Mateus 9.9-13

Série expositiva no Evangelho de Mateus  •  Sermon  •  Submitted
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O autor explora o chamamento de Mateus para expor a realidade de que o Evangelho do Reino não possui limites étnicos ou sociais, mas que o Messias veio para salvar os eleitos da única condição que os aliena de Deus: o pecado.

Notes
Transcript
“[...] Porque é chegado o Reino dos céus” (Mateus 3.2).
Pr. Paulo Ulisses
Introdução
Desenvolvendo mais uma narrativa que expande essa terceira seção do evangelho de Mateus em que demonstra a autoridade de Cristo, agora o evangelista trabalha tópicos peculiares dessa autoridade, como por exemplo, a reação de alguns grupos específicos (e. g. o povo - vs. 1-9; os fariseus 10-13 etc.) diante do poder e excelência do Senhor Jesus.
Após ter declarado a autoridade de Jesus para perdoar pecados, Mateus preocupa-se em transmitir a universalidade desse poder, isto é, o alcance da jurisdição do perdão que Cristo confere. Assim a presente seção destina-se a elucidar o alcance do poder remidor de Cristo.
Elucidação
O chamado de Mateus ((cf. 10.3)ou Levi segundo Marcos 2.15-17 e Lc 5.29-32) introduz a temática da bênção salvadora abranger eleitos de várias nações além dos limites de Israel, transformando-os em agentes do Reino. A apresentação desse episódio antes da narrativa seguinte, em que Cristo come com publicanos, serve como foco elucidativo que demarca o sentido único de relatar que aquele poder para perdoar pecados (cf. 9.1-8) não está restrito apenas à nação judaica.
Novamente o autor registra a movimentação geográfica de Cristo: "partindo Jesus dali..." que demarca o início de uma nova seção, embora a temática ainda conecte-se à narrativa anterior. A ênfase dada pelo evangelista ao tratar sua tese reside na brevidade deste primeiro relato. O resumo de informações, desta feita, não serve para escrever apenas dados complementares, mas para chamar a atenção para pontos cruciais que serão usados posteriormente como sua base argumentativa.
Não há apresentações do personagem com o qual Cristo fala, exceto sua profissão: "viu um homem chamado Mateus sentado na coletoria" (v. 9). É possível que a objetividade do relato por parte do autor - que aparece na narrativa em questão - seja a de não chamar atenção desnecessária para si mesmo, ou de identificar-se de maneira indevida (i.e. arrogante ou presunçosa); o que o autor deseja é apenas notar que Cristo e o homem encontram-se em situações opostas ou complexas. A repetição da informação designativa para Mateus como "o publicano" encontrada em 10.3, reproduz o modo como era visto: um traidor, numa que sendo judeu, trabalhava para império romano, como veremos mais acurada adiante.
Seu chamamento é tão breve quanto sua apresentação: "e disse-lhe: segue-me!". O imperativo registrado pelo autor, demonstra também a intenção de quem o convoca: a expressão "Ἀκολούθει μοι" (gr. lit. "segue-me") possui a conotação de "juntar-se a alguém como um discípulo, tornar-se ou ser discípulo " (STRONG, 2002). Assim, Cristo o estava chamando não apenas para segui-lo geograficamente, mas, a despeito de ser um publicano, o desejo do Senhor é torná-lo um agente do reino.
A estranheza causada pelo contato de Cristo como um coletor de impostos nos fariseus, consistia em uma aversão regida por dois fatores: 1) "Os coletores de impostos judeus que sobrecarregavam seus conterrâneos eram especialmente desprezados. Os judeus viam esse favor para Roma como traição e igual à traição contra Deus" (MILLER, 2020). E 2) "Os líderes religiosos judeus desprezavam particularmente os cobradores de impostos (Mt 9:11; 11:19; Lc 5:30; 7:34), considerando-os cerimonialmente impuros, excluindo-os das atividades religiosas" (MILLER, 2020).
A quebra desses paradigmas, conforme narrada por esta seção de seu evangelho, faz como que o anúncio da salvação alcance proporções impensadas pelos expectadores daquela cena, especialmente, de acordo com o complemento da narrativa.
As palavras usadas para caracterizar os participantes da refeição que foram criticados pelos fariseus, configuram-se um paralelismo sinonímico. O qualificativo equivalente serve para reforçar uma mesma ideia quanto a como eram vistas as pessoas com quem Cristo comia: "publicanos" (gr. "τελῶναι") e "pecadores" (gr. "ἁμαρτωλοὶ"). Ambos os adjetivos correspondem à imagem criada pelos fariseus quanto a trabalho daqueles homens. Os termos apontam para uma única ideia: são pessoas consideradas indignas de Deus ou de sua ação graciosa; eram tão somente vistas como traidoras, ou pecadoras, embora muitos poderiam de fato ser homens cruéis que impunham pesadas cargas tributárias sobre o povo.
O contexto da ocasião é o banquete oferecido por Mateus em sua casa (cf. ref. gr. "ἐγένετο αὐτοῦ ἀνακειμένου ἐν τῇ οἰκίᾳ" = "estando ele sentado à 'sua' (de Mateus) mesa em casa"), para o qual foram convidados Cristo e seus discípulos (v. 10), e os tais "publicanos"; provavelmente, amigos de trabalho ou conhecidos do anfitrião. Como já demonstrado, os que trabalhavam para o Estado Romano eram mal vistos e desprezados. Embora os fariseus divergissem da doutrina de Jesus, admitiam que ele era um mestre religioso, e assim, indagaram os discípulos quanto ao porquê de ele aceitar estar na presença daquelas pessoas.
Para responder a esse questionamento, Cristo usa uma combinação de figuras de linguagem (i.e. metáfora e ironia) através das quais revela o motivo de estar ali: "Os são não precisam de médico, e sim os doentes" (v.12). Assim como Mateus apresentou a caracterização sua e de seus convidados que desagradavam os fariseus por meio de adjetivos, ele registra agora a resposta de Jesus, que também usou adjetivos metaforizando a situação espiritual de seus interlocutores. Os "sãos" a que se refere o Senhor, seriam os que se achavam acima dos publicanos, especialmente os fariseus. Tinham eles a ideia de que já atingiram a perfeição ou plena santidade, sentindo-se superiores em relação às demais pessoas presentes. Os "doentes" por outro lado, eram justamente os publicanos, que estavam distantes do Reino por ainda não terem recebido a salvação através do Messias.
É válido destacar que em momento algum Cristo está concordando que os fariseus eram salvos ou "sãos"; a ironia se encontra exatamente em confrontá-los usando sua própria arrogância contra eles mesmo. Jesus seria o médico, enviado para curar os males de todo aquele que haveria de ser chamado ao Reino dos céus, reconhecendo-o como única porta de acesso a este.
A réplica de Cristo é aumentada pela citação do texto de Oséias 6.6. O oráculo profético inicia uma série de menções à restauração do povo de Israel ao SENHOR, admoestando-os ao arrependimento e à uma prática cúltica sincera; não hipócrita ou superficial, que age pela simples obrigação.
É nesse momento que Oseias profere a palavra do SENHOR, que conclama o povo ao amor pactual (Os 6.4) à Deus: "Pois misericórdia quero, e não sacrifício, e o conhecimento de Deus, mais do que holocaustos (Os 6.6 - Mt 9.13). Bruce Waltke comentando o texto de Oseias afirma: "O que consistentemente faltava na disposição do povo era a orientação básica do coração para um amor fiel que é o que Deus quer/"considera aceitável"" (WALTKE, 2015, p.201).
Assim, Cristo cita a passagem de Oseias aplicando àquele contexto, a fim de constatar a ideia de que os fariseus estavam mais preocupados com ritos externos - ritos que eles distorciam para promoção própria - do que com o anúncio da graça salvadora através do conhecimento do Deus Todo-poderoso aos homens, não importando qual era sua situação social ou étnica. O substrato dessa lógica é a noção de que Deus não estava anulando o sistema sacrificial estipulado desde Moisés, mas fazendo com que o povo enxergasse a razão motivadora explicitada através dos sacrifícios: a ação salvadora de Deus que redime seu povo das suas iniquidades e pecados.
Essa purificação é executada por Cristo, quando apresenta-se no verso 13 como aquele que não veio chamar "justos" ao arrependimento, e sim pecadores. O Senhor estava assentado tomando parte naquela refeição na casa de pecadores, porque foi enviado exatamente para salvar os pecadores. Além disso, fica claro que não há barreiras ou limites para o evangelho: pessoas de todas as condições sociais, bem ou mal vistas por outros, sendo sinceramente chamadas ao arrependimento, experimentarão a cura e de seus males, e receberão o perdão para seus pecados, sendo chamados para serem agentes do Reino, assim como Mateus o foi.
Transição
Explicando o texto de Mateus 9.13, onde vemos o claro objetivo da vinda de Cristo a este mundo, William Hendriksen enfatiza:
Aqui em Mateus 9.13, o glorioso propósito da encarnação e missão de Cristo recebe bela expressão. A passagem evidencia que não é aos que se consideram dignos, mas, antes, aos que se encontram em desesperadora necessidade que o convite da salvação se estende, pleno e gratuito. Jesus veio salvar foi a pecadores, perdidos, extraviados, miseráveis, sobrecarregados, famintos, sedentos (HENDRIKSEN, 2010, p. 527).
Em face disso, o texto de Mateus 9.9-13 demonstra o poder e autoridade de Cristo, como o enviado da parte do Pai para resgatar o que se havia perdido. Para reabrir o caminho de acesso ao SENHOR, através de seu ministério. Assim, o evangelista expõe a amplitude desse poder, agora enfatizando que não barreias étnicas ou sociais que possam impedir que o chamamento à salvação seja eficaz.
Observemos então, esses princípios a partir de algumas aplicações desse texto às nossas vidas.
Aplicações
1. O chamamento divino é poderoso para nos tirar de nosso estado de indiferença quanto ao Reino.
Ao deparar-se com Mateus, Cristo emite uma ordem "Segue-me!". Esse imperativo figura não somente o convite de Cristo para ser seu discípulo, algo que será enfatizado pelo autor mais adiante, mas demonstra o poder do Messias de que retirar o homem pecador de seu estado de alienação do Reino.
Através de seu poder redentivo, Cristo nos chamou de nossa escuridão, de nossa indiferença à ele, dando-nos o poder de sermos feitos filhos de Deus. Em adição a isso, devemos entender que o poder de resposta está ligado não à nossa vontade, mas a força e autoridade daquele que chama. No evangelho de Lucas, o registro da reação de Mateus é ainda mais enfático: "Ele se levantou e, deixando tudo, o seguiu (Lc 5.28).
Para a glória de Deus, a entrada no Reino não depende de uma inclinação nossa ao seu convite, pois em nós nenhuma capacidade há para fazer tal escolha. Mas, mediante o poder remidor de nosso SENHOR, o Espírito produziu em nós a fé para que pudêssemos, assim como Mateus, dar às costas ao pecado, seguindo a Cristo.
2. Não há barreiras para o evangelho, e por isso, devemos nos guardar do elitismo legalista.
Os fariseus achavam-se superiores em detrimento dos publicanos, e por isso, nutriam em seus corações um sentimento elitista, através do qual julgavam quem estaria apto a ser filho de Deus ou não. Baseados em suas próprias convicções ou perspectivas, tais homens condenavam, de acordo suas próprias razões, os “indignos” à perdição sumariamente.
Por vezes, apesar de em nossa mente termos a ideia de que a salvação é uma graça que ninguém (inclusive nós) merece, agimos da mesma forma que os fariseus. Este texto e semelhantes, são usados por muitos para licenciar o pecado, quando afirmam que “Cristo comia com pecadores”. Isso é fato, como notamos, porém, estar com pecadores não significa aceitar seu pecado. Além disso, Cristo sempre lhes expunha a luz do Evangelho, para que cressem e fossem trazidos ao Reino.
Entretanto, o ponto focal do texto é demonstrar que Cristo não fez acepção de pessoas. Ele não procurou apenas os ricos, os "morais", ou em suas próprias palavras, os "sãos", e os doentes. Isso nos aponta a verdade de que o Reino dos céus não faz distinção entre homens e homens, a partir de algum tipo de condição em que estejam, mas unicamente pela soberania divina que escolheu uns para salvação e outros para a condenação.
Não podemos cair no mesmo erro dos fariseus, fechando a porta do evangelho a todos quantos o Espírito Santo chamar, independentemente de sua atual situação. Se de repente, por aquelas portas adentrasse um travesti, ou um homossexual, ou um ladrão, um mendigo etc, qual seria nossa reação? mudaríamos de lugar? sentiríamos nojo e nos afastaríamos? Precisamos estar prontos como agentes do Reino, à publicar essa mesma verdade que encontramos no Evangelho de Mateus: que Cristo veio ao mundo para salvar pecadores, independentemente de qual é o seu pecado, pois não há pecado tão cruel ou vil que não possa ser lavado pelo sangue de Cristo.
Conclusão
Os fariseus julgavam que os publicanos estavam à margem da sociedade judaica, e por isso, os repudiavam. Mal sabiam que eram eles que estavam à margem do Reino, assim como nós um dia estivemos.
Não fazendo acepção de pessoa, Cristo nos tirou dos mais diversos buracos do pecado, e nos transportou para o seu Reino, donde recebemos a dádiva de sermos seus discípulos.
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