Ética Cristã
Um pouco sobre o cristianismo :
Fundamento da ética cristã :
No âmago da ética cristã, há a convicção de que a base inabalável para conhecermos o verdadeiro, o bom e o correto é a revelação divina
Não estou sugerindo que Deus nos deu um livro de normas que é tão detalhado em seus preceitos, que todas as decisões éticas são fáceis
Deus não nos deu instruções específicas para cada e toda questão ética com que nos deparamos, mas também não somos deixados a tatear na escuridão e a tomar nossas decisões com base em mera opinião
Jesus no sermão do monte :
“Jesus não diz que a ira conduz ao homicídio, mas sim que a ira é uma forma de homicídio”
Considere o exemplo de uma pessoa que dirige seu automóvel no contexto de limite de velocidade permitida. Uma pessoa sai em viagem de uma cidade para outra, passando por diversas zonas de diferentes velocidades permitidas. Para trafegar numa rodovia, a velocidade máxima é estabelecida em 110 km/h. Para trafegar numa zona de escolas em uma cidade, a velocidade máxima cai para 40 km/h. Suponha que o motorista tenha uma preferência por guiar seu veículo a uma velocidade de 110 km/h. Ele dirige permanentemente à velocidade que prefere. Enquanto trafega pela rodovia, sua atividade é observada pela polícia rodoviária, que verifica estar ele dirigindo em conformidade com as exigências da lei, dando a aparência de motorista modelo e de cidadão correto e obediente. No entanto, ele está obedecendo à lei não porque tem interesse pela segurança e bem-estar dos outros ou porque seu motivo é ser civilmente obediente, mas apenas porque gosta de dirigir seu carro a 110 km/h. Esta preferência é notada quando ele guia seu carro pela zona escolar e continua com o acelerador pressionado, mantendo a velocidade de 110 km/h. Agora, ele exerce sua preferência, tornando-se um perigo evidente, uma ameaça, para crianças que andam pela zona escolar. Ele está dirigindo 70 km/h acima da velocidade permitida. Sua obediência exterior à lei desaparece quando a lei conflita com seus desejos.
A interpretação de Jesus sobre o adultério (5.27–30)
Depois de tratar do sexto mandamento, Jesus volta sua atenção, agora, para o sétimo mandamento. Os rabinos limitavam o adultério apenas à infidelidade sexual. Jesus, porém, amplia o significado desse pecado para o olhar lascivo e o coração impuro. Embora os homens não possam julgar o olhar adúltero e o coração impuro, Deus, que sonda os corações, condena a intenção como se pecado consumado fosse. Não basta ir para a cama do adultério para quebrar o sétimo mandamento; basta ter a intenção de arrastar para a cama a pessoa ilicitamente desejada.
Concordo com Warren Wiersbe quando ele diz que o desejo e a prática não são idênticos, mas, em termos espirituais, equivalentes. O “olhar” que Jesus menciona não é apenas casual e de relance; antes, é um olhar fixo e demorado, com propósitos lascivos. Portanto, o homem descrito por Jesus olha para a mulher com o propósito de alimentar seus apetites sexuais interiores, como um substituto para o ato sexual em si. Não é uma situação acidental, mas um ato planejado.
O homem é um ser em conflito. É uma guerra civil ambulante. Há uma luta constante entre o espírito e a carne. O velho homem está sempre querendo erguer sua fronte para nos arrastar para o pecado. Platão compara a alma a um carro guiado por dois cavalos. Um dos cavalos, manso e dócil, obedece às rédeas e à voz do condutor. O outro, selvagem, ainda não domesticado, procura a todo tempo rebelar-se. O nome do primeiro cavalo é “razão”; o nome do segundo é “paixão”. A vida é sempre um conflito entre as exigências da paixão e o controle da razão.
Como lidar com os pecados da impureza? Jesus adota um tratamento radical, e não gradual. É claro que ele não defende a amputação física do olho direito e da mão direita, mas a amputação moral, uma cirurgia espiritual. Jesus não está ordenando a mutilação do corpo, mas o controle do corpo para não se render ao pecado. Não se faz concessão ao pecado. Nessa mesma linha de pensamento, Mounce escreve: “Jesus não está ensinando uma doutrina masoquista de automutilação com objetivos espirituais, tampouco está sugerindo que o caminho para resolver o problema dos maus desejos é infligir cirurgia física radical”. A vitória nessa área não é resistir, mas fugir! Aquele que está sendo tentado nessa área sexual deve deixar de olhar e deve deixar de manusear. R. C. Sproul está correto quando diz: “Um problema radical exige uma solução radical”.15 Diz a lenda grega que Ulisses, enquanto voltava de Troia para casa em seu navio, foi amarrado ao mastro para evitar a tentação do canto das sereias. Ele estava ciente da facilidade com que poderia se desviar e levar o barco à ruína. Às vezes, esse tipo de ação radical é necessário.
A. T. Robertson destaca que a expressão “te faz tropeçar” significa “armar uma armadilha”. Significa a haste na armadilha que salta e a fecha, quando o animal a toca. Trata-se da lingueta do alçapão. Mounce corrobora essa ideia ao escrever: “Essa armadilha é provida de isca e uma tampa que, detonada, fecha a armadilha prendendo o incauto animal. Há muita ironia em que o olho, supostamente criado para prevenir as quedas, venha a tornar-se o skandalon causador do tropeço”.
A interpretação de Jesus sobre o homicídio (5.21–26)
R. C. Sproul ajuda-nos a compreender essa passagem, quando escreve:
Os rabinos acreditavam que o mandamento para não matar era cumprido quando não se cometia assassinato em primeiro grau, mas Jesus mostra que este mandamento é muito mais profundo do que o ato externo de homicídio. Cristo indica que a lei foi dada por intermédio de Moisés de forma elíptica – isto é, nem todo o conteúdo inerente ao mandamento foi expresso em palavras. Sempre que nos deparamos com três ou quatro pontos no meio de uma frase ou um parágrafo, isto indica que determinado conteúdo foi deliberadamente deixado de fora. Estes pontos são chamados de “elipses”. Quando há elipses na lei, isto significa que, além da proibição específica, a lei também proíbe o contexto mais amplo relacionado ao ato em questão. Assim, quando Deus diz que não devemos matar, isto consequentemente significa que nós não devemos fazer qualquer coisa que prejudique a vida do próximo. O homicídio começa com raiva e ódio sem motivo, incluindo ofensas, calúnias e desavenças entre pessoas. É por isso que Jesus disse que ninguém escapa do peso da lei simplesmente abstendo-se do assassinato em si […]. O outro aspecto da elipse é este: mesmo sem afirmá-lo, a lei ordena o contrário daquilo que proíbe e proíbe o contrário daquilo que ordena. Portanto, Jesus está dizendo aqui que, além de não devermos jamais matar o próximo por causa da importância da vida humana, também devemos promover a segurança, o bem-estar e a santidade da vida.
O que foi dito aos antigos não é a lei, porque sempre que a Palavra de Deus está em destaque, lê-se: “Está escrito, assim diz o Senhor”. O que está, portanto, em relevo aqui com a expressão: “Ouvistes o que foi dito aos antigos” é a interpretação dos rabinos acerca do sexto mandamento. Estes reduziam o significado da proibição divina apenas ao ato do homicídio. Também atenuavam a penalidade da transgressão dizendo que “quem matar está sujeito a julgamento”.
Jesus amplia a abrangência do pecado, destacando que a ira, o insulto e as palavras de desprezo implicam a quebra do sexto mandamento (5.22). Jesus aqui assume um tom de superioridade em relação aos regulamentos mosaicos e aos seus intérpretes. Ele vai mais fundo, ao próprio âmago da questão. Ele encontra o princípio por trás do preceito e o endossa. Warren Wiersbe está correto quando interpreta: “Jesus não diz que a ira conduz ao homicídio, mas sim que a ira é uma forma de homicídio”. Robert Mounce destaca que a cólera que Jesus menciona aqui é orge, uma fúria interna que se multiplica, em comparação com thymos, uma fúria passageira.
Os rabinos limitavam o sexto mandamento ao ato do homicídio; Jesus, porém, deixa claro que o espírito da lei se liga não apenas ao ato, mas também à motivação. A lei perscruta não apenas as ações exteriores, mas também as motivações interiores. Embora os tribunais da terra não tenham competência para julgar a ira e palavras insultuosas, o tribunal de Deus julga o foro íntimo. Daremos contas a Deus não apenas de nossos atos, mas também de nossas palavras e intenções.
O insulto proferido aqui, traduzido em algumas versões por raca (5.22), tem origem aramaica e significa “eu cuspo em você”. Corroborando essa ideia, Lawrence Richards diz que “raca” vem da palavra aramaica rak, que significa “cuspir”. Barclay acrescenta que chamar alguém de “raca” era o mesmo que chamá-lo de estúpido, idiota, imprestável.7 E o mesmo autor ressalta:
A ira persistente é má; piores ainda são as palavras de desprezo, mas o pior de tudo é a malícia que destrói o bom nome do próximo. O homem que é escravo de sua ira, e se dirige ao próximo com palavras de desprezo, destruindo seu bom nome, pode nunca ter assassinado alguém, mas em seu coração é um assassino.
O termo “inferno de fogo” advém de uma ravina ao sul de Jerusalém, nos dias de Jesus, chamada vale de Hinom, onde se atirava o lixo da cidade e onde o fogo não se apagava. Antes, era o lugar no qual os cananeus queimavam seus filhos em sacrifício a Moloque (1Rs 11.7). A geena tornou-se o símbolo do castigo futuro.
Jesus ilustra sua correta interpretação da lei com dois exemplos: um da vida religiosa e outro da vida comercial. A oferta agradável a Deus precisa vir de alguém que tenha o coração livre de ofensa e mágoa. Reconciliar-se com os desafetos deve preceder a oferta no altar. Primeiro Deus aceita a vida do adorador e depois sua oferta. Spurgeon diz que a regra aqui é: primeiro as pazes com o homem e depois a aceitação de Deus.
De igual modo, Jesus mostra que uma demanda judicial por causa de uma dívida deve ser resolvida antes que essa pugna seja levada ao tribunal. Tanto o perdão quanto a reparação precisam ser feitas com pressa, a fim de que tenhamos paz com Deus e com o próximo. Warren Wiersbe diz que a pessoa que se recusa a perdoar seu irmão está destruindo a mesma ponte sobre a qual precisa andar.