O Jovem Rico
Série de mensagens expositivas com base no evangelho de Mateus
repentinamente, ali mesmo no caminho, enquanto Jesus e seus discípulos viajavam pela Pereia, veio um homem ao Mestre com uma pergunta que o consumia e por cuja resposta ele ansiava ardentemente. Era uma pergunta muito importante, tendo a ver com a salvação.
A pessoa que veio a Jesus tinha muitas coisas em seu favor:
Era rico, jovem e preeminente;
Limpo, preocupado e reverente.
Era rico (Mt 19.22), isto é, em possessões materiais e terrenas. Era jovem (Mt 19.20), provavelmente não contasse com mais de quarenta anos de idade, talvez muito mais jovem (ver CNT sobre 1 Timóteo 4.12). Era preeminente (Lc 18.18), sendo qualificado de “principal”, provavelmente um dos oficiais encarregados da sinagoga local (ver sobre Mt 9.18), um homem de elevada reputação. Isso era verdade com mais razão por ser ele limpo (Mt 19.20), um homem de excelente conduta externa, um indivíduo virtuoso. Era preocupado, ansioso. Ele tinha um problema em sua mente e coração. Não havia encontrado aquilo que pudesse dar descanso a sua alma. Estando ansioso em resolver o problema, “correu” para Jesus (Mc 10.17). Finalmente, era reverente, demonstrado pelo fato de que ele “se ajoelhou diante de” Jesus, como o indica a referência no Evangelho de Marcos.
Não sabemos até que ponto esse jovem entendia a natureza da “vida eterna”. Se “vida” significa resposta ativa de alguém ao ambiente, então vida eterna deve significar uma resposta ativa, interminável, ao melhor dos ambientes, a saber, o celestial. É comunhão com Deus (Jo 17.3). Outras belas descrições são: “o amor de Deus é derramado em nosso coração pelo Espírito Santo” (Rm 5.5), “a luz do conhecimento da glória de Deus na face de Jesus Cristo” (2Co 4.6), “a graça de Deus que excede a todo entendimento” (Fp 4.7) e “alegria indizível e cheia de glória” (1Pe 1.8). Vida eterna é outro nome para “salvação”.
Para a época de Jesus, a pergunta do jovem não é incomum. Perguntava ele pelo bem que deveria praticar além da simples observação das determinações legais. Quer fazer algo espontaneamente por amor e não apenas evitar transgressões. Quer passar do cumprimento dos mandamentos para ações positivas, para boas obras excedentes.
A réplica do jovem evidencia que ele entende a resposta de Jesus no contexto da religiosidade judaica. Esta havia transformado a lei num enorme número de mandamentos (613), de modo que se torna compreensível a nova pergunta: Quais mandamentos?
Pode surgir a seguinte pergunta: “Ao dar ao jovem essa ordem, porém, não estaria Jesus respaldando a doutrina da ‘salvação pelas boas obras’? Não teria sido suficiente dizer-lhe: ‘Confie em mim’?”. A resposta consiste em que “Confie completamente em mim” é precisamente o que o Senhor lhe estava dizendo, pois certamente sem plena confiança e total rendição àquele que estava emitindo a ordem ao jovem rico não era possível esperar que ele vendesse tudo o que tinha (Lc 18.22) e desse o produto aos pobres.
Jesus, fitando-o, amou esse jovem que se achava ajoelhado diante dele (Mc 10.21). Não só apreciou sua “preocupação por virtude e por boa conduta externa” (Cânones de Dort, Capítulos Terceiro e Quarto, artigo 4), mas também deve ter-se apiedado dele em virtude da luta que experimentava (Mt 9.36–38; 11.28). Jesus, porém, também sabia que havia algo terrivelmente errado com esse jovem rico e importante. Suas possessões materiais o haviam escravizado (ver v. 22,23). Na verdade, amava ele a seu próximo como a si mesmo? Não. Estaria ele realmente disposto a seguir todo o caminho para onde Deus, pela voz de Jesus Cristo, o dirigisse? Não estava, como é óbvio à luz do que se segue
O erro do jovem não era que ele não tivesse reconhecido suas transgressões, mas que ele não compreendeu a interpretação da lei feita por Jesus, tal como se depreende do sermão do Monte. Não compreendeu que Deus não exige ações isoladas que o ser humano pudesse apresentar, porém quer a pessoa toda, incluindo seus pensamentos, palavras e ações. Quando reconhecemos essa unidade de todo o cap. 19, de como Jesus na questão do matrimônio, e também ao abençoar as crianças, bem como agora na atitude perante os bens, exige a entrega total a ele como o Senhor, somente então entenderemos o desafio que ele faz ao jovem
Esse era o teste. Se o suportasse, teria um “tesouro no céu”. A referência é a todas as bênçãos de caráter celestial que em medida plena estão reservadas no céu aos filhos de Deus, e das quais nos é permitido provar um pouco por antecipação, mesmo agora.
É importante observar que Jesus acrescentou: e vem e segue-me. Esse “seguir”, que devia ser acompanhado por um testemunho ativo e preparação para o mesmo, implica que o jovem deve aprender a “negar-se a si mesmo e tomar sua cruz” (16.24), e assim não mais seria capaz de devotar-se ao serviço de Mamom. A resposta foi trágica:
O jovem “tinha muitas propriedades”. Ele as possuía; elas o possuíam, tinham se apoderado firmemente dele.
Segundo a Escritura, a dois homens se pediu que fizessem um sacrifício. Um foi Abraão (Gn 22.1,2); o outro, o jovem rico. O sacrifício que se pediu a Abraão foi muitíssimo maior. Por meio de sua boa vontade de fazer o sacrifício, Abraão demonstrou o genuíno caráter de sua fé. “Creu em Jeová, e isso lhe foi imputado para justiça” (Gn 15.6; cf. Tg 2.21–23). O jovem rico, embora lhe fosse pedido que fizesse um sacrifício muito menor, mas ainda um sacrifício considerável, recusou, com isso provando que não tinha a fé pela qual se aceita a salvação como um dom gratuito de Deus. Abraão colocou sua confiança em Deus; o jovem, em suas riquezas. Essa foi a diferença. Ver 1 Timóteo 6.17.