Poder

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Transcript

Introdução

Hoje muito se fala sobre a tal "cultura do cancelamento", especialmente no tribunal da internet qualquer um pode ser cancelado a partir de uma atitude ou fala impopular. Se a sua opinião não está alinhada com a maioria ou com um grupo específico você pode cair em desgraça de uma hora para a outra sem qualquer chance de defesa.
O que isso tem a ver com a nossa nova série? Jesus em vários momentos falou palavras impopulares para o seu tempo e outras que seriam ainda mais impopulares para essa geração. Para uma parcela da geração atual, Jesus foi alguém legal que veio ao mundo para pregar uma mensagem de paz, mas como disse o pastor Tim Keller:
"⁠Jesus não foi apenas um cara legal que fez o bem no mundo. Você não crucifica caras legais. Você crucifica ameaças.⁠Jesus não foi apenas um cara legal que fez o bem no mundo. Você não crucifica caras legais. Você crucifica ameaças."
O dscurso de Jesus também seria extremamente cancelado por muitos pregadores contemporâneos. Especialmente pelo que chamamos de "teologia da prosperidade 2.0" e porque Jesus seria cancelado por esses pregadores contemporâneos? Permitame citar novamente o pastor Tim Keller quando ele diz que "poder, aprovação, conforto e controle são os meta-ídolos que mais nos influenciam no dia-a-dia. E a pregação desses homens não confrontam esses ídolos, mas os alimentam dentro de nós.
Hoje eu gostaria de falar sobre esse primeiro grande ídolo contemporâneo que Jesus combateu, o poder.
Mateus 20.20–28 NAA
20 Então se aproximou de Jesus a mulher de Zebedeu, com seus filhos, e, adorando-o, pediu-lhe um favor. 21 Jesus lhe perguntou: — O que você quer? Ela respondeu: — Mande que, no seu reino, estes meus dois filhos se assentem um à sua direita e o outro à sua esquerda. 22 Mas Jesus disse: — Vocês não sabem o que estão pedindo. Será que podem beber o cálice que eu estou para beber? Eles responderam: — Podemos. 23 Então Jesus lhes disse: — Vocês beberão o meu cálice. Quanto a sentar à minha direita e à minha esquerda, não me compete concedê-lo, pois é para aqueles a quem está preparado por meu Pai. 24 Quando os outros dez discípulos ouviram isso, ficaram indignados com os dois irmãos. 25 Então Jesus, chamando-os para junto de si, disse: — Vocês sabem que os governadores dos povos os dominam e que os maiorais exercem autoridade sobre eles. 26 Mas entre vocês não será assim; pelo contrário, quem quiser tornar-se grande entre vocês, que se coloque a serviço dos outros; 27 e quem quiser ser o primeiro entre vocês, que seja servo de vocês; 28 tal como o Filho do Homem, que não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em resgate por muitos.

A idolatria do poder (20-24)

Primeiramente eu gostaria de falar sobre os personagens envolvidos nesse diálogo. Jesus, Salomé, e seus filhos Tiago e João. Salomé era irmã de Maria, logo vemos um diálogo de uma tia com o seu sobrinho a respeito dos seus filhos que eram nesse caso primos de Jesus. Salomé, além de tia de Jesus, ela foi uma das mulheres que permaneceu ao lado de Jesus até a sua crucificação.
Esse episódio na vida de Jesus nos traz alguns alertas. Primeiramente vemos um pedido de uma mãe, que a principio, a partir de uma pespectiva contemporânea foi algo bom. Ela gostaria de ver seus filhos, um a direita e outro à esquerda no Reino de Deus. Não podemos afirmar se Salomé fez esse pedido por inciativa própria ou a pedido dos seus filhos. Mas podemos observar que na resposta fica claro que Jesus responde aos três.
Outro fato que nos chama a atenção neste diálogo, é como Jesus identifica a motivação egoísta daquela mulher, ela não desejava a glória de Deus, mas o holofote para os filhos. Essa motivação errada é fruto de um entendimento equivocado a respeito do reino de Deus. Tanto Salomé, quanto seus filhos nutriam pensamentos triunfalistas a respeito do Reino. Esse pensamento é facilmente disseminado em contextos que o Reino de Deus é encarado somente como algo terreno, Tiago e João não queriam apenas tronos, mas os lugares de primazia no trono. Jesus corrige a noção errada deles, ensinando que o reino de Deus não era de caráter político, mas espiritual. Eles nem imaginavam que, dentro em breve, dois bandidos iriam ocupar uma cruz à direita e outra à esquerda do Messias.
Também me chama a atenção, de certa forma é um uso errado da intimidade com Cristo. Eles faziam parte daquele grupo mais íntimo de Jesus, que fora com ele à casa de Jairo, subira com ele ao monte da Transfiguração e estariam com ele mais de perto no jardim de Getsêmani. Eles queriam privilégios especiais. Numa linguagem contemporânea, seria uma espécie de carteirada. Era uma espécie de nepotismo, afinal de contas Salomé era tia de Jesus. Assim, esses dois discípulos eram primos de Jesus. Eles aproveitaram desse estreito laço familiar para buscarem vantagens pessoais. Por isso, a idolatria do poder possui algumas raízes:

Egoísmo

Pensar primeiramente em si, e somente em si. O resultado do egoísmo é sempre dissenção e divisão. Toda vez que alguém se relaciona com outra pessoa pensando em si, ela vai sempre colher dissenção.Usar as pessoas para benefício próprio vai sempre te levar a desgraça, mesmo que inicialmente você obtenha "resultados positivos".

Mundanismo

Ter a mente somente nas coisas desse mundo e se esquecer da pespectiva eterna. Que um dia prestaremos connta de tudo a Deus, e que na verdade o reino que iremos desfrutar plenamente não é desse mundo.

Orgulho

O orgulho é o causador dos maiores danos sofridos pelos crentes depois da conversão. É um vício que se apega tão teimosamente ao coração humano que, se tivéssemos de nos desfazer de todas as nossas falhas, uma a uma, sem dúvida descobriríamos que essa seria a última e mais difícil de todas as faltas a eliminar. O orgulho é a vestimenta mais íntima, a qual vestimos primeiro e da qual nos despimos por último.
Jesus estava indo para a cruz, e não para um trono. Jesus cruzaria o caminho do sofrimento, e não o dos aplausos humanos. A cruz precede a coroa como a morte precede a ressurreição. O caminho da glória não é revestido de tapetes vermelhos, mas tingido do sangue dos mártires. Spurgeon diz que a nossa tarefa não é anelar por superioridade no reino, mas submissamente beber o cálice do sofrimento e mergulhar nas profundezas da humilhação que nosso Deus nos designa.
Beber o cálice significa experimentar, em profundidade, o sofrimento. Eles estão pedindo uma coisa e pensando receber outra. Eles querem glória enquanto pedem sofrimento. Jesus foi esmagado pela agonia e mergulhado num fluxo de tremendo sofrimento.
Pelo emprego dessa figura (cálice), Jesus esclarece que ele vai receber sobre si, voluntariamente, o juízo de Deus em lugar dos culpados. A glória não é, ainda, o próximo passo no plano de Deus, como Tiago e João sugerem em seu pedido. Ao contrário, Jesus morrerá uma morte humilhante como o substituto dos pecadores. Essa é a sua vocação messiânica; esse será o seu cálice, do qual ninguém mais pode compartilhar.
Quando Tiago e João disseram que podiam beber o cálice de Cristo, eles não discerniram o que falavam, pois o sofrimento de Cristo é único e exclusivo. O sofrimento de Cristo é vicário (20.28); o de seus seguidores nunca poderá sê-lo. Em certa medida, eles beberam do seu cálice, pois Tiago foi o primeiro apóstolo a ser martirizado (At 12.2), e João foi o último a morrer, depois de ser deportado para a ilha de Patmos pelo imperador Domiciano (Ap 1.9).
O egoísmo de Tiago e João gera indignação nos outros dez discípulos, uma consequência inevitável. Eles se indignaram não pelo pecado dos dois, mas por acharem que haviam tramado contra eles, uma vez que aspiravam às mesmas coisas que os dois buscavam (o efeito contagiante do pecado). Eles tinham os mesmos desejos de ambição. A atitude espiritual dos dez não era melhor do que a dos outros dois. Como é fácil condenar nos outros o que justificamos em nós mesmos.
Aplicação: É possível fazer coisas religiosas, com a motivação egoísta. Aproveito para falar do que os pais desejam para os filhos. Tem pai mais feliz com um filho formado do que com um filho se batizando. Tem gente que ajuda o pobre para parecer bom, para se promover. Tem gente que ajuda pessoas para criar uma dívida eterna a ela.
Jesus desagradou aquela família, porque confrontou seu ídolo. Há alguns anos atrás um pastor ficou conhecido por chutar um ídolo, mas como chutar ou marretar um ídolo quando Ele está no coração? Não se vence a idolatria odiando o ídolo, mas amando mais a Deus. A idolatria é quando amamos algo como se fosse Deus. Jesus era um meio para o poder, para o destaque. Por isso Jesus confronta a ideia equivocada com os valores do Reino de Deus.

Os valores do Reino (25-28)

Jesus frustra Salomé e seus filhos, quando apresenta uma perspectiva diferente daquela que estava no coração deles. A grandeza a partir dos valores do Reino é avaliada de diferentes modos:
Em primeiro lugar, a grandeza segundo o mundo (20.25). Semelhantemente a muitas pessoas hoje, os discípulos estavam cometendo o equívoco de seguir exemplos errados (qual é a voz que molda a sua visão sobre o mundo?). Em vez de imitarem a Jesus, eles estavam admirando a glória e a autoridade dos governadores romanos, homens que amavam as posições e a autoridade.
Jesus, percebendo a ambição no coração dos seus discípulos, chama-os à parte e ministra-lhes mais uma lição sobre o espírito de grandeza que predomina no mundo. Ser grande no conceito do mundo é ser servido e ter poder sobre os outros. Ser grande no conceito do mundo é usar o domínio sobre as pessoas para desvantagem destas e para a vantagem de quem assim domina. Dominar sobre as pessoas é o fundamento sobre o qual a estrutura de dominação está alicerçada. Comumente o domínio é exercido no interesse daqueles que dominam.
Em segundo lugar, a grandeza segundo Jesus (20.26,27). No reino de Deus, a pirâmide está invertida. A grandeza é medida pelo serviço, e não pela dominação. Ser grande é ser servo. Ser grande é estar a serviço dos outros, em vez de ser servido pelos outros. De acordo com William Hendriksen, o que Jesus está dizendo é que, no reino sobre o qual ele governa, a grandeza é obtida seguindo o curso de ação que é exatamente o oposto ao que segue o mundo incrédulo. A grandeza consiste em doar-se, em entregar-se em serviço a favor de outros, para a glória de Deus. Ser grande significa amar. Entre os discípulos, um novo tipo de relacionamento deve prevalecer, ou seja, os discípulos devem ser servos (diakonos) uns dos outros e escravos (doulos) de todos.
O padrão de Deus é que uma pessoa deve ser um servo antes de Deus promovê-la a uma posição de liderança. Foi dessa maneira que Deus trabalhou com José, Moisés, Josué, Davi e mesmo com Jesus (Fp 2.5–11). A não ser que saibamos o que seja obedecer a ordens, não saberemos dar ordens. Antes de uma pessoa exercer autoridade, deve saber o que é estar debaixo de autoridade.
Em terceiro lugar, a grandeza exemplificada por Jesus (20.28). Jesus é o criador, o dono e o Senhor do universo. Mas, sendo Senhor, cingiu-se com a toalha e lavou os pés dos discípulos. Sendo Senhor, andou por toda parte fazendo o bem e libertando os oprimidos do diabo. Sendo Senhor, usou seu poder não em benefício próprio, mas para socorrer os aflitos. Ele veio para servir, e não para ser servido.

Conclusão

O apóstolo Paulo fala sobre a necessidade de buscarmos o interesse uns dos outros e de servimos uns aos outros; e, para sustentar seu argumento, ele ordena: Tende em vós o mesmo sentimento que houve também em Cristo Jesus (Fp 2.5). Em seguida, relata o exemplo de Jesus, que, sendo Deus, esvaziou-se e tornou-se servo, humilhando-se até a morte e morte de cruz (Fp 2.6–8). A exaltação daquele que se humilha é uma coroação feita pelo próprio Pai (Fp 2.9–11).
No reino de Deus, ser grande é ser servo e ser poderoso não é ter autoridade sobre muitos, mas servir a muitos. No reino de Deus, dado que o próprio Rei é servo, o título “grande” se reserva para os que, inspirados por seu exemplo, gastam-se livre e alegremente a serviço de outros.
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