Mateus 10.5-15

Série expositiva no Evangelho de Mateus  •  Sermon  •  Submitted
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O autor registra as instruções de Cristo aos doze apóstolos, que são usados por ele como representação de todo aquele que foi chamado ao Reino como seu agente, enfatizando assim a correlação entre os discipulos e seu público, intensificando as exortações do Senhor Jesus como diretrizes para o anúncio do Reino dos céus.

Notes
Transcript
“[...] Porque é chegado o Reino dos céus” (Mateus 3.2).
Pr. Paulo Ulisses
Introdução
Após a exposição do princípio da missão evangélica como parte do chamado ao Reino dos céus, e através disso, tendo o autor exibido Cristo como sendo o profeta/pastor prometido ao seu povo por Deus, o Pai, segundo profetizado ao longo do Antigo Testamento, agora o evangelista Mateus passa a narrar as instruções e diretrizes concedidas pelo Senhor Jesus aos doze, como normas através das quais executarão o chamado que receberam.
É interessante notar que, através dos doze apóstolos, o autor está caracterizando a própria igreja à qual se dirige (e por implicação, toda a igreja de Cristo), conectando seu público aos próprios discípulos, fazendo com que as exortações recebidas por estes, também guiem o trabalho a ser executado por todos os agentes do Reino.
Em face disso, a noção central da presente seção (i.e. Mateus 10.5-15) enfatiza as diretrizes para o anúncio do Reino dos céus.
Elucidação
O texto inicia-se com uma constatação: após publicar os nomes daqueles que seriam os principais porta-vozes do Reino, Cristo passa a exercer aquela autoridade que o próprio evangelista advogou que ele possuía, instruindo-os quanto a como operar essa apologia.
Observando a própria lógica e estrutura da narrativa, é notório um arquétipo que molda estas primeiras considerações em torno de três pontos básicos: os versículos de 5 à 8, concentram-se no público-alvo dos discípulos: a quem deveriam pregar o evangelho do Reino. Nos versículos 9 e 10, Cristo os exorta quanto a dependência da divina providência para o exercício da missão. E por fim, dos versículos 11 à 15, com base nessa mesma dependência, o Senhor Jesus enfatiza o princípio da efetividade da obra evangelística: como enviados do SENHOR, ele deveriam ater-se ao trabalho, sabendo que sendo recebidos ou não, o nome de Cristo seria glorificado. Vejamos cada um desses princípios de maneira pormenorizada.
1. A quem pregar o Reino dos céus (vs. 5-8).
Neste primeiro momento Cristo exorta seus discípulos a pregarem o evangelho do Reino "as ovelhas perdidas da casa de Israel" (v.5). Entendendo esta expressão à luz do contexto anterior, em que o autor havia demonstrado que a porta da graça estava aberta a todos os eleitos, sem qualquer restrição quanto a condição social ou outros fatores terrenos, esta determinação do Senhor Jesus é melhor compreendida como uma ordem preparatória, isto é, a salvação não era direcionada apenas aos judeus, mas nesse momento inicial, em face de seu primeiro envio, Cristo exorta seus discípulos a primeiro pregarem dentro dos limites da nação de Israel, anunciando-lhes o arrependimento e a chegada do Reino (v.7).
Em que pese esse princípio, a noção de destaque do texto consiste na razão para a transmissão da mensagem divina: "Curai enfermos, ressuscitai mortos, purificai leprosos, expeli demônios; `de graça recebestes, de graça dai`" (v.8). Como agentes do Reino, tendo primeiro sido testemunhas da revelação da salvação através de Cristo, o próprio Senhor lembra a seus apóstolos de que não houve qualquer mérito neles que de repente pudesse ter proporcionado a comunicação do Evangelho. Como dito antes, o dom da redenção é direcionado a homens caídos, manchados pelo pecado e corrompidos em sua natureza. Não pode haver, portanto, qualquer coisa a ser feita a fim de que, por correspondência, o poder salvador do Messias seja concedido a alguém. Obras, recursos, riquezas, nada pode adquirir a salvação, senão a própria graça que, de graça, isto é, sem custo algum para quem a recebe, o traz ao Reino.
2. A dependência da divina providência para o exercício da missão (vs. 9-10).
Ampliando as considerações que está fazendo em relação ao anúncio do Reino, nesta segunda seção Cristo aborda o princípio da completa dependência de Deus para a realização de tal tarefa, confiando plenamente no próprio Pai celeste, que proveria o necessário para que os apóstolos a realizassem. As provisões, antes de demonstrarem alguma preparação ou precavimento, indicariam na verdade tanto algum apego a essas coisas como sendo condições básicas para que alguém pregasse o evangelho (quando, na verdade, não o são, pois a necessidade do anúncio não está relacionada às condições materiais, e sim espirituais, tanto de quem prega quanto de quem ouve (cf. ponto 1)), quanto uma desconfiança em relação à origem da mensagem, pois, se o evangelho provém de fato da parte do Deus Triuno, e ele é o maior interessando em que essa mensagem alcance os eleitos, porque não providenciaria que os agentes do Reino fossem supridos do que é necessário para executarem suas ordens?
Assim, há um comando direto de Cristo aos discípulos, enfatizando para eles que não tomassem qualquer tipo de provimento em sua viagem evangelística: "Não vos provereis de ouro, nem de prata, nem de cobre nos vossos cintos, nem de alforje para o caminho, nem de duas túnicas" (v. 9), e a razão para isso é muito simples: "digno é o trabalhador do seu alimento" (v.10). Se no mundo dos homens, um trabalhador recebe o que lhe é devido, muito mais no Reino do céus o Pai celeste certamente fará com que o curso de seus planos de publicação de seu Reino seja bem-sucedido, promovendo o atendimento das demandas daqueles que realizam o seu trabalho.
Este princípio encontra guarida particular no público para o qual Mateus está escrevendo. Os crentes em Roma, sofrendo intensa perseguição, tendo seus bens tirados, sendo humilhados, presos e até mortos por causa do Evangelho, poderiam se sentir tentados a pensar duas vezes antes de se submeter às determinações de Cristo quanto ao anúncio do Reino: que garantias tinham de que, obedecendo à ordem divina de anunciar aos perdidos (inclusive aos seus detratores e algozes) a mensagem de salvação, não perderiam tudo o que têm, ficando numa situação pior do que antes, quando não haviam conhecido a Cristo?
O Senhor Jesus sinaliza que o cuidado do Pai Eterno para com seus filhos, incluí também o conhecimento de que possuem necessidades específicas (cf. Mt 6.31-32), e que o atendimento dessas demandas está diretamente ligado ao avanço do Reino, não de maneira intrínseca, como se o evangelho dependesse de alforjes recheados de ouro ou prata, mas por causa dos seus agentes. Assim, a confiança de todo eleito de Deus que anuncia a obra da salvação em Cristo, deve estar voltada para a graça de Deus em cuidar de seus filhos, promovendo que todos os eleitos alcancem a redenção executada por Cristo, o que acontecerá através da obediência dos crentes ao chamado do Mestre.
3. A efetividade da obra evangelística (vs.11-15).
Ligado a este segundo ponto, Jesus intensifica sua exortação, voltando-se agora à um ponto mais específico dessa dependência do Pai para o cumprimento da obra de publicação do Reino: sua efetividade. Sendo enviados para as cidades de Israel, Cristo alerta os apóstolo para o fato de que o recebimento deles como enviados da parte do Messias, poderia ser caloroso ou não. Muitos poderiam recebê-los e ouvi-los, outros porém, resistiriam à pregação, rejeitando os embaixadores do Rei.
Cristo desperta o entendimento dos discípulos para compreenderem que a efetividade ou eficácia da mensagem do Evangelho não depende deles, e sim do poder do Espírito em regenerar o coração dos que ouvem, para que então possam receber a Cristo Jesus como seu redentor enviado da parte do Pai. Assim: "Se alguém não vos receber, nem ouvir as vossas palavras, ao sairdes daquela casa ou daquela cidade, sacudi o pó dos vossos pés" (v.14). Essa expressão aponta para um costume corriqueiro da época de Cristo, que significava um desligamento de compromisso, seria o equivalente ao "lavar as mãos" no ocidente, um indicativo de que, tendo os discípulos pregado o evangelho, frente ao descaso, não tinham mais qualquer obrigação para com aquele indivíduo.
O chamado eficaz à salvação não faz parte do ministério cristão de evangelização; é uma prerrogativa exclusiva de Deus, o Espírito Santo, que, tendo determinado que o anúncio da Palavra de Deus seria o meio através do qual agiria no coração do homem (cf. Rm 9.17), livremente chama os eleitos à fé e aplica sobre eles a obra de Cristo, publicando sua salvação. É para essa dinâmica que o Senhor Jesus está exortando seus discípulos, e Mateus, o seu público: mesmo diante da perseguição, cenário que poderia fazê-los pensar que seriam sumariamente rejeitados em Roma, os crentes naquela cidade deveriam, confiando no poder do Evangelho, anunciar Cristo ao mundo, sabendo que, caso fossem rejeitados haveria "menos rigor para Sodoma e Gomorra, no Dia do Juízo, do que para aquela cidade" (v.15).
O contexto das passagens paralelas a Mateus 10.5-15 nos demais evangelhos, reforçam as perspectivas encontradas no Texto de Mateus 10.5-15.
No relato de Marcos 6.1-6, Cristo, ao ter pregado o evangelho em sua cidade é rejeitado. Este contexto anterior, enfatiza a autoridade de Jesus ao enviar apóstolos, contrastando esse episódio ao anterior, isto é, mesmo tendo sido rejeitado, o Messias prova sua identidade ao enviar seus arautos, tendo lhes dito que "não há profeta sem honra, senão na sua terra, entre os seus parentes e na sua casa" (Mc 6.4). Mesmo sendo o Filho de Deus, aqueles à quem não fora comunicado poder para crer, no máximo o viram como "o carpinteiro, filho de Maria, irmão de Tiago, José, Judas e Simão (Mc 6.3). Este contexto conecta-se ao relato de Mateus como um exemplo: se rejeitaram o próprio Filho de Deus no anúncio do próprio Evangelho, do mesmo modo rejeitariam seus discípulos, mas a glória do Reino não depende da aceitação dos homens, pois os eleitos ouvirão o chamado do Supremo Pastor.
Transição
As instruções de Cristo aos seus apóstolos, são encaminhadas aos crentes em Roma e em outras partes do império, que enfrentavam as mesmas dificuldades ou parecidas, a fim de que exortá-los quanto à responsabilidade de, como agentes do Reino, propagar a boa-nova da salvação aos perdidos. Essas diretrizes, deveriam nutrir no coração dos cristãos a diligência em obedecer o mandado de Cristo de serem testemunhas da fé que agora possuem, fazendo notório, através da pregação, que o Reino dos céus está próximo (v.7).
Essas exortações e ordenanças também nos norteiam quanto a execução dessa obrigação, transpondo para nós o mesmo sentimento gerado no coração dos discípulos: obedecer ao Mestre, pregando o Evangelho do Reino, a partir daqueles princípios encontrados no próprio texto. Quais sejam:
Aplicações
1. Testemunhar à todos o evangelho da restauração em Cristo Jesus.
Embora neste primeiro momento, como já comentado, Cristo tenha restringido a missão dos doze às "ovelhas perdidas da casa de Israel" (v.6), à luz do próprio texto de Mateus e de todo o Novo Testamento, vemos que os agentes do Reino deverão ir e pregar o Evangelho, fazendo "discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, ensinando-os a guardar todas as coisas que vos tenho ordenado" (Mt 28.19-20).
O caráter dessa pregação consiste em expor o ensino que receberam, crendo que tais palavras são a demonstração da realidade da obra de salvação executada por Jesus Cristo, o Filho de Deus, o Messias prometido, enviado a este mundo para salvar o homem de sua condição de pecado e miséria, condição que abarca todos os homens, e por essa razão, os nivela debaixo de um mesmo prumo de impossibilidade de por suas próprias obras ou recursos, salvarem-se. Por isso, a exortação é franca: "de graça recebestes, visto que não tínheis com o que ou como adquiri-la, logo, de graça dai".
A mesma misericórdia e graça que nos arrebanhou como ovelhas do Supremo Pastor deve, tão franca e puramente, ser comunicada à todos os homens, a fim de que pelo chamado público, isto é, direcionado à todos, os eleitos sejam trazidos à fé em nosso SENHOR Jesus Cristo. Portanto, as ordens que os discípulos receberam, devem também ser cridas e obedecidas por nós, que assim como eles, fomos chamados à redenção.
2. Depender de Deus, e de Deus somente, para a execução e cumprimento deste chamado.
Nosso Senhor exortou seus discípulos a confiarem na providência divina e em sua justiça para seus sustento e manutenção, pois "digno é o trabalhador de seu alimento" (v.10). Este princípio, embora possa ser interpretado por muitos como estando restritos aos ministros da palavra (i.e. pastores), aplica-se também a todos os agentes do Reino, afinal, Mateus não está escrevendo apenas para pastores, e sim para toda a igreja, logo o contexto que o público-alvo do escritor estava vivenciando nos ajuda a entender a passagem e aplicá-la a nós hoje.
Não estamos saindo pelo mundo como pregadores itinerantes, como fizeram os discípulos, mas isso não quer dizer que não estejamos sujeitos às mesmas intempéries de um mundo caído e afundado no pecado, tanto quanto os discípulos o estavam. Sabemos da crescente perseguição contra cristãos no mundo, e sabemos que todos os dias, contraditoriamente (mas não surpreendentemente), os que professam as fé em Cristo têm sido tachados como hostis ao modo de vida mundano e pecaminoso que muitos desejam perpetrar.
Nesse ínterim, alguns crentes, tanto quanto muitos naquela época, que ouviram a leitura deste texto em sua igreja, poderiam ver-se num dilema: será que vale a pena correr o risco de perder os bens que conquistei com tanto esforço, ou ser hostilizados em vários lugares e ambientes para atender as ordens de Jesus? Em primeiro lugar devemos nos lembrar que não somos desse mundo, logo, não temos nada aqui que seja invariavelmente nosso. Aqui o ladrão mina e a traça rói. Porém, ainda que percamos o que quer que seja nesse mundo, seguindo a Cristo, achamos nossa vida; encontramos nossa razão de existir. Em segundo lugar, o SENHOR sabe do que precisamos para continuar vivendo, e consequentemente, testemunhando da salvação. Por implicação, ele entende que necessitamos de ouro, prata, alforje e túnicas, ou dinheiro, vestes, alimentos e etc.
O que precisamos entender é que Deus não dá uma ordem sem proporcionar os subsídios necessários para que a cumpramos. O Deus que mandou, cuidará de nos prover de tudo quanto é necessário para preguemos aos perdidos lá fora, que somente Jesus Cristo salva, e somente ele é o SENHOR sobre tudo e todos.
Porém, nossa ida e confiança na provisão divina não pressupõem sucesso na missão, pois a definição de sucesso na pregação do evangelho não indica que todos quantos ouvirão nosso testemunho de Cristo serão salvos. O que nos leva ao terceiro princípio.
3. Confiar em sua soberania e sabedoria quanto a efetividade da pregação.
Nossas ordens são: "vá e pregue!" e não: "vá e converta!". Sob a orientação do Espírito, em nossas escolas, trabalhos, lazeres ou em qualquer outro lugar, precisamos sempre rememorar o fato de que estamos passeando nesse mundo como por um grande cemitério: todos estão mortos. Ninguém nos ouve de fato. Todos estão aprisionados ao pecado, e seus ouvidos estão de tal forma obstruídos, que nosso testemunho só pode ser ouvido por aqueles que foram eleitos por Deus para a salvação.
Nem todos o que escutarem nossa voz, ouvirão o chamado do Espírito. Alguns nos receberão. Outros, não. Os discípulos foram exortados a "sacudirem o pó dos pés", isto é, reconhecerem que como arautos, fizeram o que lhes foi ordenado, e que a partir daquele ponto, a responsabilidade era unicamente de quem havia rejeitado o evangelho, publicando sua reprovação diante de Deus para salvação. Por outro lado, essa possibilidade de rejeição, não poderia nutrir no coração dos discípulos algum tipo de preferência ou escolha de pregar numa determinada cidade, que parecia ser mais receptiva, excluindo outra, que aparentemente era hostil. Como abordado anteriormente, o chamado é direcionado à todos.
Portanto, não podemos escolher quem parece mais inclinado a ouvir o evangelho para que possamos pregar. Não nos comprometemos com resultados, e sim com a ordem de ir e testemunhar que Deus nos visitou, enviando seu Filho, a fim de que, mediante arrependimento e fé, sejamos salvos de sua ira final e eterna.
Assim, prossigamos pregando o Evangelho através das nossas vidas e com nossa voz, testemunhando que o Reino dos céu é chegado, confiando que Deus nos enviará até seus eleitos, a fim de trazê-los ao Reino, tal como aconteceu conosco.
Conclusão
Sob as ordens de Cristo, cumprimos nosso chamado. Tendo sido vivificados pelo Espírito Santo para, por meio da fé, sermos salvos pela graça de Deus através do sacrifício e mediação do Messias, fomos também chamados a proclamar essa mesma salvação, de acordo com as instruções daquele que, sendo bondoso, continua, por intermédio de sua igreja, a chamar os eleitos mortos à vida.
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