1Coríntios 1.4-9
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· 56 viewsO autor expõe a perspectiva da efetividade da obra salvadora operada na igreja como motivação tanto para sua gratidão ao SENHOR, quanto para que a própria comunidade de fé possa obter a certeza da salvação executada por Cristo Jesus.
Notes
Transcript
"[....] Aos santificados em Cristo Jesus, chamados para ser santos" (1Co 1.2).
Pr. Paulo U. Rodrigues
Introdução
Após a introdução dos versículos de 1 a 3, em que Paulo apresenta a santificação como base para unidade da igreja, o apóstolo desenvolve sua aproximação pastoral junto ao público a que se dirige, enfatizando sua gratidão para com o SENHOR, por encontrar aspectos que elucidam de fato a eleição e salvação dos fiéis naquela igreja.
Esses aspectos são condensados e estruturados na forma de ações de graças, demonstrando a convenção literária da época no tocante à redação de uma carta, sendo usada como forma de expressar felicidade e gratidão por algo visto/ocorrido no/com o destinatário, mas que fora usada por Paulo, no texto em questão, de maneira mais ampla, como uma forma de destacar a obra que o SENHOR estaria realizando naquela igreja.
Dado o teor da carta e a intenção do apóstolo, suas ações de graças concentradas em expor o desenvolvimento da obra de Cristo na vida do povo de Deus, servem como um incentivo para que a igreja seja mais receptiva às orientações e exortações que seguirão a partir desse ponto. Contudo, é importante observar que ele faz isso não para tentar de suavizar o impacto de suas declarações, mas visando construir uma visão adequada da igreja para os membros que dela fazem parte.
O foco de Paulo ao delinear ações de graças no início dessa primeira carta aos Coríntios, é estabelecer a confiança dos crentes no fato de que, apesar de necessitarem de uma contundente e intensa modificação na vida da igreja por meio da purificação e correção de pontos críticos, a obra divina está em pleno vigor; eles fazem parte do povo de Deus (ênfase dada anteriormente (cf. vs. 1-3)), e como tal, recebem da parte do Salvador bênçãos que resultarão no aperfeiçoamento dos santos.
Com isso em mente, a presente seção do texto bíblico da primeira carta aos coríntios enfatiza a convicção da operação da obra salvadora como fonte de consolo e confiança no aperfeiçoamento da igreja.
Elucidação
Como enfatizado, as ações de graças do apóstolo estão para além do mero uso literário, aludindo à uma interação mais aprofundada entre o redator e o público-alvo. Esse ponto de contato consiste na demonstração de evidências da obra salvadora operada naquela igreja.
É extremamente vital para o apóstolo, antes de abordar os crentes com as exortações necessárias, lembrar da continuidade e êxito da salvação neles confirmada (v.6), pois, o sucesso da aquiescência dos mesmos às diretrizes apontadas pelo escritor, demandarão uma compreensão clara quanto a efetividade da redenção. Partindo dessa lógica, o apóstolo insere uma expressão de louvor a Deus, seguida por uma explicação para tal:
Sempre dou graças a [meu] Deus a vosso respeito, a propósito da sua graça, que vos foi dada em Cristo Jesus; porque, em tudo, fostes enriquecidos nele, em toda a palavra e em todo o conhecimento;
Dois fatores básicos resumem a gratidão do apóstolo: a palavra e o conhecimento concedidos àquela igreja. Esses temos, agrupados e estruturados nessa seção da carta, aludem à instrução apostólica recebida pelos membros fiéis daquela igreja, tanto em termos do trabalho que o próprio Paulo havia realizado no ensino e pregação do Evangelho enquanto esteve na cidade de Corinto, quanto também ao ministério desempenhado por Cefas, Apolo (cf. 1.12; 3.6) e outros que radicaram a Palavra de Deus entre aqueles irmãos, o que resultou num testemunho franco da obra santificadora executada por Cristo em seu Espírito (cf. v.6).
O ponto em questão é que embora a igreja agora esteja passando por sérios e drásticos problemas de ordem moral e eclesiástica, é necessário que atentem para o fato de que, uma vez que a palavra da verdade foi implantada no meio deles, é impossível que haja algum regresso no processo que os têm feito santos (cf. v. 2).
Frente a atual situação daquela comunidade, alguns poderiam ser tentados a ver algum tipo de antítese entre o atual estado da igreja e a salvação, de maneira que pareceria impossível a estes, que de fato houvesse em Corinto uma genuína comunidade cristã. A argumentação do apóstolo caminha na exata contra mão desse possível pensamento. Santidade não é necessariamente ausência de pecado, mas a princípio, consiste também na luta contra este. Um coração regenerado possui ainda resquícios da natureza corrupta, o que o fará imperfeito, manifestando essa condição através de trangressões à vontade do SENHOR. Contudo, permanecerá em tal coração a semente do Evangelho, que promoverá uma constante e renhida batalha contra o pecado, e é exatamente essa guerra que demonstra a ação santificadora de Cristo.
Os tempos verbais no passado, escolhidos pelo redator, contribuem para essa conclusão: ao referir-se aos benefícios encontrados naquela igreja - que são o motivo de Paulo dar graças a Deus - os termos declaram que as ações já foram efetivadas:
"Sempre dou graças a vosso respeito: 1) a propósito da sua graça, que foi dada em Cristo Jesus; 2) porque, em tudo, fostes enriquecidos nele; 3) assim como o testemunho de Cristo foi confirmado (cf. gr. βεβαιόω - aoristo passivo indicativo) em vós".
Essas declarações foram arranjadas de maneira a estruturar um claro conceito que elucida o princípio de que para o apóstolo, não restam dúvidas de que está lidando com uma parte do corpo de Cristo, e de acordo com essa noção, não faltam motivos para que ele não bendiga a Deus por encontrar naquela igreja evidências da redenção.
Uma igreja saudável não é aquela em que pecados, erros ou vícios não são encontrados, mas sim, que apesar da presença dessas desordens, está motivada a caminhar de acordo com a obra que tem sido nela operada. Esse alto conceito quanto a igreja é alimentado por Paulo a fim de que os cristãos coríntios vejam sua igreja como de fato ela é: mais do que um ajuntamento de pessoas defeituosas que encontram problemas para vencer seus pecados, mas a reunião de homens e mulheres que foram chamados à santidade, e contam com o poder de Jesus Cristo para viverem de conformidade com ela.
A partir do versículo 7, entretanto, a tônica do apóstolo muda: se havia iniciado suas exortações de um ponto de vista passado, querendo notar a efetividade da obra salvadora, agora ele passa a narrar as implicações e resultados dessa graça tanto no presente quanto no futuro:
"(1)[...] De maneira que não está vos faltando (adaptação nossa) nenhum dom, (2) aguardando vós a revelação de nosso Senhor Jesus Cristo, o qual vos (3) confirmará até ao fim, (4) para serdes irrepreensíveis no Dia de nosso Senhor Jesus Cristo" (vs. 7-8).
Seguindo o raciocínio do apóstolo, se a obra de santificação está sendo inexoravelmente confirmada naquela igreja, isso resultará na completude da mesma por ocasião certa do retorno de Cristo Jesus: o ponto temporal que demarca a finalização do processo purificador. É para esse momento que a igreja de Corinto tem sido preparada: todos os dons, benefícios e graças derramados abundantemente naquela comunidade, não somente confirmam seu pertencimento a igreja de Deus, bem como os capacita a chegar ao final do percurso determinado por Cristo para ela: a glorificação e anúncio de sua glória através de uma igreja irrepreensível.
Naquele momento, os coríntios estavam recebendo uma lista de repreensões e orientações quanto a práticas, ensinos e posturas que deveriam ser retificadas dentro da igreja, mas, essas exortações atestavam a salvação da qual participavam, e os encaminhava ao ponto máximo da história: o enaltecimento do Deus Triuno através de um povo santo e puro que separou para si, e a finalização da seção, declara essa união entre Deus e seu povo como auge da obra neles realizada:
Fiel é Deus, pelo qual fostes chamados à comunhão de seu Filho Jesus Cristo, nosso Senhor.
É notável que o uso do termo "comunhão" neste versículo, também chame a atenção dos cristãos coríntios para o trabalho que precisam realizar como fruto da obra salvadora. Se o clímax da salvação é que os filhos de Deus sejam reunidos com ele, a vida da igreja deve refletir esse princípio, cultivando uma comunhão mútua entre os crentes de maneira a confirmar seu pertencimento ao corpo de Cristo. Porém, a expressão inicial "Fiel é Deus" garante que, assim como o primeiro propósito será efetivado, isto é, tal como é certo que eles desfrutarão da comunhão com o Senhor Jesus no dia final, é também certo que a igreja deve e viverá em comunhão em seus membros.
Transição
A declaração efetiva da realização da obra salvadora, implicando na expectativa da completude na revelação de Cristo Jesus, deve enriquecer nossa perspectiva quanto a igreja. Há muito mais no meio do povo de Deus do que pecados, desordens e divisão: há a graça do SENHOR que opera na igreja, nos conformando à sua vontade, para que atinjamos aquele ideal de comunhão determinado pelo próprio Deus para o seu povo.
Calvino, sintetiza a compreensão das ações de graças de Paulo neste texto da seguinte maneira:
[Paulo estava] persuadido, no tribunal do amor, de que a vocação dos coríntios seria uma firme e inabalável prova, já que ele via entre eles os emblemas do beneplácito paternal de Deus. Além disso, tais emblemas de forma alguma visavam a produzir um mero senso de segurança carnal; pois as Escrituras com freqüência nos advertem quanto a nossa real fraqueza, mas simplesmente visa a confirmar nossa confiança no Senhor. Ora, isso era necessário a fim de que suas mentes não se vissem desnorteadas ao descobrirem tantas falhas, como mais adiante ele as poria diante de seus olhos. Tudo isto pode ser sumariado da seguinte forma: “Os cristãos sinceros devem nutrir boas esperanças acerca de todos quantos têm tido acesso ao caminho inconfundível da salvação, e perseveram em seu curso, ainda que ao mesmo tempo sejam assediados por muitas enfermidades (CALVINO, 2013, p. 46-47).
Frente a essa compreensão, o texto de 1Coríntios 1.4-9 enfatiza os seguintes princípios a serem observados:
Aplicações
1. Apesar das imperfeições da igreja - resultado da nossa ainda presente natureza caída - temos (e devemos alimentar) a certeza de nossa salvação, por causa da obra salvadora de Cristo operada em nós.
É fato que temos muitas falhas a serem corrigidas. Problemas pessoais ou de ordem geral; sempre haveremos de ter pecados que nos impedirão de afirmar que nossa igreja é perfeita. Porém, não podemos deixar que esses nossos pecados nos façam ter uma visão baixa ou pobre quanto a obra que tem sido realizada em nós.
O fato de estarmos juntos, como uma igreja, atentando para as palavras que nosso SENHOR nos legou como instrução, escancara a riqueza e grandeza da obra que está sendo desenvolvida em nós por Cristo.
Nossa progressão na luta contra nossos pecados particulares; o amor que temos uns para com os outros; o desejo de ver nossa igreja crescendo na graça e no conhecimento do SENHOR, sendo a cada dia acrescido ao nosso número, os que o Deus Triuno destinou à salvação, tudo isso, unido ao nosso apreço pela unidade e comunhão (embora saibamos que precisamos de aperfeiçoamento), evidenciam que também há motivos de sobra para que, assim como Paulo o fez, demos graças à Deus a nosso respeito.
Paulo traz à tona o fato de que, como dito, não há regresso ou involução no processo de santificação. Temos sido enriquecidos na Palavra e no Conhecimento da verdade, sendo todos os dias ministrados em nosso meio os dons, talentos e habilidades necessários para que nossa igreja prossiga na caminhada cristã. Se olharmos para essa obra, nos alegraremos com o resultado inevitável a ser desfrutado por todos nós: seremos confirmados até ao fim, para sermos irrepreensíveis no Dia de nosso Senhor Jesus Cristo, e quem garante isso é o Deus Fiel, que nos chamou à comunhão com seu Filho, Jesus Cristo.
2. Essa certeza da efetividade da obra de santificação que Cristo tem operado em nós, deve então nos levar a ter uma alta e excelente visão quanto a igreja.
É sempre mais fácil ser alguém negativo em relação a igreja, pois, diferentemente das virtudes, os vícios costumam ser evidentes. Porém, muito cuidado com o descontentamento que guardamos no coração para com a igreja! As falhas e pecados que temos, não podem determinar a imagem que formulamos do povo de Deus.
Há pessoas aos milhões lá fora, que se recusam a unir-se à uma igreja sob a alegação de que nossas comunidades cristãs estão cheias de hipócritas. Bom, sempre temos espaço para mais um. Porém, o ponto em questão é que não podemos nos deixar levar por esse "protestos" que arrogam para si um alto clamor de justiça, como se viver ausente do corpo de Cristo fosse a solução.
Como dito, sim, há falhas entre nós, como houve também na igreja de Corinto. Mas, o testemunho de Cristo tem sido confirmado em nós, e isso significa que aos poucos estamos sendo moldados para ser perfeitamente aquele povo santo que o Deus Triuno já contempla na eternidade. Essa é a ótica que precisamos ter de nossa igreja: uma comunidade de pessoas imperfeitas, que estão sendo aperfeiçoadas pelo amor e poder de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo, o qual com grande expectativa aguardamos.
Conclusão.
O rebanho pode ser fraco, mas o pastor é forte, e é na sua força que nos alegramos, pois ele tem cuidado de nós, de maneira que contemplamos na face uns dos outros, o poder do nosso Deus, que confirma nosso chamado à santificação e a certeza de nossa salvação.