Às vezes o coração aperta com uma saudade de coisas que não vivemos, que não conhecemos, a não ser pelas histórias contadas, os filmes assistidos, as narrativas que nos transportaram para outras realidades e despertaram em nós as mais variadas emoções. Encantadas ao observar uma pintura do passado, de repente sentimos um desajuste com o nosso tempo, uma sensação de falta de sintonia com as ondas vibrantes desses dias, um desconsolo com os rumos que tomamos.
Olhamos para um passado distante buscando encontrar nele um lugar que faça-nos sentir realmente a vontade, um canto da história em que possamos florescer sem pressa, sem o tumulto dos nossos dias, porque parece que chegamos atrasados nesse mundo, como quem chega no fim de uma festa, o que há de bom já passou, agora só resta desordem e sujeira.
Mas afinal, por que sentimos isso? Porque ansiamos por alguma época do passado? Será que não sabemos que depois da Queda, não existe nenhuma época perfeita? Que este planeta tem sido habitado por pecadores? Que por mais respeitáveis que fossem as pessoas, ainda eram criaturas arruinadas?
É claro que sabemos! Mas ainda assim permanecemos com a impressão de que pertencemos a outro tempo, a outro lugar.
A verdade é que ninguém nunca nasceu em tempo errado. Deus que governa o mundo e todos os seres que nele habitam, em Sua soberania rege todos os eventos, de modo que nem ao menos uma folha pode cair de uma árvore sem a Sua permissão. Todos nós viemos a este mundo no momento certo, nem antes, nem depois.
Mas a pergunta, então, continua. Por que nos sentimos deslocadas de nossa época, de nosso mundo?
Nós somos criaturas exiladas, longe de nossa terra, ansiando voltar para casa. E existem experiências, mesmo no mundo pós-queda, que despertam em nós esse anseio, que nos fazem sentir a nostalgia de um peregrino ao lembrar de sua terra natal. Por isso, nos fixamos naquilo que mais nos parece lembrar do nosso lar, do nosso primeiro estado. C. S. Lewis, escreveu:
“...aquela nostalgia que trazemos sempre conosco, aquele desejo de sermos reatados a alguma coisa do universo da qual nos sentimos cortados, de estarmos do lado interno da porta que sempre vimos pelo lado externo, não são, portanto, mera fantasia neurótica, mas o mais verdadeiro dos sintomas da nossa real situação. Sermos, enfim, convidados a entrar seria glória e honra altamente imerecidas e também a satisfação do nosso velho e doloroso anseio.”
Deus, família, beleza, ordem, perfeição, comunhão, estavam presentes no cenário das primeiras cenas da história humana, veja em Gênesis 1 e 2, quando o pecado ainda não tinha nos arruinado e, portanto, ainda estávamos em nosso primeiro estado, com nosso Bem Maior.
E em algum lugar no passado parece que a família foi mais valorizada, a beleza exaltada, a ordem preferida em lugar do caos, a perfeição e a comunhão almejadas. Erroneamente, pensamos que nosso lar está nesse passado, porque quando pensamos em voltar para casa, a ideia de “voltar” está associada, corretamente, ao passado. Entretanto, para nós, voltar para casa não está no passado, mas no futuro, na consumação de todas as coisas quando finalmente nossos corações repousarão em paz, quando:
“A porta que batemos toda a vida finalmente se abrirá” (C. S. Lewis)
Lewis continuando dizendo que:
“No momento, estamos do lado de fora do mundo, do lado errado da porta. Discernimos o frescor e a pureza da manhã, mas esse frescor e essa pureza não nos contagiam. Não nos fundimos com o esplendor que vemos. Mas todas as páginas do Novo Testamento murmuram um rumor de que não será sempre assim. Um dia, queira Deus, haveremos de entrar.”
Pois é, um dia estaremos em casa, mas enquanto esse dia não chegar, procuremos viver cada um dos dias que nos foi dado sem que o saudosismo nos impeça de ver as ricas oportunidades do nosso tempo, pois se podemos nos fixar com esperança em algo, é em nosso Salvador que tem colocado Seu reino em nossos corações e um dia nos levará para casa. Ele prometeu:
"Não se perturbe o coração de vocês. Creiam em Deus; creiam também em mim. Na casa de meu Pai há muitos aposentos; se não fosse assim, eu lhes teria dito. Vou preparar-lhes lugar. E se eu for e lhes preparar lugar, voltarei e os levarei para mim, para que vocês estejam onde eu estiver.” (João 14:1-3)
Então vamos caminhando, mas não olhando para trás e sim para frente, para o alto, de onde aguardamos o nosso Salvador (Fil. 3.20)
Sonaly Soares