um dos mais severo castigos que pode recair sobre alguém, é não ser ouvido por Deus.
J. C. Ryle, comenta:
Em todos os nossos deveres, seja dar, seja orar, a questão fundamental que nunca deveríamos esquecer é que estamos tratando com um Deus que perscruta o coração e sabe todas as coisas. Tudo que seja mera formalidade, afetação ou que não provenha do coração é abominável e sem valor aos olhos de Deus. Ele não leva em conta com quanto dinheiro contribuímos, ou o número de palavras que usamos. O que realmente importa aos olhos de Deus é a natureza dos motivos e o estado do coração. Nosso Pai celeste “vê em secreto”. Que todos nós lembremos essas coisas! Eis aqui uma pedra que é a causa de naufrágio espiritual de muitas pessoas. Elas bajulam a si mesmas com o pensamento de que tudo deve estar certo com suas almas se ao menos desempenharem certa quantidade de deveres religiosos. Esquecem-se de que Deus não presta atenção à quantidade, mas, sim, à qualidade de nosso serviço. O favor divino não pode ser comprado, conforme alguns parecem supor, pela repetição formal de certo número de palavras, ou por justiça própria, pagando alguma quantia em dinheiro a uma instituição de caridade.
O único motivo que leva Deus a prestar atenção às nossas orações, é porque são mediadas pelo seu próprio Filho, Jesus Cristo. Por isso, exibir-se como piedoso, não somente na oração, mas em qualquer outra atividade ordenada por Deus através da qual exercitamos nossa espiritualidade, é inútil, pois tudo o que conseguiremos obter é o olhar dos homens e a rejeição do Criador.
Conclusão
Através de um coração humilde e sincero, recorremos a Deus como nosso Pai, e recebemos a promessa de que além de ouvidos, somos socorridos em nossas necessidades. A hipocrisia de uma oração arrogante por outro lado, nos levará a disciplina, executada pelo próprio SENHOR, pois no Reino dos céus, nenhum dos filhos do Pai é achado arrogante e orgulhoso sem que não lhe seja aplicada a vara da correção que mostra o caminho da humildade, enxertada em nós pelo próprio Espírito Santo, conformando-nos a imagem de Jesus Cristo.
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